Direto da redação da Rádio França Internacional em Paris, em parceria com a Rádio CBN, Adriana Moysés e Silvano Mendes contam as novidades e curiosidades de um dos lugares mais visitados do mundo.
Cerca de 500 milhões de meninas, adolescentes e mulheres são atingidas pela pobreza menstrual em todo mundo. Nos países da União Europeia, 50 milhões de pessoas que menstruam utilizam produtos inadequados durante o ciclo. É o que mostra um estudo divulgado nesta semana por ocasião do do Dia Internacional da Dignidade Menstrual, 28 de maio. Daniella Franco, da RFIPouco debatida, mas considerada um problema de saúde pública pela ONU, a pobreza menstrual começou a ser evocada nos anos 2010. Graças ao trabalho da ONG Wash United, baseada na Alemanha, em 2014 foi estabelecido o Dia Internacional da Dignidade Menstrual, reconhecido atualmente em cerca de 50 países.Além da falta de acesso a produtos, a pobreza menstrual engloba problemas mais amplos: a falta de insfraestrutura sanitária adequada e a falta de informações sobre saúde da mulher. Embora em diferentes proporções no mundo, o problema atinge pessoas em situações vulneráveis: periféricas, sem-teto, migrantes, pessoas trans, trabalhadoras do sexo, detentas e mulheres com deficiência.A associação francesa Regras Elementares, que a cada 28 de maio encomenda pesquisas do instituto Opinion Way, divulgou nesta semana o primeiro estudo sobre pobreza menstrual na União Europeia. Segundo o balanço, 42% das mulheres do bloco acima dos 18 anos e em idade reprodutiva afirmam ter enfrentado dificuldades nos últimos 12 meses para comprar produtos de higiene menstrual.Menstruar custa caroNo início deste ano, o Parlamento Europeu calculou que a higiene menstrual pode custar até € 27 mil euros (quase R$ 174 mil) ao longo da vida das pessoas que menstruam. Uma resolução, adotada em 2021, incentivou os membros do bloco a reduzir os impostos sobre mercadorias de higiene íntima. “No entanto, essa ação foi prejudicada pela inflação, pois o aumento dos preços compensou a redução fiscal, o que teve impactos na acessibilidade dos produtos”, diz o site da instituição.Na falta de produtos para higiene menstrual, meninas, adolescentes e mulheres em situação precária colocam sua saúde em risco, usando produtos além do tempo recomendado ou inadequados. A associação Regras Elementares lista alguns deles: panos, papel higiênico e até jornais.“Isso pode ter consequências sanitárias graves”, alerta Maud Leblon, diretora da Regras Elementares, em entrevista à emissora Franceinfo. Segundo ela, a pobreza menstrual atinge pessoas em situação extremamente precária, mas também mães solo ou estudantes “impedindo-as de ir trabalhar ou estudar em boas condições”.De fato, o balanço de 2023 da associação mostrou que 53% das adolescentes acima de 15 anos na França já deixaram de ir para a escola por estar menstruada. Para 80% das meninas francesas, menstruar na escola é um fator de estresse.Debate na FrançaHá dois anos, o balanço anual do OpinionWay sobre a questão mostrou que 53% das pessoas entrevistadas, entre mulheres e homens, não tinham conhecimento sobre o que é a pobreza menstrual. Entre os entrevistados, 57% afirmavam que jamais tiveram nenhum aprendizado formal sobre menstruação. O mesmo número – 57% – também diziam acreditar que essa etapa do ciclo reprodutivo das mulheres continuava sendo tabu na França.Em 2023 um projeto de gratuidade de alguns produtos de higiene menstrual entrou no orçamento do ano seguinte da Seguridade Social francesa. No entanto, até o momento, ele não foi implementado.Nesta semana, a ministra francesa da Igualdade entre Mulheres e Homens, Aurore Bergé, reconheceu o atraso, classificando a demora de “inaceitável”. O governo se engajou a colocar o projeto em prática “até o final do ano”.A promessa é que o sistema de saúde da França reembolsará os gastos com dois tipos de produtos de higiene menstrual: os coletores e as calcinhas absorventes reutilizáveis. A gratuidade valerá para mulheres de até 26 anos e em situação precária. Até o momento, o governo não comunicou as modalidades desse reembolso.
A notícia da morte do fotógrafo franco-brasileiro Sebastião Salgado foi divulgada às 17h20, horário de Paris, pela Academia de Belas Artes francesa, da qual ele fazia parte desde 2017. A imprensa francesa homenageia um "gigante" da fotografia em preto-e-branco, que adotou a França como seu segundo país. De acordo com pessoas próximas da família, Sebastião Salgado morreu na manhã desta sexta-feira (23), cercado pela mulher, Lélia Wanick Salgado, e pelos filhos, Juliano e Rodrigo. Ele deixa dois netos, Flávio e Nara.Um comunicado publicado pelo estúdio que ele mantinha com Lélia, sua inseparável companheira de vida e de trabalho em Paris, há 50 anos, informou que Salgado faleceu em decorrência de uma leucemia grave, provocada por complicações de uma forma específica da malária que ele contraiu em 2010 na Indonésia, quando trabalhava para o projeto Gênesis.Apesar dos 81 anos de idade e dos problemas crônicos de saúde devido à malária, Salgado estava ativo nos últimos dias, dando entrevistas sobre a grande retrospectiva de sua obra que está em cartaz desde o começo de março no centro cultural Les Franciscaines, em Deauville, no norte da França. Até seus últimos dias de vida, ele respondeu a convites para novos trabalhos, do jeito intenso como sempre viveu. Salgado também estava animado e orgulhoso com a estreia da exposição do filho Rodrigo Salgado, de 45 anos. Ele sofre de síndrome de Down e apresenta, pela primeira vez, uma combinação de 16 vitrais, 80 pinturas e algumas esculturas que destacam sua expressão artística intensa e poética na mostra "Rodrigo, uma vida de artista".Apesar do choque com o falecimento do fotógrafo, a abertura da exposição foi mantida para 27 de maio na antiga igreja do Sacré-Cœur de Reims, agora transformada em um ateliê de artes, a uma hora de Paris. A curadoria foi de Lélia e Sebastião Salgado, que realizou a iluminação da mostra. A família estará presente no vernissage privado da exposição, neste sábado (24) às 15h, onde também será prestada uma homenagem ao fotógrafo.Homenagens da imprensa francesaOs jornais franceses destacam o imenso legado do brasileiro. Le Monde enfatiza a trajetória de Salgado como um fotógrafo que capturou a condição humana e os desafios ambientais. O jornal relembrou sua dedicação à Amazônia e seu impacto na conscientização global sobre questões sociais e ecológicas.Libération destaca sua abordagem única para o fotojornalismo e sua capacidade de transformar imagens em narrativas poderosas sobre desigualdade e sofrimento humano.O portal de notícias FranceInfo menciona sua luta contra problemas de saúde nos últimos anos e sua contribuição para a arte e o ativismo ambiental. O portal ressalta a influência duradoura de Salgado na fotografia documental.
As imagens chocaram a França e viralizaram no mundo inteiro: uma violenta tentativa de sequestro à luz do dia em uma rua de Paris, gravada por moradores. Três dias após o incidente que envolveu a filha de um pioneiro do setor das criptomoedas, o governo francês anunciou uma série de medidas para tentar conter um tipo de crime que vem se repetindo no país. “Me larguem!”, grita uma mulher caída em uma calçada, enquanto dois homens encapuzados tentam arrastá-la para dentro de uma van. Agarrado a ela, o marido, com o rosto ensanguentado, tenta segurá-la e é agredido por um terceiro homem. A mulher consegue pegar a arma de um dos encapuzados e jogá-la para um pedestre que se aproxima, enquanto um morador sai de um prédio segurando um extintor de incêndio e ameaça o grupo. Assustado, o trio embarca na van e foge.A cena poderia constar de um filme policial, mas aconteceu por volta das 8h da manhã de terça-feira (13), no 11° distrito de Paris. Os registros, feitos por dois moradores do alto de dois prédios da rua Pache, mostram uma situação incomum no local, um bairro calmo e seguro ao leste da capital francesa.Desde o início deste ano, esse é o quarto incidente deste tipo, visando empresários do setor das criptomoedas ou familiares. O modus operandi é o mesmo: sequestro seguido de extorsão.O último caso antes do violento incidente nesta semana em Paris, ocorreu no início deste mês, quando o pai de um proprietário de uma sociedade que gerencia criptomoedas foi sequestrado no 14° distrito de Paris, outro bairro seguro da capital francesa. A vítima teve um dedo mutilado, na tentativa de extorsão de uma quantia entre € 5 milhões e € 7 milhões. A polícia descobriu o paradeiro do refém e o resgatou. Cinco homens, com idades entre 27 e 20 anos, foram presos.Antes desses dois casos, outros três sequestros já haviam sido registrados, também visando personalidades do universo financeiro virtual na França. Em janeiro, o cofundador da empresa Ledger, David Balland, e sua companheira foram feitos de reféns no centro do país contra um pedido de resgate de € 10 milhões em bitcoins. Dez pessoas foram detidas.Alguns dias mais tarde, no leste da França, quatro pessoas foram detidas por sequestro de um operador de criptomoedas exigindo uma grande quantidade de dinheiro. Ainda em janeiro, o pai de um influenciador de moedas virtuais baseado em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, foi encontrado no porta-malas de um carro em Mans, no oeste.Pai de vítima denuncia “mexicanização” da FrançaA vítima da tentativa de sequestro na terça-feira em Paris não teve sua identidade divulgada. A polícia francesa apenas indicou que ela tem 34 anos e está grávida de cinco meses. O filho de dois anos do casal teria presenciado as violências, mas ele não aparece nos vídeos feitos pelos moradores.A mulher é filha de um pioneiro do setor das criptomoedas na França, Pierre Noizat, de 59 anos, diretor da empresa Paymium. Em entrevista ao canal BFMTV nesta sexta-feira (16), ele informou que a filha e o marido passam bem.Noizat também fez uma série de críticas ao governo francês, que segundo ele, não protege suficientemente “as empresas e os ricos”. De acordo com o empresário, a França está em um processo de “mexicanização”, afirmou, referindo-se ao crime organizado no México."Estamos mergulhados nisso, a violência da qual minha filha foi vítima é cotidiana para muitas pessoas na França", lamentou. Noizat também acusou os poderes públicos de laxismo, uma situação que, segundo ele "coloca todos em perigo".Governo francês anuncia medidasO ministro francês do Interior, Bruno Retailleau, se reuniu nesta sexta-feira com os grandes empresários do setor das criptomoedas na França, entre eles, Pierre Noizat, e prometeu que seriam tomadas medidas para proteger as empresas do ramo e que os responsáveis pelas ações criminosas serão encontrados e serão punidos.Logo depois, um comunicado do Ministério do Interior detalhou algumas iniciativas, como uma colaboração entre as forças de segurança e profissionais do setor. Esses empresários também terão um acesso prioritário no acionamento da polícia.Além disso, agentes do Estado inspecionarão as residências de dirigentes do ramo das criptomoedas para conferir a segurança das moradias. Os profissionais do setor, além das famílias, serão instruídos sobre como se proteger desse tipo de crime.O Ministério do Interior da França ainda promete um trabalho “aprofundado” com o setor das criptomoedas para criação de novas medidas de dissuasão a esse tipo de crime.
A maioria dos católicos franceses, praticantes ou não, ficou agradavelmente surpresa com a escolha do americano Robert Francis Prevost para comandar a Igreja neste momento de guerras ao redor do mundo e incertezas sobre o futuro. Devido ao sobrenome de origem francesa, o papa Leão XIV está sendo considerado por genealogistas "o mais francês dos papas estrangeiros". O perfil multicultural do novo chefe da Igreja Católica, nascido em Chicago (EUA), de mãe espanhola, pai franco-italiano, e ainda moldado pela longa experiência missionária no Peru – e nacionalidade peruana –, foi acolhido com otimismo. Reportagens realizadas nesta quarta-feira (9) em igrejas e escolas católicas, em várias cidades francesas, mostram que a maneira como ele se apresentou ao público, no Vaticano, agradou.O novo líder dos católicos apareceu no balcão central da Basílica de São Pedro com uma fisionomia serena, sorridente, mas ao mesmo tempo visivelmente emocionado. Já na primeira frase, ele falou de paz, gerando muita empatia com o público. Os franceses gostaram de ouvir que ele irá atuar para "construir pontes" de diálogo, em busca de "justiça e paz". Nesta quarta, Leão XIV celebrou a primeira missa de seu pontificado, apenas para os cardeais que o elegeram. Na homilia, ele lamentou o "declínio da fé", preterida em favor de "outras seguranças, como a tecnologia, o dinheiro, o sucesso, o poder e o prazer". Para os praticantes que seguem o evangelho, acreditam na fraternidade e rejeitam o individualismo, esse discurso faz sentido. O jornal católico La Croix, bastante respeitado no país, afirmou em seu editorial que ao levar esse religioso americano de 69 anos para a chefia da Santa Sé, "os cardeais confirmaram a escolha de uma Igreja aberta, multicultural, globalizada e mais do que nunca comprometida com sua doutrina social", em continuidade à abertura iniciada pelo papa Francisco. A maioria dos católicos franceses quer que o pontífice americano continue trabalhando nessa direção. Ancestrais francesesPrevost é um sobrenome de origem francesa bastante comum. Com isso, o papa Leão XIV está sendo considerado "o mais francês dos papas estrangeiros". Desde ontem, genealogistas começaram a pesquisar os ancentrais do novo chefe da Igreja e acharam muitas informações. Apesar dele ter nascido nos Estados Unidos e do avô paterno ter origem italiana, a maior parte da família da avó paterna vem do noroeste da França, principalmente da Normandia. Segundo o genealogista Jean-Louis Bocarneau, que disse ter passado cinco horas na última madrugada pesquisando a árvore genealógica de Leão XIV, o papa tem ancestrais pelo lado materno que foram sapateiros em Nova Orléans, mas provenientes do oeste da França. Existe ainda uma ramificação da família em Marselha, no sul, e parentesco com alguns famosos. Leão XIV seria um primo distante da atriz Catherine Deneuve e do escritor Albert Camus. Desafios do pontificadoEspecialistas no Vaticano e católicos dizem que um dos maiores desafios de Leão XIV será a unificação da Igreja, impactada pelas divisões internas entre ultraconservadores, conservadores e progressistas. A polarização aumentou durante o pontificado de Francisco, e Leão XIV precisará encontrar maneiras de promover a unidade sem abandonar o legado de abertura do papa argentino.O La Croix traz uma lista de 12 trabalhos do papa Leão XIV, como se fossem os 12 trabalhos de Hércules, que envolvem, entre outros questionamentos, o lugar de mulheres e laicos na Igreja, uma abertura iniciada por Francisco em cargos administrativos, mas considerada insuficiente. Questões de ética sexual e familiar, como o acolhimento de famílias homoafetivas na Igreja e o enfrentamento dos escândalos de abusos sexuais, continuam muito sensíveis.Leão XIV precisará se posicionar sobre questões globais, como as mudanças climáticas, guerras, migrações e a pobreza extrema. Reafirmar os laços entre o Cristianismo e o Judaísmo, mantendo um posicionamento equilibrado sobre o conflito na Faixa de Gaza. Como pontífice americano, Leão XIV terá de ser cuidadoso com o presidente Donald Trump e com seu vice JD Vance, que ele criticou publicamente nas redes sociais antes de ser eleito. Outro dossiê urgente é sanear a crise financeira no Vaticano, que teria registrado um déficit de € 87 milhões (€ 554 milhões) no ano passado, segundo estimativas não oficiais. As receitas estão em queda há vários anos e existe um problema crônico de má gestão na Santa Sé, que o papa Francisco começou a tratar, mas não resolveu totalmente.
Os franceses e francesas estão cada vez mais adeptos aos relacionamentos abertos. A quantidade de casais que adotam esse modo de se relacionar ou dispostos a esse tipo de experiência vem aumentando no país, enquanto as identidades sexuais também evoluem. Daniella Franco, da RFI em ParisSegundo uma pesquisa do Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop) para o aplicativo de encontros extraconjugais Gleeden, as relações “alternativas” vêm atraindo cada vez mais adeptos no país. Embora a monogamia seja majoritária (65%), 8% das pessoas entrevistadas afirmam estar atualmente em um relacionamento aberto.Em 2017, apenas 1% dos franceses afirmava seguir essa tendência, o que mostra um aumento de 7% em relação a 2025. Além disso, 15% das pessoas entrevistadas pelo Ifop afirmam que já estiveram em um relacionamento aberto.O número é ainda maior quando o balanço se concentra nos parisienses. Na capital francesa, 17% dos homens e mulheres acima dos 18 anos afirmam estar em um relacionamento aberto atualmente. Mas 23% das pessoas entrevistadas e que vivem em Paris dizem que já fizeram parte de um casal poligâmico em algum momento da vida.Para o diretor do pólo Gênero, Sexualidades e Saúde Sexual do Ifop, François Kraus, a discrepância entre Paris e o resto da França não é surpreendente. “O casal livre é algo mais valorizado socialmente nos meios progressistas”, analisa o responsável pela pesquisa, François Kraus, em entrevista ao jornal Libération.De fato, a capital francesa, administrada por uma mulher, a prefeita Anne Hidalgo, do Partido Socialista, vota tradicionalmente em partidos progressistas e de esquerda. O posicionamento político, aliás, é uma característica relevante para os adeptos do relacionamento aberto. A maior porcentagem dos parisienses que já estiveram em um casal poligâmico é registrada entre simpatizantes do partido da esquerda radical França Insubmissa (32%).Jovens e gays: perfil dos adeptos aos relacionamentos abertosO estudo do Ifop confirma o que outras pesquisas já vêm mostrando nos últimos tempos sobre a sexualidade da população francesa. Os adeptos dos relacionamentos abertos são principalmente adultos jovens, na faixa dos 25 aos 34 anos (23%).Além disso, quase a metade dos casais não-monogâmicos hoje na França é formado por homens gays e bissexuais (47%), seguidos por lésbicas e mulheres bissexuais (25%). Entre os heterossexuais adeptos aos relacionamentos abertos, 17% são homens e 9% mulheres.Essa escolha de vida também tem um forte marcador de classe social. Os relacionamentos abertos são vividos majoritariamente por pessoas com diploma de estudos superiores (20%) e por cidadãos que exercem profissões consideradas “intelectuais” na França (23%), como médicos, advogados, engenheiros, arquitetos, jornalistas, artistas, professores de universidade, etc.No que diz respeito à tendência política de quem rejeita a norma monogâmica, 26% vota no partido da esquerda radical França Insubmissa, 15% no Renascimento, partido centrista, do presidente Emmanuel Macron, 14% no partido socialista (esquerda mais tradicional), 12% nos ecologistas. Mas pessoas de posicionamento conservador também são adeptos de relacionamentos abertos: 11% votam no Partido Republicano (direita) e 15% no partido de extrema direita Reunião Nacional, segundo a pesquisa do Ifop.Me Too e casamento para todosO diretor do pólo Gênero, Sexualidades e Saúde Sexual do Ifop, François Kraus, avalia que os relacionamentos abertos são uma tendência que “se instala lentamente como uma alternativa a casais monogâmicos e heterossexuais tradicionais”. Segundo o especialista, o movimento Me Too, que surgiu em 2017 questionando a cultura do estupro, colocou em questão as normas conjugais tradicionais.Junto com o casamento para todos, legalizado em 2013 na França, a mobilização feminista também é apontada como a principal responsável pela evolução das identidades sexuais na França. Um outro estudo, divulgado nesta semana, do Instituto Nacional de Estudo Demográficos da França (Ined), mostra que a rejeição à heterossexualidade vem aumentando no país.A mudança é liderada por jovens, principalmente mulheres. Atualmente quase 20% das francesas entre 18 e 29 anos não se considera heterossexual: 10% são bissexuais, 5% panssexuais, 2% lésbicas e outros 2% são assexuais ou não sabe definir. Em 2015, apenas 3% das mulheres não se considerava heterossexual.Entre os homens, a tendência também é observada, mas em uma escala menor. No total, 8% dos franceses que rejeitam a heteronormatividade, 4% bissexuais, 3% homossexuais, 1% assexual ou não sabe definir. Em 2015, eles eram 2%.Segundo o diretor de pesquisa do Ined, Wilfried Rault, a heterossexualidade está "menos atraente" para uma parte dos jovens da França. Segundo ele, outros debates na sociedade, como a conscientização sobre a desigualdade de gêneros nas tarefas domésticas, também contribui para a evolução das identidades sexuais na França.
A morte do papa Francisco provocou intensas reações na França. Enquanto muitos fiéis afirmam que sentirão falta de seu pontificado, católicos mais conservadores rapidamente viraram a página e esperam pela eleição de um sucessor alinhado às suas ideias no próximo conclave. O falecimento de Jorge Mario Bergoglio também ocorre num contexto particular: a França enfrenta o maior escândalo de pedofilia já registrado envolvendo a Igreja Católica no país. De um lado, admiradores das ideias progressistas de Francisco expressaram gratidão e admiração por sua coragem ao abordar temas polêmicos para a Igreja, como a tolerância em relação aos homossexuais, a defesa do direito à comunhão para casais divorciados, a promoção da ecologia integral como parte da doutrina social da Igreja, a atenção constante às populações vulneráveis, as críticas aos excessos do capitalismo e à perda do espírito de fraternidade. Por outro lado, entre os católicos integristas franceses, sua morte foi recebida com alívio.O jornalista de extrema direita Eric Zemmour, ex-candidato à presidência em 2022, afirmou que, para alguns católicos, o pontificado de Francisco foi percebido como um fardo, uma provação por aqueles que ainda mantêm fé na Igreja. Outro ex-presidenciável nacionalista, Philippe de Villiers, disse que Francisco era um papa "woke" que via com bons olhos uma islamização da Europa, o que é uma narrativa falaciosa, mas propagada por conspiracionistas de extrema direita. O papa defendia a tolerância religiosa com os muçulmanos e o diálogo entre religiões. A França é um país onde a defesa da laicidade, da separação entre Igreja e Estado, é muito forte. Por isso, o presidente Emmanuel Macron está sendo criticado por participar do funeral do papa no Vaticano, no sábado (26). Vários políticos de esquerda argumentam que a presença do chefe de Estado em um evento religioso pode ser vista como uma contradição ao princípio de laicidade, inscrito no primeiro artigo da Constituição Francesa. No entanto, outros defendem que a participação de Macron é um gesto diplomático e simbólico, considerando a relevância global do papa Francisco e seu impacto além da esfera religiosa. Deputados de esquerda apontaram a incoerência de Macron e da primeira-dama Brigitte estarem presentes na Praça de São Pedro, enquanto ele nunca participou, nem sequer cogitaria participar, de uma cerimônia em homenagem a um líder religioso muçulmano, judeu ou budista.O chefe do governo francês, François Bayrou, também está sendo criticado por ter decidido que amanhã as bandeiras francesas ficarão a meio mastro em homenagem ao papa. Muita gente lembrou que quando o papa João Paulo 2° morreu, em 2005, e Bayrou exercia um mandato parlamentar, ele criticou o então primeiro-ministro por colocar as bandeiras a meio mastro e ferir um princípio constitucional.Novo escândalo de pedofilia na Igreja francesaHá quatro meses no cargo, a sobrevivência política de Bayrou depende dos deputados de direita e centro, em sua maioria ligados ao eleitorado católico. Mas ele já está desgastado por um escândalo relacionado com a Igreja francesa. Pai de seis filhos, o premiê francês educou os filhos em um colégio católico nos Pirineus, chamado Notre Dame de Bétharram. Nos últimos meses, mais de 200 ex-alunos dessa escola denunciaram à Justiça terem sofrido violência física e abusos psicológicos e sexuais cometidos por padres e ex-funcionários do colégio, entre 1950 e 2010, ou seja, durante seis décadas. A mulher do atual primeiro-ministro trabalhava como professora de catecismo no estabelecimento e nunca denunciou a hierarquia à Diocese. Para completar, a filha mais velha do casal, Hélène Perlant, lançou um livro nesta semana em que detalha o grau de violência que reinava nessa escola católica e o episódio em que foi espancada por um padre, quando tinha 14 anos, durante uma viagem escolar. Ela afirma que nunca contou esse incidente ao pai, que tem longa carreira política.A quantidade de denúncias de ex-alunos é tão expressiva que o "caso Bétharram" já é considerado o maior escândalo de pedofilia ligado à Igreja Católica na França.Batismos em altaEmbora se tenha ouvido nos últimos dias duras críticas a respeito de o papa não ter ido longe o suficiente no combate à pedofilia na Igreja, o número de franceses adultos que decidem se batizar está em alta há alguns anos. O período da Páscoa é o preferido para a organização desse tipo de cerimônia nas igrejas. Uma pesquisa publicada na quarta-feira (23) pela Conferência Episcopal Francesa apontou um aumento de 45% nos batismos de adultos em 2025, principalmente na faixa etária abaixo de 25 anos, e de 33% entre adolescentes, em relação ao ano passado. No total, 10.384 adultos receberam o batismo na semana da Páscoa, e o número de batizados entre 18 e 25 anos superou o de pessoas entre 26 e 40 anos.O Episcopado francês atribui esse súbito ganho de interesse pela Igreja a um desejo de esperança em um mundo caótico e também a uma busca de pertencimento, de fazer parte de uma comunidade de pessoas com valores semelhantes. As redes sociais também desinibiram os jovens franceses para falar de fé, com vários influenciadores seminaristas e freiras, envolvidos com o proselitismo religioso.
Um estudo do instituto Opinion Way divulgado nesta quinta-feira (17) aponta que 53% dos franceses estão consumindo menos carne. Os motivos são três: o preço do produto, a preocupação com o meio ambiente e a causa animal. A pesquisa foi realizada a pedido da empresa Charal – uma das gigantes do setor agroalimentar na França – e confirma uma mudança nos hábitos alimentares da população francesa. A queda não diz respeito apenas à frequência do consumo de carne bovina, mas também na diminuição das porções. Outras pesquisas ainda apontam para uma redução de peixes, aves e de produtos de origem animal.Segundo o Opinion Way, a queda no consumo de carne bovina na França é mais pronunciada nas faixas etárias dos 45 aos 60 anos e dos 61 anos para cima. Ela é mais estável nas faixas etárias dos 26 aos 44 anos e dos 18 aos 25 anos, porque a população mais jovem já tem o hábito de consumir menos produtos de origem animal. O estudo também aponta que metade dos jovens da faixa etária dos 18 aos 25 anos não gosta mais de carne bovina.O estudo também traz outros dados sobre os hábitos alimentares dos franceses. No total, 67% das pessoas ouvidas pelo Opinion Way são onívoras, 24% são flexitarianas e 5% são vegetarianas ou veganas. Os maiores consumidores de carne bovina estão na faixa etária a partir dos 61 anos.Preço, causa ambiental e animalOs motivos que explicam a diminuição do consumo de carne bovina na França também variam conforme a faixa etária. A partir dos 45 anos, a queda ocorre devido ao aumento dos preços.Em média, o quilo da carne de gado na França custa € 14 (R$ 91). Em 2024, o valor do produto registrou um salto de quase 10% e neste ano a previsão é de um aumento entre 10% e 20%.O balanço do Opinion Way também ressalta que faixas etárias superiores valorizam produtos de maior qualidade. Desta forma, a partir dos 45 anos, os consumidores preferem sacrificar a quantidade em prol da compra de carnes mais nobres.Já entre as faixas etárias mais jovens, a diminuição é motivada pela causa ambiental e animal. Segundo a pesquisa, 50% dos entrevistados da faixa etária dos 18 aos 25 anos dizem que diminuíram o consumo de carne bovina por causa dos prejuízos ao meio ambiente relacionados à criação de gado. Além disso, 48% dos entrevistados mais jovens se opõem ao tratamento dado aos animais nas fazendas.É possível ser saudável sem comer carne?Para o endocrinologista e nutricionista Boris Hansel, do hospital Bichat, em Paris, é possível ser saudável sem comer carne vermelha. Em entrevista à Franceinfo, ele ressalta que peixes, ovos e produtos de origem vegetal podem suprir a necessidade de proteína. “A ideia não é de se proibir de comer carne, mas de saber que podemos viver sem”, defende."A carne é uma fonte importante de proteína e, se não a consumimos, é preciso compensar com outras fontes de proteína", acrescenta o nutricionista.O especialista também lembra que comer muita carne vermelha representa um alto risco de desenvolver câncer colorretal. Por isso, ele recomenda limitar o consumo a menos de 500 gramas por semana: “Carne vermelha pelo prazer, sim; carne vermelha pela saúde, não”, salienta.Nos últimos 20 anos, a queda do consumo de carne bovina na França foi de 19%. Nos anos 1980, a média de consumo por pessoa adulta era de 100 quilos por ano. Atualmente, a média é de pouco mais de 83 quilos por ano.A mudança nos hábitos dos franceses também leva o setor do agroalimentar a se adaptar, revendo estratégias. Algumas empresas estão transformando a sua forma de produção para demonstrar respeito às normas ambientais e à causa animal. Já outras veem uma oportunidade para diversificar, investindo, por exemplo, no setor da proteína vegetal ou em produtos veganos.
A guerra comercial do presidente americano, Donald Trump, tem ampliado o boicote de produtos americanos na França. As reservas de viagens para os Estados Unidos neste verão, em julho e agosto, para Nova York, Los Angeles e São Francisco, caíram de 23% a 26% em relação ao ano passado. O aumento dos preços das passagens aéreas influi nesse recuo, mas as tensões geopolíticas, a guerra comercial e a atitude de desprezo de Trump pelos europeus abriu um fosso entre as duas regiões. O movimento anti-Trump e de boicote aos Estados Unidos já tem alguns meses. Começou desde que o republicano se aproximou do presidente russo, Vladimir Putin, cedendo às pressões de Moscou nas negociações para um cessar-fogo na Ucrânia, em condições desfavoráveis aos ucranianos – sem resultados até o momento –, e só foi piorando com as repetidas humilhações aos europeus, chamados de "aproveitadores" e "parasitas" pela equipe de Trump, do vice J.D. Vance, ao secretário da Defesa, Pete Hegseth, e Elon Musk. Na segunda quinzena de março, antes da tempestade tarifária, uma pesquisa Ifop já mostrava que 62% dos franceses apoiavam o boicote aos produtos americanos, e 32% estavam evitando certas marcas, como Coca-Cola, McDonald's, Tesla e Starbucks. Essa reação pode ser questionada, uma vez que essas empresas também geram empregos na França. Mas a rejeição é fortalecida por uma outra tendência: a do consumo responsável. Atualmente, 81% dos franceses preferem consumir produtos locais para apoiar a economia francesa e a transição ecológica.É curioso que a taxa de boicote chega a 51% entre pessoas que se declaram "muito feministas" e 55% entre aquelas que se definem como "muito progressistas" em questões sociais. Outro sinal de boicote: as reservas de viagens para os Estados Unidos neste verão, em julho e agosto, recuaram. Todos perdem com essa crise, a começar pelos americanos, que além da ameaça de inflação agora percebem uma outra consequência: os Estados Unidos estão perdendo a posição de economia mais segura do planeta. O aumento dos juros dos títulos da dívida (US$ 29 trilhões), desde quarta-feira (9), demonstra o abalo estrutural na confiança dos investidores pelos ativos americanos e no próprio dólar como reserva de valor. Alemanha começa a repatriar reservas de ouro dos EUAA Alemanha e outros investidores europeus estão repatriando as reservas de ouro que mantêm no banco central americano (Federal Reserve), por perda de confiança e pelo temor de decisões arbitrárias de Trump na área jurídica. O republicano voltou atrás e suspendeu por 90 dias as tarifas adicionais que tinha imposto à União Europeia. Ele baixou de 20% para 10%, no mesmo dia em que elas entraram em vigor. Mas aço, alumínio e veículos continuam com 25% de sobretaxas. Para os governos europeus, essa decisão não representa um recuo de Trump, mas talvez só uma forma dele atacar com mais virulência no futuro.O presidente Emmanuel Macron fez esse alerta nesta sexta-feira: serão três meses de profunda incerteza para as empresas e nenhuma garantia. A União Europeia deve continuar trabalhando em futuras retaliações, disse Macron. Apesar do pessimismo generalizado, a maioria dos analistas franceses aprovaram a reação moderada da União Europeia, que, sem entrar numa escalada, taxou alguns produtos americanos, e suspendeu em seguida quando Trump se mostrou disposto a negociar. A imagem da UE como um bloco dividido, incapaz de agir unido e lento na tomada de decisões está melhorando, por obra do Trump. Desta vez, a Comissão Europeia antecipou os cenários e tudo está bem amarrado com os líderes dos 27 países. Na segunda-feira (14), o secretário europeu do Comércio, o eslovaco Maros Sefcovic, vai a Washington negociar as tarifas. Os europeus já aceitaram pagar mais caro pelo gás liquefeito importado dos EUA, uma cobrança de Trump para reequilibrar a balança comercial. Atualmente, a Europa ainda precisa dessa fonte de energia, mas essa despesa tende a diminuir com o avanço da transição energética. Pouco importa se a primeira-ministra de extrema direita da Itália, Georgia Meloni, vai aparecer durante a semana posando ao lado de Trump, na Casa Branca. Meloni não tem meios de romper com a unidade dos europeus nesse momento.Enxurrada de produtos chineses no blocoA Comissão Europeia está bastante preocupada com a possível enxurrada de produtos baratos provenientes da China. No ano passado, só na França, os sites chineses Shein e Temu faturaram juntos cerca de R$ 32 bilhões (€ 4,8 bilhões), equivalentes em número de remessas ao dobro de 2023 e três vezes mais do que 2022. Até agora, o maior mercado desses varejistas era os Estados Unidos, com vendas estimadas em US$ 46 bilhões. Mas com a sobretaxa americana de 145% sobre as importações chinesas, e a retaliação de 125% do governo chinês, a União Europeia e seus 450 milhões de consumidores se tornam um mercado estratégico para Pequim. Há dois anos, os europeus negociam com a China o fim de uma isenção alfandegária para remessas inferiores a R$ 1.000 (€ 150). A medida vai na mesma linha da "taxa das blusinhas" de Trump. Enquanto esta isenção não desaparece, a UE promove investigações e aplica multas a essas plataformas chinesas por falsificação de produtos e descumprimento de regras de segurança.O principal objetivo da Comissão é tratar de forma global o excedente industrial chinês, seja em relação aos carros elétricos, painéis solares, remédios, às torres eólicas ou máquinas industriais. Na terça-feira, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, já conversou por telefone sobre o assunto com o primeiro-ministro chinês, Li Qiang. As rodadas de diálogo continuarão até a Cúpula China-UE, prevista em junho.Ilha de democraciaNesse momento de mudança na ordem geopolítica internacional, muitos se questionam se pode haver uma maior aproximação da UE com a China. Nesta sexta, o presidente Xi Jinping defendeu que Pequim e o bloco europeu devem "resistir juntos" a qualquer coerção unilateral dos Estados Unidos. Mas a possibilidade de um estreitamento das relações entre europeus e chineses é complexa e depende de vários fatores. O apoio econômico e diplomático da China à Rússia na guerra na Ucrânia não é aceito pela opinião pública na Europa. O desequilíbrio de balança comercial entre a China e o bloco é gigantesco, mas juntos os 27 países ainda são a terceira região mais rica do mundo. Questões de direitos humanos e transparência continuam sendo barreiras para uma aliança mais profunda. Os europeus acreditam que, apesar do momento difícil que estão atravessando, o mais grave desde o fim de Segunda Guerra Mundial, o bloco ainda é uma região com forte potencial de recuperação de competitividade, por causa de um de seus principais ativos: a democracia. Entre os desvarios de Trump e sociedades controladas por governos autoritários, como é a China, os europeus pretendem manter sua atratividade pela estabilidade de regras.
O Senado francês aprovou na quinta-feira (3) um novo projeto de lei contra as violências sexuais e sexistas, que menciona, pela primeira vez, a noção de “controle coercitivo” que se refere a tipos de abusos emocionais em um casal. O texto suscita um debate na França sobre um tipo de agressão considerada o ponto de partida para feminicídios. Daniella Franco, da RFIOs senadores franceses aprovaram por unanimidade o texto que tem por objetivo reforçar a luta contra as violências sexuais e sexistas. O projeto de lei, de autoria da deputada Aurore Bergé, do partido governista República em Marcha, foi criado na esteira do julgamento da francesa Gisele Pélicot, sedada e abusada pelo marido e por dezenas de desconhecidos que ele recrutava na internet. Já a emenda relativa ao controle coercitivo foi adicionada por iniciativa da deputada centrista Sandrine Josso, vítima de submissão química por parte de um senador francês, Joel Guerriau, em 2023.Apesar da sensibilização da opinião pública sobre a questão, e do apelo de organizações feministas e especialistas em violências domésticas, os senadores retiraram do texto o termo “controle coercitivo”, mantendo apenas a definição deste tipo de abuso. Desta forma, o novo projeto de lei prevê punir “comportamentos repetitivos que tenham como objetivo (…) restringir gravemente a liberdade de ir e vir da vítima”, através de “ameaças ou pressões psicológicas, econômicas ou financeiras”.Os senadores consideram que o conceito sociológico do controle coercitivo é “evolutivo” por natureza, o que pode complicar a interpretação da legislação. Por isso, o Senado francês preferiu não considerar esse tipo de violência como uma infração autônoma. No entanto, ele cita os tipos de abusos emocionais que podem ocorrer em relações conjugais e que são passíveis de punição.As penas previstas no novo projeto de lei para essas agressões vão de três anos a cinco de prisão e entre € 45 mil e € 75 mil de multa (equivalente a R$ 285 mil e 480 mil). O texto ainda volta para a Assembleia de Deputados para uma última leitura antes de ser promulgado e virar lei.Controle coercitivo: conceito que data dos anos 1950Há várias formas de definir o controle coercitivo, que dizem respeito a uma série de táticas que um agressor exerce sobre a vítima, com o objetivo de isolar, degradar, humilhar e ameaçar. Esse abuso psicológico pode ocorrer em diversos tipos de relações, mas é muito mais recorrente em casais.A expressão “controle coercitivo” foi criada em 1957 nos Estados Unidos pelo pesquisador em psicologia social Albert Biderman, para descrever métodos usados com prisioneiros americanos durante a guerra da Coreia. Alguns anos depois, a ideia começou a aparecer na literatura feminista dos anos 1970. Mas a noção de controle coercitivo em relações conjugais abusivas só se tornou uma teoria em 2007, com o sociólogo americano Evan Stark, especialista no combate às violências domésticas.Estudos mostram que o controle coercitivo é a porta de entrada para outras agressões em relações conjugais. A psicóloga e pesquisadora francesa Andreea Gruev-Vintila, defende que esse tipo de abuso é “o precursor de feminicídios, suicídios forçados e de homicídios de filhos e filhas”.Em entrevista à France Info, a advogada Pauline Rongier, especialista em violências contra as mulheres, acredita que a inserção do conceito de controle coercitivo na lei permitirá à sociedade conhecer melhor o fenômeno e às vítimas a se darem conta mais rapidamente desse abuso para poderem agir de forma eficaz.Atualmente a França conta com 271 mil vítimas de violências domésticas, segundo um balanço do jornal Le Monde publicado nesta semana: 85% delas são mulheres. No ano passado, o país registrou ao menos 92 feminicídios. Em 9 de cada 10 assassinatos de mulheres por maridos, companheiros ou namorados, a situação de controle coercitivo já existia antes da morte.Países pioneiros na criminalização do controle coercitivoA Inglaterra e o País de Gales foram os primeiros a criminalizar o controle coercitivo, em 2015. Depois foi a vez da Escócia, em 2018. Nos Estados Unidos, Havaí e Massachusetts inscreveram o controle coercitivo em suas legislações, em 2020 e 2024, respectivamente. A Austrália também conta com dois estados que punem por lei esse tipo de abuso desde o ano passado, New South Wales e Tasmânia.Na Europa, a Bélgica também inseriu a noção do controle coercitivo em sua lei contra as violências sexuais e sexistas, mas sem considerá-lo um delito autônomo.Apesar de os britânicos terem sido pioneiros na questão, o combate ao controle coercitivo no país ainda deixa a desejar, com poucas condenações por esse motivo. Na Escócia, apenas 6% dos casos relacionados à violência doméstica são processados com base nele.
A Justiça vem sendo atacada por movimentos populistas de extrema direita em vários países, Brasil, Estados Unidos e Israel, para citar alguns. A França não escapa dessa retórica construída para desqualificar as decisões de juízes e procuradores, tomadas à luz da lei, mas deturpadas como se fossem "condenações políticas". Juízes franceses, geralmente reservados por dever profissional, têm apontado campanhas de desinformação a respeito deles nas redes sociais, com a publicação dos endereços onde moram, às vezes acompanhados de chamados à violência física e à vingança por decisões que desagradaram uma minoria de pessoas. Atualmente, há 20 juízes sob proteção policial na França, depois de receberem ameaças de morte. Alguns casos são relacionados com sentenças aplicadas contra o crime organizado e o tráfico de drogas, mas uma parte deles é difamada pela atuação em processos que envolvem políticos.Essa pressão sobre o Judiciário, que desafia garantias constitucionais de independência dos poderes, se intensificou e, hoje, é considerada uma ameaça à democracia e ao Estado de Direito.Veredicto para Marine Le PenAtualmente, a líder de extrema direita francesa, Marine Le Pen é julgada por desvio de verbas públicas. Os juízes desse processo têm recebido ameaças de morte há alguns meses. Na segunda-feira, 31 de março, Marine Le Pen conhecerá o veredicto de uma ação penal em que ela, seu partido Reunião Nacional (RN) e 24 integrantes da sigla são acusados de ter desviado verbas destinadas à bancada da legenda no Parlamento Europeu, para o pagamento de despesas de funcionamento do partido na França, durante 12 anos, o que é ilegal. Esse desvio de milhões de euros de prejuízo ao Parlamento Europeu já foi em parte reembolsado pelo partido de Marine Le Pen, em um reconhecimento implícito de culpa. A Justiça francesa abriu uma investigação à parte, descobriu outras irregularidades e agora pode condenar Marine Le Pen a cinco anos de prisão, acompanhados de inelegibilidade com execução imediata da pena, mesmo se ela apresentar um recurso contra a condenação, o que a impediria de disputar a eleição presidencial de 2027. Como acontece no Brasil com bolsonaristas descontentes com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro réu por tentativa de golpe de Estado, na França os militantes do partido de Le Pen acusam a Justiça local de tentar influenciar o processo eleitoral. Durante os interrogatórios, a juíza titular do caso, Bénédicte de Perthuis, insistiu em obter respostas claras de Marine Le Pen sobre o pagamento dos salários desses colaboradores, mas ela se esquivou de fornecer os esclarecimentos, repetindo várias vezes a mesma versão, de que não havia feito nada de ilegal. Le Pen desviou a atenção do público das acusações, para sinalizar uma suposta politização da Justiça. Narrativas manipuladas inflamam as redes sociaisEssa tática da extrema direita de questionar as decisões de juízes é vista em vários países. Entre ultraconservadores e políticos de perfil autoritário virou regra bater na Justiça, minar a confiança dos eleitores na instituição por meio de campanhas de difamação e desinformação na internet, desviar a atenção da gravidade das acusações e das provas recolhidas nos inquéritos, para o réu se apresentar como vítima de perseguição política. A incitação à vingança contra os juízes é uma consequência dessas narrativas manipuladas. Um grupo de militantes de Le Pen que defendeu em um chat na internet "atirar na nuca dos juízes do caso", ou seja, promover execuções sumárias, está sendo investigado. Um agravante inesperado nesse caso foi o atual primeiro-ministro de centro-direita, François Bayrou, também processado no passado por empregos-fantasma em seu partido, ignorar o princípio de separação dos poderes e considerar o julgamento contra Marine Le Pen "injusto". Os juízes franceses ficaram furiosos com essa postura do chefe do Executivo.Sarkozy cai na teia das próprias contradiçõesNa quinta-feira (27), a Justiça francesa pediu sete anos de prisão contra o ex-presidente de direita Nicolas Sarkozy em um caso de corrupção. O Ministério Público e os juízes do processo também sofreram pressões.Sarkozy defende sua inocência desde o início do julgamento e considerou a pena requisitada "escandalosa" e "violenta". Ele se sente perseguido pela Justiça, apesar de ser suspeito de ter armado "um pacto de corrupção" com o ex-ditador líbio Muammar Kaddafi para financiar sua campanha presidencial de 2007. Para os procuradores do caso, todos os crimes pelos quais Sarkozy está sendo julgado, desde janeiro, foram comprovados: corrupção, encobrimento de desvio de dinheiro público, financiamento ilegal de campanha e associação criminosa. A Procuradoria Financeira de Paris trabalha para recolher provas sobre esse caso, revelado pelo site de jornalismo investigativo Médiapart, desde 2013, depois do fim do mandato presidencial e de Sarkozy ter perdido a imunidade do cargo. No ano seguinte, quando descobriu que estava com um telefone grampeado pelos investigadores, Sarkozy publicou um artigo num jornal comparando os métodos dos juízes franceses aos da Stasi, a polícia secreta comunista da ex-Alemanha Oriental. Políticos de direita reagem com frequência da mesma forma: a Justiça "é de esquerda", "comunista", "vermelha". O pedido dos investigadores para instalar a escuta foi motivado por indícios concretos e cumpriu os requisitos legais.Esses ataques para desacreditar o Judiciário e transmitir uma ideia de parcialidade têm sido banalizados. Sarkozy já foi condenado, em outro caso, a um ano de prisão por corrupção, pena que cumpre em casa com uma tornozeleira eletrônica. Centenas de ameaças por anoO Ministério da Justiça francês registra, em média, 150 ameaças a juízes nos tribunais por ano. O Tribunal de Bobigny, no subúrdio de Saint-Denis, na região parisiense, documentou nos últimos três anos um aumento das tentativas de agressão nas salas de audiência. Alguns casos se tornaram famosos. Em 2022, depois do presidente de um tribunal anunciar a condenação de um réu, cerca de 30 pessoas que estavam na sala, entre elas a mãe e a irmã do acusado, voaram para cima dos policiais que faziam a segurança do réu para tentar soltá-lo na marra.Houve também o substituto de um promotor que foi alvejado com um sapato na cabeça enquanto apresentava as alegações finais de acusação. Além do caso de uma juíza da Vara da Infância que teve parte do couro cabeludo arrancado por uma mãe que discordou da decisão judicial ao encontro da filha dela. Magistrados franceses têm alertado que a polarização permanente nas redes sociais, as teorias da conspiração e campanhas de difamação instrumentalizadas contra o Judiciário, para além da crítica legítima, criam uma atmosfera de desconfiança que sai do controle, pondo em risco princípios básicos da democracia.
Profissionais que trabalham com a prevenção da Aids na França estão preocupados com a redução das campanhas de informação sobre o vírus HIV, principalmente entre os jovens. A maior ONG francesa de prevenção contra a Aids, chamada Sidaction, começou nesta sexta-feira (21) três dias de coleta de doações para financiar a pesquisa de tratamentos contra o vírus HIV. Para essa campanha anual, que já acontece há 31 anos, a associação publicou um estudo atualizado sobre o grau de informação e conhecimento da população sobre a Aids. Os resultados surpreenderam.O estudo revelou que 42% dos jovens franceses na faixa etária de 15 a 24 anos ainda acreditam que a Aids pode ser transmitida pelo beijo; 40% acham que existe uma vacina contra o HIV; 78% acreditam que uma pessoa que fez um tratamento antirretroviral eficaz continua a transmitir o vírus, o que cientificamente não é mais o caso com o avanço dos novos tratamentos. Sem falar nos jovens que acham que a pílula do dia seguinte, para evitar uma gravidez indesejada, também protege contra o HIV.Enfermeiras que trabalham em escolas de ensino médio e fazem parte da rede de prevenção e educação para o uso de contraceptivos e doenças sexualmente transmissíveis (DST) dizem que os distribuidores automáticos de preservativos, instalados nos colégios franceses a partir do ano 2000, não têm sido mais reabastecidos. Muitos ficam vazios, outros escondidos atrás de paredes, onde muitos alunos sequer sabem que existem.Falta educação nas escolasPais de estudantes têm reclamado que os filhos não são mais sensibilizados no ambiente escolar sobre o uso da camisinha, que ainda é o método mais simples e eficaz contra as DST, principalmente no início da vida sexual. Não se vê mais cartazes de prevenção contra a Aids nos banheiros, como se via dez anos atrás.Segundo a pesquisa feita pela ONG Sidaction, a maioria dos jovens de 15 a 24 anos não sabe sequer onde fazer um teste de diagnóstico do HIV, sendo que o exame é gratuito em qualquer laboratório da França, sem necessidade de pedido médico.Médicos do trabalho também constatam o mesmo relaxamento do Estado nas campanhas de prevenção para adultos. É como se a Aids tivesse se tornado invisível no espaço público.De acordo com os dados de 2023, ano do último levantamento do Ministério da Saúde francês, 5.500 novos soropositivos foram diagnosticados. O público que mais sofreu contaminação foi o de homens heterossexuais com idades acima de 50 anos. Estudos qualitativos mostram que muitos se infectaram depois de uma separação, por falta de informação e descuido na prevenção.A França tem atualmente 200.000 pessoas que vivem com o HIV e 10.000 que são provavelmente portadoras do vírus e não sabem.Ativistas notam que entre alguns grupos da população, como entre homossexuais, o relaxamento com a prevenção está relacionado com o avanço dos tratamentos, com o fato de a medicina ter conseguido reduzir as mortes por Aids. Voluntários que vão a bares e clubes distribuir preservativos conversam com os frequentadores sobre o assunto.Profilaxias pré e pós-exposiçãoEles notam que desde o aparecimento de antirretrovirais que podem ser tomados de 2 a até 72 horas após a exposição de risco para impedir a infecção (Profilaxia Pós-Exposição, PEP) e também o uso regular de medicamentos pelos grupos considerados de alto risco, que conseguem prevenir a infecção pelo HIV (Profilaxia Pré-Exposição, PrEP), caiu bastante o uso do preservativo.Voluntários da Sidaction dizem que voltou a ser frequente, mesmo para uma relação sexual ocasional, a pessoa dizer “se meu parceiro não quiser usar o preservativo, eu não insisto” ou “preservativo incomoda, diminui o prazer, não uso mais”, argumentos que só voltaram a ser citados pela proteção oferecida pelos antirretrovirais.Apesar do sucesso desses tratamentos, na França eles são mais acessíveis nas grandes cidades. Quem vive em zona rural ou num deserto médico não tem essa facilidade de acesso.Outro ponto, segundo o Ministério da Saúde francês, que reembolsa esses antirretrovirais desde 2016, é que só 4,6% das mulheres adotavam esses tratamentos preventivos em 2023, e entre os imigrantes que beneficiam de um Auxílio Médico do Estado (AME), o acesso à PEP e à PrEP era de 0,1%.Epidemia pode voltar com forçaAs autoridades francesas estão preocupadas com o impacto dos cortes do governo de Donald Trump na área da saúde. A decisão do republicano de suspender a ajuda externa dos Estados Unidos já interrompeu “substancialmente” o fornecimento de tratamentos para o HIV em vários países da África, no Haiti, na Ucrânia, entre outros, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). É um retrocesso que pode apagar 20 anos de progresso da ciência nessa área.Mais do que nunca, o preservativo vai continuar a ser o meio mais barato, de fácil acesso e seguro contra doenças sexualmente transmissíveis, que não deve desaparecer do conjunto de medidas de prevenção contra o HIV.
Os ventos fortes acompanhados de temporais que marcaram a semana em São Paulo também têm se tornado frequentes em Paris, em decorrência da mudança climática. Porém, uma diferença marcante entre os gestores das duas cidades é a preocupação com a manutenção das árvores e o papel que elas exercem para tornar o meio urbano mais resiliente ao aumento das temperaturas. A capital francesa tem 200.000 árvores plantadas nas ruas, praças, cemitérios e jardins públicos, e mais 300.000 árvores em dois grandes parques, um localizado na zona leste (Bois de Vincennes) e outro a oeste da cidade (Bois de Boulogne).A prefeitura de Paris é responsável pela manutenção dessas 500.000 árvores e faz isso o ano todo, com os agentes especializados do Departamento de Árvores e Florestas do município. O pessoal que vai a campo tem uma formação técnica de um a dois anos em silvicultura, para poder monitorar, fazer a poda dos galhos, identificar um tronco ou uma raiz doente, providenciar o tratamento, e se necessário, derrubar a árvore que está representando um risco à população.Segundo a prefeitura, as árvores que são plantadas nas ruas de Paris raramente vivem mais de 80 anos. Quando elas estão condenadas, são substituídas por novas, no mesmo lugar. Em meio urbano, algumas espécies resistem melhor do que outras.Árvore mais antiga de Paris tem 424 anosO xixá que caiu no Largo do Arouche, no centro de São Paulo, na quarta-feira (12), tinha cerca de 200 anos. A árvore original da Mata Atlântica tinha perdido galhos, estava enfraquecida e precisava de tratamento. Reportagens mostraram que a prefeitura foi notificada dos problemas, mas não agiu para evitar a queda.A árvore mais antiga de Paris é uma falsa acácia (Robinia pseudoacacia) plantada em 1601 num jardim público do 5° distrito da capital (square René Viviani). Se ela está de pé até hoje, é um sinal de que é bem cuidada.As quedas de árvores, e ainda seguidas de morte, são raríssimas em Paris. A cidade tem registrado chuvas e tempestades cada vez mais fortes, como outras no mundo. Mas esse tipo de morte acidental continua raro na capital francesa. A última grande tempestade em Paris aconteceu em 1999 e derrubou 140.000 árvores, um terço do total que havia na cidade na época.Em outubro do ano passado, um homem de 49 anos morreu na zona norte de Paris, atingido por uma árvore que caiu dentro do condomínio em que morava. A árvore em questão não constava na subprefeitura do bairro como estando doente. Existe um inquérito aberto até hoje para apurar as responsabilidades no caso.Pessoal especializadoO Departamento de Árvores e Florestas de Paris conta com 1.500 agentes, incluindo engenheiros florestais, paisagistas, jardineiros e silvicultores, que entendem de árvores e corte de madeira. O monitoramento de pragas e doenças é feito o ano todo.No início do inverno e da primavera, eles fazem a poda, que ajuda a minimizar o estresse nas árvores e a reduzir o risco de doenças. O plantio geralmente acontece no outono e no começo da primavera. Os cortes definitivos, por razões de segurança, representam menos de 1,5% do patrimônio arbóreo da cidade.Tecnologia a serviço do monitoramento das árvoresDesde 2001, a prefeitura criou um banco de dados computadorizado de todas as árvores existentes em Paris, estabelecendo uma cartografia por bairro. Com a evolução das novas tecnologias, esse sistema foi redesenhado em 2014, quando foi criado um aplicativo móvel, instalado em tablets usadas pelos agentes que vão a campo. Esse aplicativo permite tirar fotografias, inserir informações, produzir relatórios fitossanitários e atualizar o cadastro da árvore.Hoje, cada uma das 200.000 árvores de Paris tem uma "carteira de identidade informatizada", que reúne dados sobre a data de plantio, a frequência com que são regadas, datas das podas, estado de saúde geral – condições fisiológicas, se apresenta feridas, fungos ou marcas de choques. Isso facilita o diagnóstico de árvores que representam alguma espécie de perigo e requerem acompanhamento.Com cabos elétricos enterrados, apagão é raroParis já eliminou há um certo tempo outro problema que São Paulo ainda não resolveu – a quantidade de cabos elétricos aéreos. As obras de enterramento da fiação elétrica começaram nos anos 1930 e sofreram uma aceleração entre 1970 e 1990.Na capital e na maior parte das aglomerações urbanas do país, a rede elétrica é enterrada. Somente em áreas rurais e localidades onde os cabos elétricos ainda são aéreos, habitantes enfrentam cortes de luz quando ocorrem chuvas fortes e inundações. Quando linhas de transmissão são atingidas por raios também ocorrem cortes de energia. Mas os apagões são raros.No início de fevereiro, cinco bairros de Paris e subúrbios ao sul da capital ficaram sem eletricidade durante três horas. Mas a razão foi uma pane técnica em uma central elétrica da periferia, que deixou 100.000 parisienses sem luz.O mais longo apagão registrado na história da França aconteceu em dezembro de 1978. O país ficou às escuras durante quatro horas, devido a uma falha numa linha de alta tensão em Bezaumont, no leste. Vegetalização da cidade no centro da campanha eleitoralDe acordo com o Plano Árvore em vigor, 170.000 árvores deveriam ser plantadas em Paris entre 2020 e 2026: nas ruas, na forma de florestas urbanas, em praças, ao longo do anel viário e nas áreas comuns internas dos prédios. A prefeita socialista Anne Hidalgo pretende cumprir a meta até março de 2026, quando termina seu mandato.Paris é governada pela esquerda há 24 anos, mas a direita quer ganhar a próxima eleição com críticas à segunda parte do plano de vegetalização elaborado por socialistas e ecologistas. A principal candidata na disputa é a atual ministra da Cultura, a conservadora Rachida Dati.Ela argumenta que a vegetalização dos telhados de Paris e a transformação de 150 ruas em corredores de árvores e jardins é uma medida cara para os cofres públicos e ineficaz, se novos edifícios continuarem a ser construídosEntretanto, quando os parisienses veem imagens do projeto, com quilômetros de asfalto substituídos por árvores, para reduzir em quatro graus a temperatura média nos meses do verão, de acordo com os cálculos da prefeitura, a maioria deles aprova.Este será o tema central da próxima campanha municipal, que também tem implicações na redução da circulação de carros na cidade.
O medo de uma Terceira Guerra Mundial nunca foi tão forte na Europa. Com a volta ao poder do presidente americano, Donald Trump, e a aproximação entre os Estados Unidos e a Rússia, pesquisas mostram que a possibilidade que o conflito na Ucrânia se estenda a outros países da Europa assombra o cotidiano dos europeus. O temor de uma guerra em escala europeia ou mundial se intensificou nos últimos dias, principalmente após o constrangedor encontro entre Trump, seu vice, JD Vance, e o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, em Washington, na última sexta-feira (28). A confirmação de que o líder republicano cumprirá suas promessas de campanha, interrompendo o apoio à Kiev, e consequente e rápida movimentação de líderes para discutir o rearmamento das nações mostraram a urgência da situação.O discurso do presidente francês, Emmanuel Macron, na quarta-feira (5), e a cúpula da União Europeia na quinta-feira (6), contribuíram com a tomada de consciência sobre a escalada de tensão. O temor da guerra estampou capas de jornais e foi tema de reportagens nas rádios e TVs da França durante a semana.83% dos franceses preocupados com a guerraVárias pesquisas divulgadas nesta semana mostram o aumento da preocupação dos franceses com o conflito na Ucrânia. É o caso de uma sondagem do Ifop Fiducial, divulgada na quinta-feira, que analisa a evolução deste sentimento.Em março de 2022 - poucos dias após o início da invasão russa - 92% dos franceses se declaravam preocupados com a guerra. Esse apreensão caiu para 75% em maio de 2023 e voltou a subir para 83% neste mês.Outra pesquisa, do instituto Elabe, divulgada nesta semana, mostra que 76% dos franceses pensam que a guerra vai se estender a outros países vizinhos da Ucrânia e 64% acreditam que o conflito pode chegar na França.Esse mesmo estudo mostra a oposição da população francesa no envolvimento direto no conflito: 68% das pessoas entrevistadas são contra o envio de soldados do país para combater na Ucrânia. Além disso, 73% acreditam que os Estados Unidos não são mais um país aliado.Um levantamento do instituto YouGov divulgado na quinta-feira aponta que britânicos, alemães, espanhóis, franceses e italianos veem Trump como uma grande ameaça à paz e à segurança na Europa.A população portuguesa também está apreensiva com a volta de Trump ao poder, segundo uma pesquisa divulgada em janeiro. O balanço indica que o maior medo em Portugal neste início de ano é de uma Terceira Guerra Mundial, um sentimento diretamente relacionado com o retorno do líder republicano à Casa Branca.Discurso marcial de MacronNa noite de quarta-feira, o presidente francês, Emmanuel Macron, fez um pronunciamento de pouco mais de 13 minutos em cadeia nacional de rádio e TV adotando um tom marcial e referindo-se diretamente à “ameaça russa” à Europa.Em um tom grave, o líder centrista afirmou que a Europa está entrando em “uma nova era”. Segundo ele, a preocupação da população com o aumento das tensões é “legítima”. “Se um país pode invadir impunemente seu vizinho na Europa, ninguém mais tem certeza de nada”, disse.No discurso que alcançou quase 72% da audiência na TV francesa, Macron também expressou sua vontade de lançar um “debate estratégico” sobre a dissuasão nuclear. Além disso, o líder centrista apelou ao patriotismo da população.“O país precisa de vocês, do engajamento de vocês”, afirmou. No entanto, Macron defende, por enquanto, uma mobilização de forças europeias após a assinatura de um acordo de paz entre a Ucrânia e a Rússia , para garantir o respeito do eventual compromisso.Convocação “acordou” a juventude, diz jornalO jornal Le Parisien desta sexta-feira (7) traz em sua reportagem de capa a preocupação dos jovens franceses com a possibilidade de uma extensão da guerra à França. O diário nota que, ao “mencionar abertamente” a “ameaça russa” e dizer que “a França precisa de vocês”, Macron sinalizou que a possibilidade de um confronto armado com Moscou “não é mais abstrata”. Le Parisien ouviu jovens pelo país que explicam observar os acontecimentos “ora com ansiedade, ora na negação”.O medo do futuro aumenta uma angústia que já vinha se acentuando nos últimos anos, com a pandemia de Covid, a emergência climática – que leva muitos a não querer mais ter filhos – e as guerras na Ucrânia e em Gaza. Alguns têm tido pesadelos recorrentes com as notícias e a ideia de Paris ser bombardeada, e já planejam onde poderão se refugiar no caso de uma guerra – para a vizinha Bélgica ou a distante Austrália, por exemplo.Outros, ao contrário, dizem estar prontos para se engajar, como uma estudante de Ciências Políticas de 20 anos que fez serviço militar aos 18. “Sou uma reservista e nos deixaram claro que isso significa que um dia eu poderia ir para o front militar”, afirmou ela, ao diário.O Ministério da Defesa se mostra otimista quanto ao patriotismo dos jovens franceses. Em 2015, ano da série de atentados terroristas contra o jornal Charlie Hebdo e o Bataclan, o país teve 50 mil alistamentos a mais nas Forças Armadas. O ano passado também foi favorável: após vários anos de queda, em 2024 o número de candidatos atingiu a meta, de cerca de 27 mil alistamentos.
A cerimônia de entrega do prêmio César de cinema, considerado o Oscar francês, acontece nesta sexta-feira (28) em Paris. O filme brasileiro "Ainda Estou Aqui", de Walter Salles, tem coprodução francesa, mas ficou fora das indicações. O favorito ao prêmio de melhor filme é "Emilia Pérez", do diretor Jacques Audiard. O longa estrelado por Fernanda Torres e Selton Mello não foi nomeado em nenhuma categoria do César por ter estreado nos cinemas franceses apenas neste ano. A seleção oficial se baseia nos filmes que chegaram às salas francesas em 2024. "Ainda Estou Aqui" teve pré-estreias em dezembro, mas só chegou aos cinemas em 15 de janeiro. Pode ser que o longa brasileiro seja selecionado em 2026. Disputam o César de melhor filme estrangeiro os longas americanos "Anora", "O Aprendiz", "A Substância", com Demi Moore, dirigido pela francesa Coralie Fargeat, o iraniano "A Semente do Fruto Sagrado" e o britânico "Zona de Interesse".Mesmo sem o elenco de "Ainda Estou Aqui", a cerimônia do César na sala Olympia de Paris deve ter momentos emocionantes. A premiação completa 50 anos e será presidida por Catherine Deneuve. Haverá uma homenagem a Alain Delon, que morreu em agosto passado. Além isso, a atriz americana Julia Roberts e o diretor Costa-Gavras, de 92 anos, receberão prêmios honorários. A 50ª edição do César é marcada pela vitalidade do cinema francês, com grandes sucessos de bilheteria. "O Conde de Monte Cristo", adaptado do romance de Alexandre Dumas, recebeu 14 indicações, inclusive de melhor filme. Esse longa, estrelado pelo ator Pierre Niney, vendeu 9,4 milhões de ingressos na França. "L'Amour Ouf", uma história de amor quase impossível ainda sem título em português, foi visto por 4,9 milhões de espectadores e disputa 13 estatuetas. "Emilia Pérez", rival de "Ainda Estou Aqui" no Oscar, vem logo atrás com 12 indicações. A crítica que se faz à Academia de Artes e Técnicas do Cinema foi que o filme de maior sucesso de público em 2024, a comédia "Algo a mais" (Un p'tit truc en plus, em francês), do diretor Artus, que trabalha pelo reconhecimento de atores com deficiência, teve quase 11 milhões de ingressos vendidos e só concorre ao César de melhor primeiro filme, o que está sendo considerado uma injustiça pelo público.Sistema de votaçãoEsta edição de 50 anos do César teve 4.951 votantes, distribuídos em dez colégios eleitorais formados por 80% de atores, realizadores, roteiristas, técnicos, produtores, diretores de casting e representantes de indústrias técnicas, e 20% de distribuidores, vendedores internacionais, donos de cinemas, técnicos industriais, assessores de imprensa, agentes artísticos e membros associados da Academia francesa. A votação acontece em dois turnos, sempre por voto secreto. A primeira fase determina os filmes em competição e um segundo turno designa os vencedores. Mudanças no regulamentoA Academia francesa decidiu implementar em 2025 uma política de tolerância zero para violência sexual e física, depois de sucessivos escândalos envolvendo atores, diretores e outros profissionais da indústria em casos de estupro, assédio, discriminações sexistas e chantagem. Em janeiro, a Academia publicou um comunicado para informar as alterações que fez em seu regulamento, para restringir os direitos de voto de qualquer membro que enfrente acusações judiciais desse tipo. Os membros condenados foram e permanecerão excluídos da Academia até o cumprimento integral da pena, no caso de condenação transitada em julgado. Em 2023, a Academia já tinha tomado algumas providências sobre esse tema.No ano passado, o discurso ovacionado da atriz Judith Godrèche, que acusou dois cineastas, Benoît Jacquot e Jacques Doillon, de estupro quando ela era menor de idade, marcaram uma reviravolta no cinema francês. No início do mês, a Justiça francesa condenou a quatro anos de prisão o diretor Christophe Ruggia, que assediou a atriz Adèle Haenel, quando ela tinha 12 anos, um caso emblemático do movimento "MeToo" no país. Lentamente, os abusos estão sendo punidos na Justiça.Catherine Deneuve critica Academia francesaA atriz Catherine Deneuve disse em uma entrevista há dez dias que só aceitou o convite para ser presidente da cerimônia por ser o aniversário de 50 anos do César. Ela boicota o prêmio francês há pelo menos 15 anos. Com mais de 130 filmes na carreira, a atriz, de 81 anos, falou que o sistema de votação do César "não é sério". Segundo ela, muita gente não vota no primeiro turno, que seleciona os filmes indicados, e vota só na segunda etapa de designação dos vencedores, o que na opinião de Deneuve distorce os resultados. Por isso, muitos atores e atrizes perderam o interesse pelo César, diz ela. Deneuve conquistou dois César de melhor atriz (1981 e 1993). Ela presidiu a cerimônia pela primeira vez em 1983, além de ser a segunda atriz francesa com o maior número de indicações, 14 no total, só perdendo para Isabelle Ruppert, que foi indicada 16 vezes ao longo da carreira. O recordista de nomeações ao César é o diretor Jacques Audiard, de "Emília Pérez": 26 no total. Ele já recebeu a estatueta dez vezes e pode se tornar o vencedor mais condecorado da história do prêmio nesta noite.A cerimônia começa às 20h45 no horário de Paris, 16h45 em Brasília.
O Brasil enfrenta uma onda de calor sem precedentes, com sensação térmica superior a 60°C em algumas cidades. Esse fenômeno não se restringe à América do Sul: a cada verão, a Europa também registra temperaturas cada vez mais elevadas. A França, que poderá lidar com um calor de 50°C daqui a duas décadas, vem implementando alguns projetos para tentar aliviar o fenômeno. A França acompanha com preocupação a onda de calor no Brasil. Jornais, rádios e TVs francesas repercutem diariamente as temperaturas extremas que várias regiões brasileiras têm enfrentado.A rede BFMTV explica em uma reportagem veiculada nesta semana que as temperaturas recordes que atingem várias regiões brasileiras são anormais “até mesmo nos trópicos”. O jornal francês Le Parisien fez entrevistas com especialistas em calor do Brasil e destaca que, apenas em janeiro, na cidade do Rio, mais de 3 mil pessoas foram levadas a emergências de hospitais da capital por causa das temperaturas extremas.As mídias francesas também têm atendido ao pedido de cientistas e especialistas em clima para mostrar imagens que destaquem o lado grave desses fenômenos, evitando mostrar apenas imagens de praias lotadas. Portanto, a cobertura da imprensa da França também trouxe imagens impressionantes do sofrimento dos trabalhadores brasileiros no sol, com termômetros marcando mais de 40°C e até mesmo os serviços de emergência prestando atendimento às pessoas.Cada vez mais ondas de calor na EuropaAs ondas de calor vêm começando mais precocemente na Europa, se repetem várias vezes a partir da primavera, com durações cada vez maiores e mais intensas. A França, particularmente, viveu uma onda de calor traumática em 2003, que durou 15 dias, e foi considerada a pior em 150 anos, com os termômetros chegando aos 44°C. Os efeitos desse calor extremo resultaram, nessa época, na morte de 15 mil pessoas, principalmente pessoas idosas.Mas em junho de 2019, a França bateu outro recorde de temperatura: 46°C. Outros países europeus registram um calor ainda maior: Portugal registrou 47°C em julho de 2022, quando o país viveu que foi o ano mais quente já registrado lá. A Espanha teve 47,6°C em agosto de 2021. Nesse mesmo ano, a Itália registrou o recorde de temperatura na Europa: 48,8°C.Além disso, no continente europeu, regiões e países que raramente viveram ondas de calor, como os países escandinavos, agora enfrentam esse fenômeno frequentemente. Em 2021, os termômetros chegaram a marcar 35°C na região do Artico, no extremo norte, onde a temperatura média no verão é de cerca de 16°C.Como a França gerencia as ondas de calorNos últimos anos, as principais cidades francesas vêm investindo em várias alternativas para tentar aliviar os chamados “îlots de chaleur” (ilhas de calor), um termo técnico para designar os pontos mais que mais esquentam em uma cidade. A primeira das 19 soluções sugeridas pela Agência de Transição Ecológica da França é a construção de mais espaços verdes, novos parques e muitas árvores – inclusive nos próprios prédios. Várias cidades francesas vêm implementando projetos de vegetalização nos terraços e até nas fachadas das residências.Outras alternativas empreendidas têm sido instalar mais fontes de água nas cidades, investir em espaços cobertos que criem sombra nas ruas e onde os pedestres possam se proteger da exposição solar direta. Vários distritos de Paris também investem na diminuição dos espaços de circulação de carros e em áreas exclusivas para pedestres arborizadas – medidas nem sempre populares entre motoristas.Outras solução na moda nesses últimos anos na França e que reúne também opiniões contra é pintar os tetos de construções, prédios comerciais e públicas e residências de branco: os chamados “cool roof” (“tetos gelados”). Um projeto-piloto em Paris também testa a pintura do asfalto de algumas ruas de branco: uma medida que já é aplicada em algumas cidades americanas e australianas e que trazem bons resultados.Rio Sena e a rede urbana de frioO rio Sena é o responsável pelo maior sistema de resfriamento público da França. Cerca de 90 quilômetros de tubulações passam por debaixo de grandes monumentos e prédios públicos de Paris - como o museu do Louvre, a prefeitura da capita, a Assembleia de Deputados, a Orquestra Filarmônica - levando a água resfriada do rio parisiense.Esse projeto revolucionário e pouco conhecido até mesmo pela população local é uma solução que as autoridades pretendem estender para toda Paris até 2040. O objetivo, no futuro, é beneficiar também escolas, hospitais, estações de metrô e se tornar a maior rede pública de resfriamento urbano do mundo.
A França aprovou uma lei que proíbe a venda e a distribuição do cigarro eletrônico descartável no país. Há anos a Liga contra o Câncer e outras entidades médicas denunciavam os riscos para a saúde do consumo de vapes descartáveis de sabores variados, uma febre entre os adolescentes franceses. Mas a lei demorou para ser votada, devido ao lobby exercido pela indústria do tabaco na Europa. Na França, os adolescentes chamam o vape ou pod de "puff". Apesar das advertências sobre a alta e rápida dependência que esses produtos à base de sais de nicotina criam no fumante, o Senado francês só conseguiu aprovar sua proibição definitiva nesta quinta-feira (13).O projeto de lei francês passou por uma avaliação da Comissão Europeia, que aprovou globalmente os termos antes da votação final no Senado, mas recomendou excluir da lei francesa os cigarros eletrônicos recarregáveis, que continuam a ser vendidos nas tabacarias. Com essa legislação, a França se torna o segundo país no bloco europeu a proibir a venda do vape descartável, depois da Bélgica. O Reino Unido pretende proibir o comércio do produto até junho desse ano. O texto francês tem semelhanças com a regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), revista em abril de 2024 para incluir estudos recentes.A fórmula dos vapes descartáveis, com aroma de menta, morango ou chocolate, à base de sais de nicotina, um derivado muito mais concentrado que a nicotina tradicional, potencializa a absorção dessa substância pelo organismo. Por isso, causa uma dependência precoce e intensa, segundo os médicos. Em 2023, uma pesquisa feita pela Aliança Contra o Tabaco mostrou que 15% dos adolescentes franceses de 13 a 16 anos já haviam usado vapes descartáveis e, destes consumidores, 47% disseram que começaram, em seguida, a fumar cigarros convencionais ou passaram para os cigarros eletrônicos recarregáveis. Círculo viciosoReportagens realizadas nesta sexta-feira (14) em colégios da região parisiense, para repercutir a proibição da venda dos vapes, mostrou fumantes, principalmente meninas de 12, 13, 14 anos de idade, nervosas com a perspectiva de não encontrar o produto à venda num futuro próximo. Algumas contaram que, depois de ficarem dependentes do vape, passaram a fumar cigarros e maconha.O vape descartável irá sair das prateleiras das tabacarias francesas, mas a venda clandestina não deve desaparecer tão cedo. Os adolescentes que consomem o produto dizem que não compram o "puff" no comércio de rua por custar mais caro. Os preços por unidade variam de R$ 48,00 a R$ 120,00, dependendo do modelo. Os estudantes preferem se abastecer online ou com fornecedores pelas redes sociais por um preço mais em conta. O problema é que nessa relação, os adolescentes já são apresentados a outros produtos, como cigarros contrabandeados e maconha. O Comitê Nacional contra o Tabagismo (CNTC), uma associação independente, acredita que os fabricantes vão driblar a lei recém-aprovada e adaptar os vapes com aroma para aparelhos com um número limitado de recarga das baterias, para continuar atraindo os jovens ao consumo, uma vez que os aparelhos recarregáveis continuam autorizados. Essa indústria vive da dependência.Em média, 200 pessoas morrem por dia na França por doenças decorrentes do tabagismo.Problema de saúde pública e ambientalDurante os debates na Assembleia e no Senado, os parlamentares discutiram estudos que mostram que a alta concentração de sais de nicotina, e de outras substâncias tóxicas encontradas nas fórmulas líquidas dos vapes, como o mercúrio, causam aumento da pressão arterial e alterações no sangue, com risco de infarto e de derrame cerebral, infecções e lesões pulmonares, e câncer a longo prazo. É um produto nocivo, viciante, que depois de um certo tempo de consumo requer ajuda médica para parar.Além da questão de saúde pública, existe o aspecto ambiental, com as milhares de baterias à base de lítio que equipam esses aparelhos de uso único e acabam descartadas nas ruas e na natureza, causando poluição ambiental. Parlamentares ecologistas estiveram na iniciativa do projeto de lei. A ministra da Saúde e do Trabalho, Catherine Vautrin, disse que a aprovação unânime da lei pelos deputados e senadores demonstra "uma consciência coletiva" da necessidade de proteger os jovens. Mas falta um trabalho de polícia na cadeia de distribuição.Novo canabinoide sintético preocupa autoridadesA Agência Francesa de Medicamentos (ANSM) publicou um alerta na semana passada sobre os "sérios riscos para a saúde" provocados por um canabinoide sintético conhecido como "Buddha Blue" ou "Explode Crânio", como vem sendo chamado entre os franceses (PTC - Pète ton Crâne). Essa substância é vendida na forma líquida para inalação no cigarro eletrônico, que acelera seus efeitos. O usuário encontra o produto à venda nas redes sociais ou por meio de traficantes que rondam as saídas das escolas. Por enquanto, o consumo de "Buddha Blue" foi identificado nos arredores de escolas na região parisiense e no leste da França. O custo para um usuário frequente é de cerca de € 10,00, aproximadamente R$ 60,00, quatro vezes menos que alguns gramas de maconha. Os efeitos colaterais do "Buddha Blue" descritos pelos médicos são de arrepiar: alucinações, ataques de pânico, náusea, vômito, taquicardia, dor abdominal e no peito, problemas renais, amnésia, perda de consciência, convulsões, síndrome de abstinência. O monitoramento desse canabinoide sintético, iniciado em 2019, aponta 215 casos de intoxicação e uma morte na França. É mais um caso de fabricação e venda clandestina de um produto que imita uma droga e desperta a curiosidade dos jovens.
A França aprovou na quinta-feira (6) um projeto de lei que pode restringir o chamado “direito de solo” na ilha de Mayotte, território francês no sudeste da África, para tentar conter a imigração no local. Nesta sexta-feira (7), o primeiro-ministro François Bayrou e o ministro da Justiça Gérald Darmanin mencionaram a possibilidade de estender o debate sobre a questão para o resto do país. “O debate público deve ser aberto sobre o direito de solo na França”, declarou Darmanin diante da Assembleia Nacional de Deputados. O ministro se disse até mesmo favorável a uma modificação das leis sobre essa questão na Constituição francesa.Já François Bayrou defendeu, em entrevista à rádio francesa RMC, a ideia de “um amplo debate”, que abordaria também outro assunto sensível, sobre “o que é ser francês”. “O que isso traz como direitos? O que isso impõe como deveres? O que isso implica em vantagens? (…) No que acreditamos quando somos franceses?”, questionou.As declarações ocorrem um dia depois que a Assembleia Nacional de deputados adotou, em primeira leitura, um projeto de lei, de autoria do partido de direita Os Republicanos, que pode restringir o “direito de solo” em Mayotte, onde metade da população é estrangeira.Neste território francês, as regras para a obtenção da nacionalidade são diferentes do resto do país. Atualmente, filhos de estrangeiros que nascem na ilha recebem a cidadania se a mãe ou o pai estiverem vivendo no local por ao menos três meses.Caso o projeto seja definitivamente adotado, as regras dificultarão o processo, já que tanto pai e mãe precisarão morar ao menos três anos em Mayotte para que seus filhos obtenham a nacionalidade francesa ao nascer.Na França metropolitana as regras são diferentes: a nacionalidade é atribuída automaticamente à criança que nascer em solo francês e tiver ou a mãe francesa ou pai francês. Um bebê de mãe e pai estrangeiros que vivem na França só obtém a nacionalidade se a família provar que reside na França durante ao menos cinco anos e a partir dos 11 anos da criança. Muitos menores filhos de estrangeiros optam também por esperar até os 18 anos para receber a cidadania, desde que estejam vivendo na França.Discurso anti-imigraçãoA aprovação do projeto de lei ocorre na esteira do aumento do discurso anti-imigração na França. Bayrou não poupa críticas às regras de naturalização no país. Segundo ele, “milhares de pessoas chegam com a ideia de que se colocarem crianças no mundo, elas serão francesas”.Há duas semanas, o primeiro-ministro chocou parte da classe política e da opinião pública ao utilizar o termo “submersão imigratória”, durante uma entrevista a um canal de TV francês. Segundo ele, "contribuições estrangeiras são positivas para um povo, desde que não excedam uma proporção". "A partir do momento que você tem o sentimento de submersão, de não reconhecer mais o seu país, os modos de vida ou a cultura, você tem a rejeição", reiterou.A expressão “submersão imigratória” foi criada nos anos 1980 por Jean-Marie Le Pen, ícone da extrema direita francesa, falecido em janeiro, fundador do partido ultranacionalista Frente Nacional (atualmente Reunião Nacional, dirigido pela filha, Marine Le Pen).Nas últimas décadas, o termo expressão foi utilizado por políticos, militantes e simpatizantes da extrema direita na França, com o objetivo de criar uma sensação alarmista sobre a imigração.A atitude de Bayrou foi alvo de uma enxurrada de críticas pela esquerda francesa. Para a deputada ecologista Cyrielle Chatelain, a utilização da expressão "submersão imigratória" é "vergonhosa", principalmente da parte de um chefe de governo.No canal de TV LCI, Manuel Bompard, coordenador do partido da esquerda radical França Insubmissa, classificou de "extremamente chocante" as afirmações do premiê francês que "não correspondem absolutamente à realidade". "Jamais teria feito essas afirmações e elas me incomodam", declarou a presidente da Assembleia de Deputados da França, Yaël Braun-Pivet, do partido governista Renascimento, em entrevista ao canal BFMTV e à rádio RMC. "Estamos falando de homens e mulheres, de nosso país, a França, que por meio de sua história, sua geografia, sua cultura, sempre acolheu e se construiu por meio desta tradição", reiterou. França está "submersa" por imigrantes?O Ministério do Interior da França divulgou nesta semana o relatório anual sobre a imigração no país. Números do próprio governo mostram que a quantidade de entradas de estrangeiros no país é estável há 15 anos.Em 2024, 337 mil carteiras de residência temporária foram emitidas pela França a estrangeiros, com um leve aumento de 1,8% em relação ao ano anterior. Um terço desses documentos (109 mil) foram destinados a estudantes. Quase 91 mil estrangeiros receberam as chamadas “cartes de séjour”, os vistos que autorizam a estadia, por motivos familiares e 55 mil por razões econômicas e humanitárias.Pouco mais de 31 mil pessoas que viviam em situação ilegal na França foram regularizadas em 2024: número que registrou queda de 10% em relação ao ano anterior. Além disso, o governo francês recebeu pedidos de asilo de quase 156 mil pessoas em 2024, em queda de 5,5% em comparação a 2023.Segundo dados do Instituto Francês de Estatísticas e Estudos Econômicos (Insee), 10,7% da população francesa é imigrante. Entre eles, estão incluídos 3,5% de pessoas originárias de outros países da Europa.Em comparação com as nações vizinhas, a França é um dos países que menos recebe estrangeiros. Na Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Irlanda e Suécia, cerca de 20% da população é imigrante.
O assassinato de um estudante de 14 anos em Paris, esfaqueado por dois menores de 16 e 17 anos por ter se negado a entregar o telefone celular num assalto, está gerando um grande debate entre os franceses sobre a violência entre jovens. Os juízes de menores e os pais dos infratores são criticados por uma pretensa condescendência na aplicação de penas e na educação dos adolescentes, mas a realidade é bem mais complexa. O adolescente morto, chamado Elias, de 14 anos, aluno do 9° ano de um colégio público de ensino de elite em Paris, o Lycée Montaigne, foi abordado por dois jovens menores, mais velhos do que ele, na sexta-feira passada (24), quando saía de um treino de futebol, às 20h, num estádio mantido pela prefeitura num bairro tranquilo de Paris, o 14° distrito da capital, perto de Montparnasse.Ele voltava a pé para casa, acompanhado de um amigo, e resistiu ao assalto – não quis entregar o celular. O garoto, filho de um médico parisiense, foi esfaqueado no ombro. Ele chegou a ser socorrido, mas morreu no dia seguinte no hospital.Esse crime sórdido provoca comoção entre os franceses por vários motivos. É raro acontecer roubo com arma e uso de violência física em Paris, ainda mais contra um estudante dessa idade. Os furtos são frequentes, mas às vezes a pessoa nem se dá conta por não envolver agressão. As idades dos envolvidos e a violência gratuita é algo ainda inaceitável na sociedade francesa. Os dois agressores foram rapidamente identificados e presos, pois eram conhecidos da polícia e da Justiça de Menores desde 2021 por outros roubos e porte de armas. O serviço social da prefeitura e educadores do bairro onde o crime aconteceu também conheciam as ameaças que eles representavam aos frequentadores do estádio municipal.Neste fim de semana, todos os estádios de futebol onde acontecem jogos da Liga 1 e Liga 2 francesas farão um minuto de silêncio antes do início das partidas em homenagem a Elias. A decisão foi anunciada pela Federação Francesa de Futebol Profissional.Autor do crime estava solto, apesar de ter recebido condenaçãoO rapaz de 16 anos, que confessou ter dado o golpe letal no estudante, tinha sido condenado em 2023 a dois anos de medidas educativas e controle judiciário. Por decisão do juiz de menores que acompanhava o caso, ele estava proibido de falar com o amigo de 17 anos, o que soa, para os franceses, como uma medida insuficiente e "idiota", porque os dois moravam no mesmo condomínio. A dupla também estava proibida de sair à noite, de 22h às 6h da manhã, o que não impede ninguém de matar no restante do dia.A situação social dos dois amigos não é considerada particularmente desfavorável pelas autoridades. Os pais dos dois indiciados não são ausentes na educação dos filhos. A mãe do menor de 16 anos é chefe de família. Ela é descrita pelos juízes como uma pessoa sobrecarregada, mas não descomprometida com a educação.Violência aumenta entre jovens propensos à agressividadeA conclusão a que se chega diante desse crime horroroso é que entre a parcela de jovens propensos à violência na França, até os medianamente inseridos estão mais violentos. Juízes de menores observam que a violência gratuita é típica em adolescentes, geralmente por motivos fúteis. Eles desconhecem a consequência de seus atos, segundo magistrados experientes.Em dados estatísticos, a violência de menores recuou na França e os números são considerados estáveis desde 2016. De acordo com magistrados das Varas da Infância e Adolescência, do total de crimes cometidos no país, 7% envolvem menores. Em Paris, 30% dos roubos são executados por adolescentes, também envolvidos em 40% dos furtos em apartamentos.O que está em alta, segundo os especialistas, é a gravidade dos crimes que os adolescentes cometem: 20% do total de ocorrências são casos de homicídio, estupro e porte de armas proibidas, como facas e pistolas, mais usadas pelo narcotráfico.Polícia não sabe como conter uso de armas brancas pelos jovens Por outro lado, policiais e professores dizem que não sabem mais o que fazer diante do número crescente de adolescentes que andam armados com facas, até dentro de escolas.Tutoriais com instruções de como manejar bem uma faca de cozinha ou um punhal têm milhares de visualizações no Telegram e em vídeos no TikTok, com protagonistas adolescentes. As campanhas de prevenção contra esse tipo de conteúdo são inexistentes.Desde segunda-feira, os dois indivíduos envolvidos no assassinato de Elias cumprem pena de prisão preventiva. A conclusão das investigações deve ser rápida pela quantidade de testemunhas que viram o crime, o histórico judicial dos dois suspeitos, e a confissão do menor de 16 anos.Os dois foram indiciados pelo crime de extorsão com resultado em morte e podem ser condenados à prisão perpétua, o que seriam 30 anos de reclusão, mesmo sendo menores de idade. Se o júri popular fizer uma concessão pela minoridade, um atenuante que existe na legislação francesa, a pena cai para até 20 anos de prisão.Políticos querem nova lei, mas juízes contestamDevido à repercussão do crime e de milhares de estudantes e pais temerem pela vida dos filhos por causa de um aparelho de celular, os ministros da Justiça e do Interior, de linha-dura, já querem fazer propostas de endurecimento da legislação em vigor. O ministro do Interior, Bruno Retailleau, embora seja do partido da direita democrática (LR), é comparado a um populista de extrema direita.Nesta semana, Retailleau disse que vai apresentar um projeto de lei para introduzir penas curtas de dois anos de prisão para adolescentes, desde a primeira condenação judicial, como faz a Holanda, e penas de até três anos de reclusão e multas para os pais de infratores reincidentes.Essas propostas são consideradas demagógicas pelos juízes franceses. Eles argumentam que a legislação atual já permite a um magistrado aplicar uma pena de reclusão imediata na faixa etária de 16 a 18 anos.Os juízes de menores têm ordenado com frequência as chamadas “medidas educativas”, em que um menor deve ser internado em um centro fechado e passar até dois anos no estabelecimento educativo, recebendo atendimento psicológico, às vezes psiquiátrico, e disciplinar. A Justiça garante não haver condescendência por parte dos magistrados.Os infratores condenados ficam soltos por falta de vagas nos centros educativos de reinserção. Mas sobre isso, os políticos se omitem.
A França se mantém no topo do ranking dos países mais visitados do mundo. Segundo estatísticas divulgadas nesta semana pelo Ministério do Turismo, o país recebeu mais de 100 milhões de visitantes estrangeiros em 2024. Daniella Franco, da RFIDois milhões de turistas a mais visitaram a França no ano passado, em comparação com 2023. O país também comemora um aumento de 12% de lucros no setor, chegando ao total de € 71 bilhões de euros (mais de R$ 443 bilhões).Segundo o relatório do Ministério do Turismo, os principais responsáveis por esse salto foram os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Paris. No entanto, dois outros eventos também serviram para turbinar o setor: as comemorações do aniversário de 80 anos do desembarque das tropas aliadas, em junho, e a reabertura da catedral de Notre Dame, em dezembro.O turismo francês também foi beneficiado pela retomada do setor em todo o mundo pós-pandemia. Em 2024, 1,4 bilhão de turistas fizeram uma viagem internacional.Belgas e norte-americanosÉ do norte da Europa e dos Estados Unidos de onde veio a maior quantidade de turistas estrangeiros que a França acolheu em 2024. Para os belgas, a França é o destino número 1. Já os visitantes norte-americanos são considerados pelo Ministério do Turismo como “incontornáveis”, impulsionados pela dinâmica econômica e poder aquisitivo.Os países asiáticos registraram em 2024 uma aceleração em termos de estadias, especialmente a China (+40%) e o Japão (+20%). Mas esses públicos não retomaram o mesmo nível de antes da pandemia. De fora da Europa, o relatório também destaca um maior interesse de visitantes indianos, mexicanos, canadenses e sul-coreanos.Turistas brasileirosSegundo a Agência de Desenvolvimento Turístico da França (Atout France), turistas brasileiros e brasileiras foram a segunda nacionalidade não-europeia a mais desembarcar em Paris durante os Jogos Olímpicos e Paralímpicos, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. O Brasil é considerado pela França como o terceiro mercado de voos de longa distância fora da Europa.O país está na mira do setor do turismo francês já que 2025 é o Ano do Brasil na França. O evento, cuja parceria foi firmada durante a vinda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Paris no ano passado, vai coincidir com os 200 anos de relações diplomáticas entre o Brasil e a França.Assim, o setor do turismo francês aposta em um crescimento de 7% na vinda de turistas brasileiros à França. O aumento deve começar a se confirmar já no primeiro trimestre de 2025, dependendo da taxa de câmbio euro x real. O Brasil representa para a França mais 700 milhões de euros de lucros no setor do Turismo.A Atout France também tem um perfil do turista brasileiro que vem à França: indivíduos de 45 a 65 anos, admiradores da cultura francesa, que viajam em casal ou com a família e com tendência de repetir a experiência. Os visitantes que chegam do Brasil têm como principais interesses “experiências urbanas, novas tendências, eno-gastronomia e compras” e também se interessam por outras cidades além de Paris: Bordeaux, Nice, Saint-Tropez, além das regiões da Loire (centro) e da Normandia (norte).Turismo de massaAo mesmo tempo em que a França bate recordes de visitantes, o debate sobre a questão do turismo de massa se intensifica no país. Embora o crescimento do setor seja positivo para a economia do país, ele tem consequências negativas para o meio ambiente e o bem-estar da população.Em 2023, o governo francês lançou um primeiro plano pra tentar conter o fenômeno, depois de ter percebido que 80% da atividade turística na França se concentra sobre 20% do território. Entre as principais medidas, estão a determinação de limites de visitantes e taxas para locais que antes entram gratuitos.Nessa semana, veio à tona um pedido de socorro da direção do Louvre ao Ministério da Cultura da França. Esse que é o maior museu do mundo está enfrentando dificuldades estruturais e pedindo ajuda para a renovação dos espaços, a proteção das obras e a recepção de cerca de nove milhões de visitantes por ano.A ministra francesa da Cultura, Rachida Dati, diz que pretende rever a política de ingressos do Louvre. O Ministério da Cultura seria a favor de aumentar os preços das entradas para os visitantes estrangeiros, uma iniciativa que já causa polêmica aqui.O SOS lançado pelo museu sensibilizou até o presidente francês, Emmanuel Macron. Segundo informações divulgadas nesta sexta-feira (24) canal BFMTV, o chefe de Estado visitará o museu na próxima semana que vem, onde fará um discurso.
A lei que legalizou o aborto na França completa, nesta sexta-feira (17), 50 anos. Em 2024, esse direito foi reforçado com uma menção incluída na Constituição, mas, na prática, essa conquista das francesas, que é uma exceção mundial, continua ameaçada. O procedimento é mal remunerado pelo sistema público de saúde e perdeu atratividade para os médicos. A data tem sido marcada por denúncias e uma intensa cobertura da mídia para ouvir mulheres que enfrentaram dificuldades recentes para abortar. Por dever de memória e transmissão, feministas e profissionais da saúde que viveram o antes e o depois da promulgação da lei que “descriminalizou a interrupção voluntária da gravidez”, em 17 de janeiro de 1975, recordam os riscos que as mulheres corriam na época para abortar, os métodos empregados pelas "fazedoras de anjos" e as inúmeras mortes de jovens e mães por hemorragia e septicemia.Em meados dos anos 1970, a então ministra da Saúde, Simone Veil, enfrentou um plenário dominado por homens na Assembleia Nacional e aprovou essa imensa conquista, com o apoio do presidente francês Valéry Giscard d'Estaing.Cinquenta anos depois, a luta feminista continua, porque o artigo 34 da Constituição francesa diz que o aborto é "uma liberdade explicitamente garantida às mulheres", mas a aplicação desse direito é remetida a leis complementares. Já no ano passado, a iniciativa do presidente Emmanuel Macron foi acolhida como um ato simbólico, que se confirma insuficiente na prática.Atualmente, o foco de combate das feministas francesas é questionar o princípio da “liberdade de consciência” concedida aos médicos, prevista no Código de Saúde Pública. Essa cláusula ganhou força nos últimos anos, com o ressurgimento do movimento patriarcal ultraconservador na França e em escala internacional. Outra constatação é que o procedimento médico em si não é valorizado pelo sistema público de saúde e perdeu atratividade para os médicos. Desde 2020, um relatório parlamentar já apontava que o aborto era mal remunerado e tinha se tornado uma prática de “médicos militantes”. Esse fenômeno é no mínimo contraditório em relação às garantias que o Estado francês diz oferecer às mulheres, uma vez que o aborto é gratuito no país e 100% coberto pelo sistema público de saúde.Faz 23 anos que o aborto induzido pela pílula abortiva foi autorizado nos consultórios. Esse avanço para a saúde feminina, recomendado até a sétima semana de gravidez, foi festejado na época. Mas de acordo com os números oficiais, só 14% das parteiras, 19% dos ginecologistas e 1,5% dos clínicos gerais acompanharam mulheres nesse processo em 2023. Naquele mesmo ano, para mitigar a carência, as obstetrizes, parteiras com formação universitária, foram autorizadas a praticar o aborto instrumental em estabelecimentos de saúde. Médicos voluntários desaparecemNesta sexta-feira, a mídia transborda de relatos de francesas que enfrentaram dificuldades para encontrar um profissional no prazo que a lei estabelece para o aborto, seja por aspiração, até 14 semanas de gestação, ou com a pílula abortiva. A situação nas zonas rurais é mais complicada do que nas grandes cidades.Além da falta de médicos voluntários, o Movimento Francês de Planejamento Familiar, criado na década de 1960 e um orgulho das feministas, denuncia o fechamento de 130 unidades hospitalares dedicadas ao aborto nos últimos 15 anos.Esses centros desapareceram devido aos sucessivos cortes de orçamento na Saúde. O número de abortos se mantém relativamente estável desde a década de 1990, oscilando entre 220.000 e 230.000 casos por ano. De 2021 para cá, houve um aumento anual médio de 10 mil procedimentos. Mas como essa alta é recente e ainda acontece num contexto desfavorável à natalidade, é muito cedo para estabelecer as razões.Por outro lado, 50 anos depois da legalização do aborto persiste um "tabu gigantesco" na sociedade francesa sobre o assunto, na avaliação do Planejamento Familiar. O acesso à informação sobre o direito de abortar é a nova batalha, devido às campanhas de desinformação promovidas por movimentos ultraconservadores na internet.Pressão psicológica contra a mulher é crimeEm 2017, a França ampliou o conceito do crime de obstrução ao aborto, que agora pune não apenas ações físicas, mas também pressão psicológica ou campanhas de desinformação. As penas podem ser de até dois anos de prisão e uma multa de € 30.000 (cerca de R$ 185.000, segundo o câmbio atual).Mas os opositores ao aborto, ligados ao movimento católico ultraconservador e à extrema direita, têm multiplicado as táticas para perturbar o funcionamento das unidades de atendimento e constranger as mulheres a usufruir de um direito constitucional.Para perturbar o bom funcionamento do sistema e desencorajar os profissionais de saúde a praticar o aborto, os ativistas antiaborto fazem agendamentos massivos de consultas usando perfis falsos de pacientes nos sites de clínicas e hospitais; promovem depredações desses locais durante a madrugada; aparecem nos pontos de atendimento com cartazes que insultam as mulheres; sem falar no show de horrores nas redes sociais, com a postagem de imagens ensanguentadas de pura desinformação sobre as técnicas abortivas e o suposto sofrimento do embrião, que cientificamente não existe no primeiro estágio da gravidez.A avalanche de fake news se profissionalizou com as redes sociais e hoje conta com financiamento interno e proveniente do exterior. O país que se orgulha de suas políticas na área de direitos humanos e das mulheres tem novos desafios pela frente.
As campanhas de influência lançadas pelo bilionário americano Elon Musk no X, que promovem suas visões ultraconservadoras e políticas de extrema direita na Europa, provocam reações na imprensa e mobilizam os defensores da democracia na França. No começo do mês, a série de tuítes difamatórios que Musk dirigiu ao primeiro-ministro britânico Keir Starmer, acusando o trabalhista de ser "cúmplice de estupros em massa" num contexto falacioso, já tinha causado indignação entre internautas, políticos e jornalistas.Esta semana, as críticas ao bilionário aumentaram com a live de duas horas que ele fez nesta quinta-feira (9) no X com a líder do partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD), Alice Weidel, candidata ao governo alemão nas eleições legislativas de fevereiro.Entre outras declarações falsas, Weidel disse na conversa com Musk que Adolf Hitler não era de direita, e sim de esquerda, porque a ideologia do nazismo era chamada de "nacional-socialismo" – o que já foi desmentido por historiadores.Diante dessa ingerência crescente de Musk no debate público europeu, usando o X para propagar fake news, uma deputada francesa apresentou esta semana uma denúncia contra o bilionário e sua rede social no organismo francês de regulamentação das plataformas digitais.A parlamentar Aurore Lalucq, que é da bancada socialista e democrata no Parlamento Europeu, pediu à Arcom – Autoridade Reguladora da Comunicação Audiovisual e das Plataformas Digitais na França – para investigar uma suposta manipulação nos algoritmos do X.Usuária do Twitter há vários anos e depois do X, ela diz que passou a ver, recentemente, muitos tuítes de Elon Musk em sua timeline, sem que ela tenha pedido para seguir o bilionário, o que sugere uma mudança no direcionamento das mensagens e nas regras de funcionamento declaradas aos reguladores. A França tem legislação própria e autonomia judicial para investigar esse tipo de denúncia.A eurodeputada ainda pediu à Comissão Europeia, que dispõe da lei de Mercados Digitais e da lei de Serviços Digitais, para agir e, se necessário, bloquear o X por “abusos recorrentes”. Para um número significativo de franceses ouvidos sobre o comportamento de Musk nos últimos dias, está na hora de salvar as democracias europeias do projeto ideológico ultradireitista de interesse tecnológico e industrial das plataformas americanas.Regulamentação europeia O modelo europeu de regulamentação das redes sociais inspirou legislações semelhantes em vários países, entre eles o Brasil. O bloco já aplicou multas bilionárias contra as empresas de tecnologia americanas e asiáticas. Mas com o retorno de Donald Trump ao governo dos Estados Unidos, a Comissão Europeia está hesitante, com medo de represálias, demonstrando um posicionamento de fraqueza criticado na França.Na quinta-feira (9), a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, publicou um comunicado favorável aos americanos, sem mencionar solidariedade à Dinamarca pelos ataques de Trump à Groenlândia. Von der Leyen e o presidente do Conselho de Líderes Europeus, António Costa, disseram apenas que têm interesse em reforçar as relações com Washington. Essa atitude foi considerada "omissa" e "vergonhosa" por várias personalidades.Um advogado francês especialista na área digital, Etienne Papin, listou cada uma das ofensas de Musk ao primeiro-ministro britânico e ao chanceler alemão, à luz das legislações nacionais dos dois países e da Lei de Serviços Digitais do bloco. Mesmo se o Reino Unido não faz mais parte da União Europeia, o advogado mostrou que as declarações de Musk podem ser enquadradas como crimes e delitos sujeitos a sanções.O advogado descreve a situação nos seguintes termos: é “uma guerra de civilização entre magnatas da tecnologia dos EUA, de cultura duvidosa, contra uma Europa que se construiu sobre as bases do humanismo, do iluminismo e da busca da verdade”. Não há razão, na opinião desse especialista, de os europeus se envergonharem desses valores.Prêmio Nobel de Física pede resposta rápidaOutra personalidade, o francês Alain Aspect, prêmio Nobel de Física de 2022, também foi à mídia criticar o "imobilismo" da Comissão Europeia, que, segundo ele, "não pode se acanhar diante dessa ofensiva dos americanos". Diante da desinformação e das teorias da conspiração, o Nobel de Física insistiu que “só a ciência permite às pessoas tomar consciência dos problemas” e resolvê-los.Destruir a reputação da imprensa tem sido uma estratégia recorrente da extrema direita. Desde que Mark Zuckerberg, dono da Meta, decidiu seguir os passos de Musk, nesta semana, e acabar com o sistema de checagem de fatos no Facebook e no Instagram, por enquanto nos Estados Unidos, os jornais franceses têm publicado editoriais para defender que a União Europeia não se curve à “ofensiva ideológica” proveniente dos Estados Unidos.Le Monde aponta "erro" e pede firmeza à UEO Le Monde escreve em seu editorial, nesta sexta-feira (10), que a Comissão Europeia está errada em vacilar nessa hora, em ter medo de Trump. Segundo o Le Monde, “é preciso distinguir entre a relação com o futuro presidente da potência que garante a segurança dos seus aliados europeus e a resposta a dar aos CEO das redes sociais, por mais próximos que estejam de Trump”.Fato raro nos tempos atuais, o Le Monde dá razão ao presidente Emmanuel Macron, que logo assinalou que a ofensiva de Musk era política, e insiste numa resposta firme e rápida da União Europeia, com os instrumentos que a regulamentação de serviços digitais do bloco prevê contra fake news e ingerência eleitoral externa.Meloni manifesta apoio a MuskA única dirigente que defendeu abertamente Musk até agora foi a premiê de extrema direita da Itália, Giorgia Meloni. Ela chamou Musk de "gênio". No entanto, o apoio de líderes de países onde a extrema direita se fortaleceu, como Itália, Hungria, Eslováquia, Holanda, Finlândia, Suécia, já era esperados.Na Áustria, país onde o partido de extrema direita local chegou à frente em eleições legislativas recentes e começou a negociar a formação de um governo, 50 mil pessoas participaram de protestos nas ruas de Viena na noite de quinta-feira para exigir que a extrema direita seja excluída de uma coalizão governamental. Apesar do fenômeno do neofascismo ter se instalado no cenário político europeu, essa ideologia reacionária também enfrenta forte resistência popular.O jornal Ouest France chegou a fazer uma piada machista sobre a fascinação da italiana Giorgia Meloni por Elon Musk, dizendo que, agora, o bilionário tinha "outra paixão", a alemã Alice Weidel, da AfD.Uma investigação aberta em dezembro de 2023 pela Comissão Europeia emitiu conclusões preliminares de que a rede X de Musk violou a de lei Serviços Digitais em diferentes aspectos, como técnicas supostamente enganosas para manipular o comportamento do usuário, transparência publicitária e acesso a dados para pesquisadores. Mas as conclusões definitivas não foram publicadas, nem houve anúncio de multas pelas infrações.
Depois de uma fase experimental, a França ampliará a cobrança, em 2025, de uma multa de € 135 para carros, motocicletas e scooters que emitirem mais de 85 decibéis de ruído nas vias públicas. No câmbio desta sexta-feira (20), esse valor equivale a cerca de R$ 865. A França tem milhares de motoqueiros e motoristas que gostam de ronco de motor, de escapamento aberto, fedido e barulhento, sem o menor respeito pelos ouvidos e pulmões dos outros. Mas esses abusos vão custar caro a partir do ano que vem.O Centro de Informação sobre o Ruído (CidB), uma organização pluridisciplinar de interesse público, que promove uma série de ações e estudos contra a poluição sonora, fez um teste de madrugada em Paris com um scooter sem silenciador no escapamento e chegou a um resultado impressionante. O barulho provocado pelo motoqueiro em um trajeto de 7 km, entre a praça da Bastilha e o Arco do Triunfo, acordou 11 mil pessoas.Em 2025, o combate aos escapamentos barulhentos, adulterados pela remoção dos silenciadores ou por falta de manutenção adequada entra em nova fase. Um novo modelo de radar, chamado Hydra, desenvolvido para multar aqueles que não respeitam o limite de 85 decibéis, está em fase final de homologação e será instalado nas principais cidades do país.O Hydra foi desenvolvido por uma entidade chamada Bruitparif, que desde 2004 reúne representantes da sociedade civil e do poder público para avaliar a poluição sonora causada pelo trânsito, realizar pesquisas e propor soluções na região Île-de-France, onde fica Paris.Esse radar, projetado num poste alto, equipado com câmeras, sensores de ruído e microfones, é capaz de calcular em frações de segundos os decibéis emitidos por veículos, motos e scooters, mesmo em um contexto de tráfego denso. Acima dos 85 decibéis, o radar registra o excesso de ruído, fotografa a placa do infrator e transmite a multa para uma central de arrecadação.Desde 2022, o Hydra é testado em fase experimental em sete cidades francesas, incluindo Paris. O equipamento também mediu a poluição sonora em Berlim, Genebra, Bruxelas e Barcelona. O aparelho está em fase final e homologação e será implantado em todo o território francês no segundo semestre deste ano. Até lá, policiais continuarão a fazer a fiscalização nas ruas e aplicar a multa de € 135.Poluição sonora causa de doenças A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera níveis sonoros acima de 65 decibéis (dB) como poluição. Para o tráfego rodoviário, a recomendação da OMS é de no máximo 53 dB durante o dia e abaixo de 45 dB à noite e de madrugada, portanto bem abaixo do valor de referência adotado neste momento na França.Estudos científicos têm comprovado que o barulho é o segundo fator ambiental que mais causa problemas de saúde e perde apenas para a poluição atmosférica, segundo a OMS. A poluição sonora pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares, provocar distúrbios metabólicos, zumbido crônico no ouvido, perda de audição, entre outras patologias.Recentemente, deputados de esquerda tentaram aprovar na Assembleia francesa um imposto adicional na compra de motocicletas, mas perderam a batalha. Por outro lado, as associações da sociedade civil que militam contra o barulho e a poluição no trânsito estão comemorando a instalação desse novo modelo de radar.Sem pegar no bolso do usuário, difícil provocar mudança de hábitoOs lobbies pró e contra medidas de adaptação a cidades mais resilientes e livres de poluição são ativos na França, e as mudanças requerem um tempo de aceitação. Na experiência francesa, as multas caras têm sido dissuasivas. Até abril de 2024, motocicletas e scooters eram isentos de passar por uma vistoria técnica periódica, mas obrigatória para carros há muito tempo. Essa fiscalização feita em oficinas especializadas certificadas pelo governo verifica se as emissões sonoras e de gases estão de acordo com os índices previstos na lei.Os motoqueiros sempre alegaram que já poluíam menos do que os carros e, por isso, não deveriam ser fiscalizados. Durante meses, eles fizeram vários protestos para denunciar a vistoria técnica, que custa em média de € 60 a € 80 (R$ 380 a R$ 507, dependendo das cilindradas), mas foram derrotados.Os franceses reclamam de viver num Estado que “atazana” o cidadão com normas, multas e impostos excessivos. Mas o poder público vem aplicando, em etapas, a Lei da Normatização da Mobilidade, promulgada pelo Ministério da Transição Ecológica em 2019, que visa, entre outros objetivos, promover investimentos de infraestrutura e combater a poluição sonora e atmosférica nas cidades. A prefeitura de Paris, sob a gestão da socialista Anne Hidalgo, tem sido incisiva em suas políticas nessa área. Os carros têm sido banidos do centro da cidade, substituídos por bicicletas e quilômetros de ciclovias. Em fevereiro deste ano, o valor cobrado pela hora de estacionamento dos modelos SUV, considerados mais poluentes, foi triplicado. Contra a incivilidade nas ruas, em 2023, os parisienses aprovaram, em um referendo proposto pela prefeitura, a proibição dos patinetes elétricos de aluguel, porque os usuários não respeitavam os pedestres e causavam acidentes.
O centrista François Bayrou tomou posse nesta sexta-feira (13) como o novo primeiro-ministro da França, o quarto em apenas um ano. Em uma rápida cerimônia no Hôtel de Matignon, em Paris, o chefe de governo escolhido por Emmanuel Macron afirmou estar ciente das dificuldades que enfrentará, mas se disse disposto a enfrentar os desafios “com os olhos abertos”. Ao lado de Michel Barnier, destituído na semana passada, François Bayrou fez um discurso improvisado, prometendo "não esconder e nem negligenciar nada". Adotando um tom pessoal, o líder centrista também prevê acabar com “o muro de vidro” entre os cidadãos e o poder. Para isso, ele sabe que terá um longo e árduo caminho.“Ninguém mais do que eu conhece a dificuldade da situação”, afirmou Bayrou, evocando o impasse político e econômico da França. “Não ignoro o Himalaia que aparece diante de nós”, reiterou. Para ele, o déficit do país atinge 6,1% do PIB, e a dívida de € 60 bilhões por ano, “é um problema moral e não apenas financeiro”.O orçamento para 2025, além das divisões políticas na Assembleia dos Deputados, serão os grandes desafios do premiê em seu início de governo. Resta saber se ele conseguirá se manter no poder, já que, a exemplo de seu antecessor, Michel Barnier, Bayrou também poderá enfrentar uma moção de censura na Assembleia de Deputados.Antes dele, o chefe de governo destituído na semana passada, Michel Barnier, foi quem inaugurou a cerimônia de posse, com um breve discurso. Em sua fala, o ex-premiê fez duras críticas aos deputados da esquerda e da extrema direita responsáveis por sua queda, há nove dias. Segundo ele, a aliança entre as duas forças políticas opostas deixou o país “em uma situação inédita e grave”.Barnier não poupou elogios ao novo primeiro-ministro, destacando sua tenacidade e seu engajamento. “Nosso país precisa de verdade”, afirmou o republicano, recebendo um longo aplauso dos ex-ministros que fizeram parte de seu efêmero governo, que durou apenas três meses.Forte aliado de MacronPeso-pesado da política francesa, François Bayrou é uma figura conhecida na França. O premiê já foi ministro da Educação nos anos 1990 e foi nomeado ministro da Justiça no primeiro mandato de Macron, cargo que deixou ao ser acusado de desvio de fundos públicos europeus. Em fevereiro deste ano, foi inocentado, mas dias depois o Ministério Público recorreu da decisão. Segundo o jornal Libération, o processo ainda não tem data para começar.Bayrou também exerceu vários mandatos de deputado na Assembleia francesa. Há dez anos é prefeito da cidade de Pau, no sudoeste da França.Ao longo de sua extensa carreira política, o centrista fundou o partido MoDem (Movimento Democrata) e disputou eleições presidenciais em três ocasiões, 2002, 2007 e 2012. Em 2017, desistiu de se candidatar para apoiar Macron.Essa fidelidade teve um peso importante na escolha do presidente para o novo chefe de governo. Macron precisa de apoio em um momento que sua popularidade está em 21% - o nível mais baixo desde que chegou ao poder.Bayrou: o homem da situaçãoDesde a queda do ex-primeiro-ministro Michel Barnier, na semana passada, toda a imprensa francesa apostava na nomeação de Bayrou, classificado pelas mídias de "o homem da situação". O líder do MoDem nunca escondeu sua ambição de chegar ao cargo e em declarações recentes à imprensa francesa garantiu que estava pronto para assumir a chefia do governo.“Há um caminho a ser encontrado que reúna as pessoas no lugar de dividi-las. Acho que a reconciliação é necessária”, declarou o novo primeiro-ministro a jornalistas, logo após a nomeação. Embora analistas políticos afirmem ser difícil prever a constituição do governo Bayrou, acredita-se que a tendência é de uma nova administração de direita. O Partido Socialista, ala mais moderada da esquerda francesa, afirmou nesta tarde que continuará na oposição. Enquanto isso, a legenda França Insubmissa já ameaça o premiê com uma nova moção de censura.Na noite desta sexta-feira, o primeiro líder a ser recebido pelo premiê é o conservador Bruno Retailleau, ex-ministro do Interior de Barnier e uma das principais figuras do Partido Republicano.Do lado dos macronistas, a esperança é que Bayrou apazigue a crise política iniciada em junho deste ano, quando o presidente francês resolveu dissolver a Assembleia de Deputados e convocar novas eleições legislativas. "François Bayrou é a pessoa certa, no momento certo e no lugar certo para responder às aspirações da população, que quer sobriedade, tranquilidade, e sobretudo união em prol do país", avalia o ex-primeiro-ministro Gabriel Attal.
A França lidera um grupo de países europeus que se opõem aos termos do acordo anunciado nesta sexta-feira (6) em Montevidéu, no Uruguai, para o tratado de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia. Ongs e entidades agrícolas francesas previam que a conclusão das negociações seria anunciada e reagiram com decepção, prometendo novas manifestações. A federação nacional dos sindicatos de jovens agricultores franceses (FNSEA-JA) declarou que a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, “traiu os agricultores europeus”. Essa entidade considera que foi "uma provocação" a dirigente alemã ter aceitado que os produtores dos dois blocos continuarão a ter regras de produção diferenciadas, no caso mais favoráveis aos agricultores e pecuaristas do Mercosul, por não precisarem respeitar o mesmo padrão de qualidade imposto aos produtores do bloco. Uma representante da Coordenação Rural chegou a chorar ao ser entrevistada no canal BFMTV diante de duas más notícias em poucos dias. Com a queda do governo francês, na quarta-feira, os agricultores locais ficaram privados de uma verba de emergência de € 300 milhões que tinham conquistado nas negociações do orçamento para enfrentar a queda de produção em suas safras, em decorrência de eventos climáticos nos últimos meses. Com a votação do orçamento adiada para o ano que vem, pequenos produtores franceses poderão quebrar. A Copa-Cogeca, uma federação de peso em Bruxelas, prevê que esse "acordo comercial agravará a pressão econômica já suportada por muitos agricultores e pecuaristas que lidam com os preços elevados dos insumos e condições meteorológicas difíceis", afirma um comunicado da entidade.A Ong Greenpeace France denunciou um desastre "social, humano e ambiental".Todos prometem manter os protestos no bloco europeu.O que é "minoria de bloqueio"França e Itália reafirmaram que o processo de ratificação do acordo enfrentará um muro de resistência, apesar de ser apresentado como benéfico para 700 milhões de consumidores nos dois blocos. Os governos de Polônia, Bélgica, Holanda e Áustria já demonstraram não estar satisfeitos com os termos do texto negociado pela presidente da Comissão.A expectativa, agora, é de que Ursula von der Leyen retorne a Bruxelas para apresentar de forma clara de que maneira os agricultores europeus prejudicados pelas exportações sul-americanas, mais competitivas, serão recompensados financeiramente. O processo de avaliação do tratado poderá durar de sete a nove meses, segundo várias fontes. Nesse meio tempo, a pressão dos agricultores irá continuar. Para ser ratificado, o texto concluído em Montevidéu precisa ser aprovado por 15 dos 27 países do bloco europeu. Por outro lado, para barrar o acordo, a França precisa formar uma “minoria qualificada” de pelo menos quatro países, que juntos reúnam 35% da população do bloco. Essa conta ainda está longe de ser alcançada para o governo francês, atualmente enfraquecido. Muitos analistas compreendem a pressa da Comissão Europeia e de Ursula von der Leyen em ter uma carta na manga para enfrentar o retorno de Donald Trump à Casa Branca e o provável aumento das tarifas das exportações europeias para os Estados Unidos. Por isso, Alemanha e Espanha consideraram que "um passo histórico" foi dado. Mas até essa parceria comercial entrar em vigor em cada país europeu, pode demorar vários anos. Após o anúncio do entendimento entre os líderes de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai e a Comissão Europeia, emissoras de rádio e TV na França questionaram agricultores se eles iriam protestar diante de Ursula von der Leyen, que estará neste sábado (7) em Paris para a reinauguração da catedral de Notre-Dame. Alguns sindicatos agrícolas disseram que terão outras ocasiões para cobrar explicações da dirigente europeia.
A Assembleia de Deputados da França começou a debater nesta semana um projeto de lei que visa inscrever o conceito de consentimento na definição do que é um estupro no Código Penal do país. A discussão ocorre paralelamente ao fim do julgamento de dezenas de homens acusados de estuprar Gisèle Pelicot, de 72 anos, que era sedada pelo marido para que esses crimes fossem cometidos, durante anos. Daniella Franco, da RFIO final do chamado “processo de Mazan” em Avignon, no sul do país, coincide com o debate sobre o projeto de lei que pode introduzir no Código Penal francês a ausência de consentimento na definição de estupro. O texto é de autoria da deputada francesa Sarah Legrain, do partido da esquerda radical França Insubmissa.Atualmente, a legislação francesa estabelece que “todo ato de penetração sexual, de qualquer natureza que seja, cometido por meio de violência, imposição, ameaça ou surpresa” é um estupro. Ou seja, a noção de consentimento não faz parte da lei, o que leva advogados a terem que provar, a cada julgamento de crimes de violências sexuais, que o agressor agiu contra a vontade da vítima.Foi o que ocorreu durante o julgamento dos 50 homens acusados de estuprar Gisèle Pelicot. Antes das agressões sexuais, a francesa era previamente sedada pelo marido, Dominique Pelicot, que levava para a residência do casal homens que conhecia pela internet.Os estupros ocorreram durante cerca de dez anos em Mazan, no sul da França. Alguns advogados de defesa chegaram a evocar a possibilidade de a mulher ter consentido os atos e não estar inconsciente durante as agressões, embora os vídeos registrados pelo marido e exibidos durante o processo mostrem o contrário.Projeto de lei divide opiniõesO projeto de lei que prevê inscrever a noção de consentimento na definição de estupro é defendido por boa parte da classe política francesa, inclusive pelo presidente, Emmanuel Macron, e o ministro da Justiça, Didier Migaud. No entanto, muitas personalidades do Direito francês e até organizações feministas contestam a iniciativa.A ONG “Osez Le Féminisme” (Ousem o Feminismo) alega que o estupro não é uma relação sexual não-consentida, mas um ato de predação e de violência. Por isso, as militantes dessa organização temem que o projeto de lei possa culpabilizar ainda mais a vítima, colocando a atitude de quem foi violentado no centro do julgamento e deixando em segundo plano o ato do predador sexual.Entrevistado pela France Info, Antoine Camus, um dos advogados da Gisèle Pelicot, também se opõe ao projeto de lei. Segundo ele, muitas vítimas acabam consentindo um ato sexual sem necessariamente estar de acordo com ele, para colocar um fim a uma situação martirizante.Já o advogado Louis-Alain Lemaire, que representa quatro dos 51 homens acusados no processo de Mazan, acredita que a modificação da lei francesa poderia também interferir no funcionamento do Direito Penal. Segundo ele, atualmente cabe à acusação demonstrar que houve o estupro. Com a inserção do consentimento na lei francesa que criminaliza o estupro, o magistrado prevê que os papéis podem se inverter e caberá à defesa demonstrar que houve consentimento.Encerramento do “processo de Mazan”O julgamento dos 51 homens acusados de estuprar Gisèle Pelicot entrou na fase final. O Ministério Público francês apresentou nesta semana as penas para cada um dos agressores.A pena maior é a requerida a Dominique Pelicot. Na França, a sentença máxima para estupro é 15 anos, mas como o caso de Gisèle conta com agravantes, o principal acusado do “processo de Mazan” pode ser condenado a 20 anos de prisão.Os advogados de defesa começaram a apresentar no final desta semana as considerações finais. Terminada essa fase, cabe aos cinco juízes da corte de Avignon entrarem em acordo para o anúncio do veredito, que deve sair até 20 de dezembro.Segundo o último balanço do Ministério do Interior da França, 250 mil pessoas adultas sofreram ao menos uma forma de violência sexual em 2022. Entre as vítimas, 88% são mulheres.Cerca de 95% das pessoas agredidas não registraram denúncia junto às autoridades francesas por dois principais motivos. De acordo com o documento, 24% das vítimas acreditam que a iniciativa não traria resultados concretos e 16% acham que não seriam levadas a sério pela polícia.Em 2022, apenas 1.200 condenações por estupro foram pronunciadas na França.
As operadoras de telefonia francesas acabam de adotar medidas para diminuir os golpes financeiros aplicados aos clientes por meio de chamadas telefônicas. Na era digital, as tentativas de extorsão praticadas por golpistas se tornaram uma praga globalizada. O golpe do falso gerente ou funcionário de banco que telefona ao cliente para solucionar alguma urgência, mas é um golpista querendo tirar dinheiro da pessoa, é a fraude mais frequente na França. É aquele golpe chamado “spoofing”, termo em inglês que significa falsificação, em que criminosos ligam para a vítima usando um número que parece ser do banco, mas não é.Eles utilizam uma tecnologia para mascarar o número verdadeiro que estão usando, fazendo parecer que a ligação vem da agência. A pessoa é enganada porque os golpistas, mestres na manipulação, citam informações convincentes. Às vezes conhecem dados cadastrais do cliente, que hackearam anteriormente da rede bancária, dizem que a conta sofreu uma tentativa de fraude e pedem à vítima para autenticar operações, que na verdade podem estar validando um empréstimo ou transferindo dinheiro para os criminosos.Esse tipo de golpe, no entanto, pode ficar mais difícil. Desde o início de outubro, todas as operadores francesas de telefonia começaram a usar o chamado Mecanismo de Autenticação de Números (MAN), uma tecnologia desenvolvida para verificar se o telefone exibido durante uma chamada ou mensagem é de fato do remetente que aparece e não de um golpista.Essa autenticação é feita em frações de segundo, com uma consulta automática ao cadastro nacional de números da Arcep, a agência reguladora do setor, que emite um certificado digital confirmando que a chamada provém da linha associada ao número. Na ausência do certificado, a operadora corta automaticamente a ligação, quer dizer, a pessoa nem é incomodada. Esse sistema francês utiliza dois protocolos de segurança de chamadas telefônicas –STIR (Secure Telephony Identity Revisited ) e SHAKEN (Signature-based Handling of Asserted information using toKENs) – que já são adotados nos Estados Unidos e no Canadá.Lei demorou quatro anos para ser aplicadaNa França, o desenvolvimento de um sistema de proteção dos clientes foi estabelecido por uma lei que entrou em vigor em 2020. Mas só agora, depois de um trabalho conjunto do banco central do país e de investimentos feitos pelas operadoras e pela agência reguladora na criação de um cadastro nacional de números de telefone constantemente atualizado é que a autenticação automática começou a funcionar. Em uma primeira etapa, essa verificação só está acontecendo entre telefones fixos.O Banco da França diz que “em quase todos os casos de falsificação bancária que são comunicados, o golpe envolve um número de telefone fixo". As operadoras estão trabalhando para estender o sistema aos celulares.Golpes movimentam bilhões Segundo o último relatório anual do Observatório de Segurança dos Meios de Pagamento, as fraudes de manipulação, com pressão emocional e muita lábia – e uma delas é a que envolve um falso funcionário de banco –, movimentaram € 379 milhões, quase R$ 2,3 bilhões, em 2023.Quando são incluídos outros golpes de pagamento, como clonagem de cartões de crédito ou envio de mensagens SMS pedindo o número do cartão da vítima, o prejuízo chega a € 1,2 bilhão (R$ 7,27 bilhões) em 2023. São números relativamente estáveis, segundo o banco central francês.Pessoas que transmitem suas senhas para terceiros ou caem nesses pedidos de validação de alguma operação a partir do telefonema de alguém que se apresenta como funcionário do banco, e depois veem o dinheiro desaparecer da conta, precisam entrar com uma ação na Justiça para serem reembolsadas.Os bancos consideram que esses clientes foram negligentes, uma vez que as instituições financeiras fazem amplas campanhas de esclarecimento sobre golpes, em emissoras de rádio e TV, alertando que nenhum funcionário ou gerente, de qualquer rede bancária, tem autorização para telefonar ao cliente e pedir a senha da pessoa ou qualquer tipo de autenticação por telefone ou SMS, nem num caso de urgência. Pagamentos e autenticações devem ser feitos diretamente no site do banco, no espaço pessoal do cliente ou no aplicativo do celular, que confere a identidade da pessoa. Nunca com a intervenção de um terceiro.Essa postura dos bancos pode, entretanto, mudar no futuro. Um tribunal de segunda instância acabou de condenar, em Paris, um dos maiores bancos franceses, o BNP Paribas, a reembolsar um cliente que teve a conta esvaziada por criminosos.Esse homem, hoje com 66 anos, teve a conta bancária roubada em 2019 em € 54.500, cerca de R$ 330 mil reais. O empresário contou que estava com a mulher no carro, na véspera de um feriado prolongado, quando viu entrar no painel a chamada do banco onde ele tinha conta.A pessoa do outro lado da linha disse que tinha detectado um problema na lista de destinatários autorizados a receber os pagamentos automáticos que o cliente havia programado. O banco já tinha solucionado o problema, mas o cliente precisava autorizar novamente a inserção de cada correntista que aparecia na tela do aplicativo. O empresário caiu no golpe. Ele via o nome das pessoas que conhecia desfilar na tela do celular e autorizava a operação. Porém, a conta bancária associada àqueles nomes tinha mudado e era a dos criminosos.O francês entrou com uma ação na Justiça. O banco ganhou em primeira instância, alegando que a negligência foi do cliente. O empresário contestou a decisão, e o juiz de segunda instância deu ganho de causa para ele, obrigando o BNP Paribas a reembolsar os R$ 330 mil reais roubados da conta. O processo demorou cinco anos.Advogados acreditam que esse caso cria uma jurisprudência que irá facilitar outras ações de pessoas que forem lesadas por golpes financeiros.
A sexualidade da população francesa está em uma surpreendente evolução. Com práticas menos ditadas pela heterossexualidade, a quantidade de relações sexuais tradicionais diminui, enquanto aumenta o interesse das mulheres da França por parceiras do mesmo gênero. É o que mostra um vasto estudo do Instituto Nacional da Saúde e da Pesquisa Médica (Inserm), divulgado nesta semana. Daniella Franco, da redação da RFIA vida sexual dos franceses e francesas está menos intensa? Os pesquisadores duvidam dessa hipótese, mesmo que o novo estudo do Inserm sobre a sexualidade na França aponte que a quantidade de relações sexuais vem diminuindo no país. O balanço – o quarto do gênero em 50 anos – ouviu mais de 31 mil pessoas com idades entre 18 e 89 anos e aponta que as experiências estão se diversificando, principalmente entre as faixas etárias mais jovens, onde cresce a rejeição da heteronormatividade.A principal conclusão do estudo é que as práticas sexuais na França estão se transformando, principalmente entre as mulheres. As francesas estão experimentando outras formas de relações sexuais que não se limitam à penetração. É entre elas que também cresce a masturbação, praticada por mais de 42% das cidadãs em 1992, e que deu salto de mais de 30 pontos (72%), em 2023, ano em que o estudo do Inserm foi realizado.Entre as francesas, aliás, 13% dizem terem sentido atração por pessoas do mesmo gênero, ainda que apenas 1,3% se declarem lésbicas. No quadro geral, quase 9% de mulheres e homens na França já tiveram ao menos um parceiro sexual do mesmo gênero. Mas, pela primeira vez em 50 anos, na faixa etária dos 18-29 anos, a quantidade relações sexuais entre mulheres (15%) é maior do que entre homens (10%).Já quantidade de gays compilada pelo estudo é de apenas 2,3%. No entanto, 8% dos homens ouvidos para a pesquisa afirmam que já tiveram interesse em pessoas do mesmo sexo ao longo da vida.Transformações sociaisDe acordo com os pesquisadores do Inserm, vários indicadores justificam essas mudanças na sexualidade da população francesa. Primeiramente, a aceitação e a tolerância à homossexualidade e à transidentidade é maior do que nas últimas décadas. Quase 70% das francesas e mais de 56% dos franceses veem a homossexualidade como uma orientação sexual comum. O número é um pouco menor para a aceitação da transidentidade, tolerada por quase 42% das mulheres e por mais de 31% dos homens.No entanto, em relação especificamente às mulheres, os pesquisadores têm outras explicações para o interesse crescente das francesas heterossexuais por experiências com pessoas do mesmo sexo. O principal motivo é o movimento Mee Too, que suscitou uma imensa mobilização social contra as violências e agressões sexuais e também sensibilizou e educou as mulheres sobre consentimento.A pesquisa do Inserm também mostra que quase 30% das francesas de 18 a 89 anos entrevistadas declararam já terem sido forçadas a ter uma relação sexual, contra quase 16% em 2006. Esse aumento também é observado entre os homens, embora seja menor: 8,7% dos franceses ouvidos para o estudo disseram já terem sido forçados a ter uma relação sexual, contra 4,6% no balanço anterior, realizado em 2006.Pandemia afetou sexualidade na FrançaA pandemia de Covid-19 não mexeu apenas com a saúde dos franceses, mas afetou também as relações sociais e a vida sexual dos indivíduos. Os sucessivos lockdowns tiveram um impacto na iniciação dos jovens ao sexo, elevando a média da idade da primeira relação sexual das mulheres para 18,2 anos e 17,7 anos para os homens (contra 17 anos na média de 2006).Em todas as faixas etárias, a quantidade de relações sexuais também diminuiu na França. Em 1992, mais de 86% das mulheres e 92% dos homens afirmavam ter tido relações sexuais ao longo do ano, mas em 2023 esse número caiu em média dez pontos tanto para as mulheres quanto para os homens.O fenômeno também é justificado pela “digitalização” das práticas sexuais, principalmente entre os mais jovens. Segundo o Inserm, 33% das francesas e quase 47% dos franceses tiveram uma experiência sexual online com outra pessoa em 2023. A faixa etária dos 18 aos 29 anos, por exemplo, é a que mais “normaliza” o envio de “nudes” - como são chamadas fotos das partes íntimas mandadas por aplicativos de mensagens. Quase 40% dos franceses e francesas entrevistados para o estudo já compartilharam esse tipo de conteúdo.A digitalização da vida sexual é muito comum entre os jovens. Entre as pessoas de menos de 30 anos aqui na França, mais de 39% das mulheres e mais de 43% dos homens já encontraram parceiros sexuais na internet, seja por meio de sites ou de aplicativos.Satisfação sexual aumentaTodas essas mudanças não parecem afetar a satisfação sexual da população francesa. Em relação ao balanço de 2006, aumentou a quantidade de mulheres francesas que afirmam estar “muito felizes” com sua vida sexual, 45,3% (contra 43,6% há oito anos). Entre os homens, no mesmo período, a satisfação sexual saltou de 35% para 39%.“Todo o discurso que consiste em dizer que a igualdade entre os sexos e o feminismo desestabiliza os homens em sua sexualidade e sua virilidade não é comprovada nesse estudo”, afirmou a socióloga Nathalie Bajos, diretora de pesquisa do Inserm, na apresentação do trabalho.Esse foi o quarto balanço do gênero realizado na França desde os anos 1970. Mais de 31 mil pessoas, com idades entre 18 e 89 anos, foram entrevistadas por telefone para a pesquisa no ano passado, em um trabalho que durou o total de cinco anos, com parceria da Agência Nacional de Pesquisa Científica (ANRS).
Os franceses reagiram à vitória de Donald Trump na eleição presidencial com pessimismo e um forte receio do enfraquecimento da democracia nos Estados Unidos, por causa da concentração de poder que o republicano terá, apoiado pela maioria conservadora na Suprema Corte, no Senado e talvez – ainda não acabou a apuração – na Câmara de Representantes. Embora defenda políticas semelhantes às de Trump, a líder de extrema direita na França, Marine Le Pen, preferiu não festejar a vitória de Trump. Uma pesquisa realizada na França já apontou que 76% dos franceses estão frustrados com o retorno de Donald Trump à Casa Branca. A desconfiança é maior entre eleitores de esquerda e jovens. Mas até a líder de extrema direita Marine Le Pen manifestou uma reação sóbria, na contracorrente de outros movimentos ultranacionalistas europeus, da Alemanha, Áustria, Hungria, Espanha, que estão eufóricos com o impulso que o governo Trump dará às políticas anti-imigração, de segurança pública e nacionalismo econômico, em oposição a questões de justiça social, racial, respeito a minorias e direitos da mulher. O estilo imprevisível e radical de Trump não se alinha com a imagem mais moderada que Marine Le Pen busca projetar atualmente. Le Pen sabe que se quiser ser eleita na presidência francesa, seu partido precisa ampliar a base do eleitorado e ela ser vista como uma líder conservadora estável, capaz de jogar o jogo democrático, apesar de não enganar ninguém. Trump e Le Pen têm posições semelhantes sobre imigração e protecionismo econômico. Mas em temas como o aborto, por exemplo, Marine Le Pen apoiou a inclusão do aborto na Constituição francesa. A imagem de Trump na França é muito negativa e Le Pen quer evitar ser associada aos excessos do republicano. Ela tem uma estratégia de buscar alianças mais estratégicas e evitar a polarização no cenário político nacional. O partido de extrema direita francês (Reunião Nacional) elegeu um quarto dos deputados na Assembleia Nacional nas últimas eleições e eles têm procurado atuar como políticos "respeitáveis", o que os diferencia de outros movimentos de extrema direita na Europa.Trump chega à presidência num momento em que as duas maiores economias da União Europeia, França e Alemanha, atravessam uma crise política e econômica de contextos diferentes. UE anuncia plano para enfrentar concorrência de EUA e ChinaOs 27 líderes da União Europeia anunciaram na tarde desta sexta-feira (8), ao final de uma reunião de cúpula do bloco em Budapeste (Hungria), um plano de reformas inspirado em propostas do ex-primeiro ministro italiano Mario Draghi para dar impulso à economia europeia, diante das ameaças de guerra comercial de Donald Trump. O bloco sabe que é a região do mundo que mais tem a perder com as medidas protecionistas do republicano. Durante a campanha, Trump anunciou que os produtos importados europeus terão de pagar tarifas extras de 10% a 20% para entrar nos Estados Unidos. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von Der Leyen, disse que irá propor “nos primeiros 100 dias” de seu novo mandato, que começa em dezembro, um pacto industrial verde para apoiar a descarbonização da indústria, medidas para reduzir o atraso europeu na área de inovação e diminuir os entraves burocráticos à atividade empresarial na Europa.O chanceler alemão Olaf Schoz enfatizou que o bloco "precisa se modernizar para se manter competitivo".Já o presidente francês Emmanuel Macron deixou a reunião antes da fotografia final de família dos 27, sem falar com a imprensa. Macron e Scholz divergem sobre a forma de financiar esses investimentos, a distribuição dos montantes por país e setor industrial, e o ritmo de mobilização dos recursos. No início de setembro, o ex-premiê Mario Draghi, que também dirigiu o Banco Central Europeu, propôs investimentos de € 750 a € 800 bilhões por ano (algo em torno de R$ 4,67 a R$ 4,93 trilhões), montante superior ao do Plano Marshall americano, que apoiou a reconstrução da Europa após a Segunda Guerra Mundial, para enfrentar a concorrência dos EUA e da China.Draghi traçou um quadro sombrio e insistiu que o bloco precisava reagir, se não quisesse enfrentar um declínio econômico que condenava os europeus à agonia. No relatório, ele apontou que a renda per capita “aumentou quase o dobro nos Estados Unidos do que na Europa desde 2000”. Esses investimentos elevados representam um imenso desafio para os 27 países europeus, num contexto em que adotam medidas para reduzir suas dívidas e elevados déficits públicos.Na declaração final do encontro, os líderes da UE reconhecem “a urgência de uma ação decisiva” para o aprofundamento do mercado comum, se comprometem com a união dos mercados de capitais, a implementação de uma política comercial que defenda os interesses europeus e a simplificação regulatória. Mas permanecem vagos em relação ao orçamento.Com o retorno de Trump, institutos alemães calcularam o custo das medidas protecionistas para a Alemanha. O país poderia perder até € 180 bilhões até 2028, cerca de R$ 1,1 trilhão com as sobretaxas americanas nas exportações. O PIB alemão encolheria 1,5% em relação ao seu montante atual, sendo que o país, a primeira economia europeia, enfrenta o segundo ano de recessão.Scholz admite antecipar as eleições Na quarta-feira (6), enquanto o mundo ainda digeria a vitória de Trump, a coalizão de governo alemã, formada por social-democratas, verdes e liberais, implodiu, devido a divergências de visão sobre a melhor forma de enfrentar a crise econômica. Os social-democratas defendem a recuperação da economia por meio de gastos, enquanto os liberais pregam cortes e uma disciplina orçamentária rigorosa. Em Budapeste, o chanceler Olaf Scholz disse aos colegas europeus que poderá antecipar as eleições legislativas. Ele queria ganhar tempo até março, mas uma pesquisa publicada ontem mostra que 65% dos alemães querem eleições o mais rapidamente possível, em janeiro. Os conservadores da CDU, chefiados por Friedrich Merz, lideram as pesquisas para voltar ao governo e também pressionam por um retorno às urnas acelerado. As pesquisas apontam, no entanto, que eles não teriam maioria, com a extrema direita em segundo lugar nas intenções de voto.A tendência é a Alemanha voltar a ter uma grande coalizão entre conservadores, social-democratas e talvez ainda precisar dos verdes ou dos liberais, mas esses últimos não têm garantia de serem eleitos no futuro Parlamento. O líder da CDU já descartou governar com o partido de extrema direita AfD. Essa reviravolta no cenário político na Alemanha acontece num momento em que a França continua sujeita a uma uma nova dissolução do Parlamento no ano que vem. A turbulência na União Europeia tende a durar um bom tempo.
Uma pesquisa recém-publicada em Paris mostra uma desconfiança crescente dos franceses em relação ao sistema democrático da maneira como ele tem funcionado na França. O barômetro anual do Conselho Econômico, Social e Ambiental (Cese) sobre as preocupações da população revelou um distanciamento muito grande entre o debate político no país e os reais interesses dos franceses. O Conselho Econômico, Social e Ambiental é visto como uma terceira assembleia da República francesa, uma engrenagem essencial da democracia no país. O organismo elabora orientações de políticas públicas e avalia seus resultados para o governo e o Parlamento.Em seu barômetro de 2024, o Cese mostra que quase um quarto dos franceses (23%) não estão mais convencidos de que a democracia seja o melhor sistema político. A metade da população (51%) acredita que só um poder forte e centralizado – um eufemismo para o exercício autoritário do poder – pode garantir a ordem e a segurança.Duzentos e trinta e cinco anos depois da Revolução Francesa (1789), que instituiu a democracia, 15% dos franceses disseram que não iriam à rua para defender esse sistema político se suas liberdades estivessem ameaçadas. Essa quebra de confiança na democracia se manifesta principalmente entre as pessoas que se sentem mais injustiçadas socialmente.O estudo do Cese, aplicado pelo instituto Ipsos, aponta um fosso entre as preocupações manifestadas pela população e a ação política. Em 2024, os franceses estão preocupados, pela ordem, com a própria saúde e de familiares – tema citado por 40% dos entrevistados –, o poder aquisitivo (34%), que aparecia em primeiro lugar no ano passado, e a situação econômica e financeira do país (28%).Imigração é preocupação menorO paradoxo é que há anos, o debate político foi reduzido às questões de segurança pública e imigração, que aparecem em sétimo e décimo lugar entre as preocupações dos franceses. O eleitor é bombardeado com uma retórica conservadora, anti-imigração, quando o que causa angústia é a falta de médicos e enfermeiros nos hospitais, os salários achatados e o aumento das desigualdades. A maioria dos franceses não atribui esses problemas à imigração.Segundo a pesquisa, embora a maioria tenha apreço pela democracia, a alienação dos políticos em relação às expectativas das pessoas enfraquece a confiança, principalmente entre aqueles que se sentem lesados.A França é um país que tem políticas públicas generosas na área social, mas o sistema é ineficiente e não dá mais conta de atenuar as desigualdades. O país gasta proporcionalmente mais que vizinhos como Espanha e Alemanha em programas sociais, saúde e educação e se tornou incapaz de amortecer as desigualdades. Quase a metade dos franceses, 45% da população, considera viver atualmente em uma situação financeira "incômoda".Custo de vida alto mina confiança dos franceses no futuroO custo de vida insuportavelmente alto é mais angustiante nos territórios franceses fora da Europa e nas zonas rurais no continente, mas até na região parisiense, que é o pulmão econômico do país, 55% das pessoas dizem ganhar o suficiente apenas para pagar as contas no fim do mês. Esse aprofundamento das desigualdades é um veneno para a estabilidade de uma democracia.Existe um tremendo déficit de moradia e os políticos, governo após governo, fogem de uma reforma profunda nesse setor. Quando o aluguel consome o salário, o cidadão mora mal e vê profissões essenciais perderem a atratividade por serem mal remuneradas, como na educação, saúde e agricultura. Os prejudicados têm a impressão de que o sistema em vigor não consegue mais proteger a população.É nesse caldo de dificuldades do cotidiano e no descaso dos políticos em relação à realidade que muitos franceses se perguntam se votar ainda tem alguma utilidade.Sugestões para revitalizar democracia francesaA primeira sugestão dos entrevistados para "modernizar" a democracia francesa foi que os políticos ouçam e levem em consideração as preocupações das pessoas (24% das respostas). Mais do que modificar as regras eleitorais (11%) – tema que está em discussão para a próxima eleição presidencial –, os franceses preferem melhorias na governança e no funcionamento das instituições (16%) e um uso mais frequente de ferramentas de democracia participativa.Na Europa, a Suíça é vista como um modelo de democracia direta por seu sistema de referendos. A Áustria também usa esse instrumento, de tempos em tempos, para questões sociais e políticas, e a Itália para questões constitucionais. Essa é uma demanda antiga dos franceses. O "Grande Debate Nacional " convocado pelo presidente Emmanuel Macron para encerrar a crise dos coletes amarelos, em 2019, é um exemplo de proximidade a ser buscada pelos políticos. Na época, o governo recolheu 2 milhões de propostas. As discussões geraram a Convenção Cidadã para o Clima, mas 90% das propostas foram rejeitadas pelo presidente. É essa relação que está em pane.Em relação a alguns assuntos, bastaria o Parlamento ouvir a vontade da maioria da população e evitar o debate ideológico que o sentimento de estar numa democracia seria devolvido aos franceses. O caso da eutanásia e do suicídio assistido é um deles.EutanásiaDesde 2016, quando a França aprovou a primeira lei sobre o fim da vida, a maioria de franceses já ansiava pela liberdade de decidir sobre a morte diante de doenças irreversíveis, terminais ou de intenso sofrimento para os pacientes.O projeto de lei só chegou ao Parlamento em 2024, mas depois, com a dissolução da Assembleia, em junho, a votação ainda não foi retomada pelo novo plenário e a composição, agora, é mais conservadora, de direita, o que pode implicar emendas ao projeto original.Há anos existe um consenso na sociedade sobre essa liberdade de escolha: 84% dos franceses são favoráveis à eutanásia e 67% ao suicídio assistido. É um caso típico de projeto que já poderia ter sido aprovado, se o Parlamento estivesse a serviço do interesse da população.
As mortes trágicas de Fernanda Lind, influenciadora digital brasileira de 31 anos, e do ciclista francês Paul Varry, 27 anos, ambos atropelados nesta semana, na região parisiense, por motoristas que desrespeitaram as regras do trânsito provocam um amplo debate no país. Estudos têm demonstrado que os franceses estão mais agressivos ao volante. A percepção de que a agressividade no trânsito em Paris piorou é compartilhada por franceses e estrangeiros que residem há algum tempo no país. A influencer brasileira Fernanda Carolina Lind Silva foi atropelada quando atravessava uma faixa de pedestres, às 9h de quarta-feira (16), em uma área nobre dos subúrbios da capital. Com o forte impacto do carro, ela sofreu um grave traumatismo craniano e teve morte cerebral declarada algumas horas depois de ser socorrida.O outro acidente foi de uma violência raramente vista na capital francesa. Na véspera da morte da brasileira, um motorista de 52 anos, dirigindo um SUV Mercedes-Benz, com a filha de 16 anos no carro, invadiu uma ciclofaixa nas proximidades da igreja Madeleine, em Paris, para "escapar do trânsito", segundo declarou à polícia, pois “estava atrasado para levar a filha ao médico”. Ao invadir a faixa reservada às bicicletas, o motorista apressado passou com o carro em cima do pé de um ciclista militante. Os dois tiveram um bate-boca e na hora de ir embora, o motorista atropelou intencionalmente o rapaz de 27 anos, que morreu de parada cardíaca no local. Na tarde desta sexta-feira (18), este motorista foi indiciado por homicídio doloso, ou seja, assassinato, e deverá permanecer em prisão preventiva até seu julgamento.A disputa por prioridade no trânsito piorou com a instalação de ciclovias em Paris. Por falta de espaço, as ciclofaixas predominam e muitas são de mão dupla, às vezes nas duas margens de uma via pública, obrigando motoristas e ciclistas a uma coexistência que se tornou uma guerra permanente.Existem placas de sinalização, mas das duas partes existem abusos: ciclistas que não respeitam as regras, invadem faixas de circulação de carros – por se sentirem "mais éticos" e preocupados em não agravar a crise climática – e motoristas que descontam nos pedestres e ciclistas o aumento do trânsito pela redução das faixas de circulação.Desafio para municipalidadesÉ um desafio para as cidades enfrentar essa fase de adaptação. Como na região parisiense o trânsito é bastante denso, os motoristas estão cada vez mais irritados.Com a repercussão das mortes da brasileira e do ciclista, o psicólogo e pesquisador Jean-Pascal Assailly, membro do comitê de especialistas do Conselho Nacional de Segurança Viária, confirmou que existe uma correlação entre densidade de tráfego e agressividade do motorista.Em países como Holanda, Dinamarca, Alemanha ou Suécia, com mais experiência na integração de ciclovias, a fluidez é maior e há menos acidentes letais. Nesses países, a questão do respeito às leis também é mais consensual na sociedade. Estudos de dez anos atrás já mostravam que franceses e italianos eram mais agressivos no trânsito do que motoristas suecos, alemães, ingleses e espanhóis.O especialista francês do Conselho Nacional de Segurança Viária diz que o comportamento do motorista piorou na França com as comodidades dos carros novos. Segundo ele, o carro se tornou um objeto tão confortável, "com telas para ver filmes, ouvir música, que o motorista se isola do exterior e perde a noção da velocidade". Alguns motoristas simplesmente "esquecem" a existência do outro na rua.Na França, os homens estão na origem de 75% dos acidentes. Dos 25% de acidentes causados por mulheres, nenhum envolve agressão, do tipo bater o carro intencionalmente em alguém para ferir ou matar, como aconteceu com o ciclista em Paris.Morte de brasileira tem forte repercussãoO jornal Le Parisien, que tem edições locais para diferentes subúrbios de Paris, presta uma homenagem à brasileira, nesta sexta-feira, na capa do suplemento vendido na área onde ela morreu.O jornal entrevista o marido dela, Pedro Angelo Abatayguara Rosal, que conta a vida do casal desde que se mudaram para a França em 2018, para fazer mestrado. A manchete diz que ‘Fernanda teve a vida arruinada' (La vie fauchée de Fernanda) no momento mais feliz da trajetória do casal. Os dois, muito bem empregados, tinham acabado de comprar um apartamento em Saint-Cloud, ao lado de um hipódromo que tem pista de corrida e ciclovia demarcadas. Fernanda foi atropelada numa faixa de pedestres de um cruzamento sem farol, por imprudência do motorista, que também é investigado por homicídio.Mas o que mais surpreendeu a imprensa francesa foi a generosidade da família em relação à doação de órgãos. Neste mês de outubro, há 21.866 pacientes inscritos na lista de espera de transplantes em todo o país e desse total, 11.422 são pessoas prontas para receber um órgão assim que o doador compatível aparecer.Doação de órgãos marca pela generosidadeTanto o marido quanto a irmã de Fernanda, Aline, disseram que os órgãos doados pela influencer – coração, fígado, pâncreas, córnea e rins – foram transplantados, dando a várias pessoas a chance de continuar vivendo.Para um transplante de rim, o de maior demanda, há mais de 3.300 pessoas na fila, sendo que é o que parentes podem doar com mais facilidade, por compatibilidade genética. Para um coração, a espera média é de quatro meses.Os médicos apontam um paradoxo: cerca de 80% dos franceses afirmam ser a favor da doação de órgãos, mas menos da metade comunicam essa decisão à família. Embora todas as pessoas sejam doadoras potenciais, a menos que tenham deixado registrado a recusa em doar no cadastro nacional de doações, os médicos sempre confirmam a vontade com os familiares. No caso da brasileira, o marido e a família dela confirmaram esse desejo.Em 2023, havia 36% de franceses que registraram oficialmente a recusa em doar. Os principais motivos de resistência alegados são a desconfiança nos médicos, o receio de que os órgãos sejam usados para pesquisa, e não para salvar a vida de alguém, e crenças religiosas. O Ministério da Saúde reconhece que ainda é preciso trabalhar o assunto em campanhas de sensibilização.Por essas razões, a morte de Fernanda Lind marca os franceses e brasileiros que a seguiam no perfil @parislowcost no Instagram, onde dava dicas de turismo na capital francesa: um exemplo de generosidade e amor pelo país de adoção.
As autoridades francesas se mobilizam neste Dia Internacional da Menina, celebrado nesta sexta-feira (11), um dia depois do Dia Internacional da Saúde Mental, para sensibilizar a sociedade a respeito de uma injustiça persistente. As adolescentes francesas têm desenvolvido transtornos psíquicos mais cedo do que os meninos, por ficarem expostas à violência sexual e de gênero em idades mais precoces do que eles, acumulando um duplo prejuízo para sua saúde mental. Na França, as meninas têm a chance de não precisar trabalhar. Todas vão à escola pelo menos até os 16 anos. O ensino é obrigatório, gratuito e em período integral, independentemente da situação econômica da família, o que já é uma vantagem em relação a muitos países.O problema, na atualidade, é que as atividades nas redes sociais passaram a interferir demasiadamente no desenvolvimento das crianças e adolescentes, e a questão da sexualização das meninas na internet tem tirado o sossego de muitas jovens francesas.Em entrevistas ou entre amigas, elas reclamam que as fotos do cotidiano que postam nas redes sociais, inteiramente vestidas, no caminho da escola ou fazendo alguma atividade que nada tem a ver com a sexualidade, acabam recebendo comentários de natureza sexual. Na era do smartphone acessível a crianças, o assédio às meninas foi banalizado. Desde novinhas, elas ficam sujeitas ao bullying, muitas vezes ligado à aparência física, a pedidos de nudes e a chantagens de colegas expostos à pornografia. Algumas mais vulneráveis são identificadas por criminosos que as induzem à prostituição. Esse contexto inadequado a um desenvolvimento sadio tem tido impacto na estruturação psíquica das adolescentes francesas. Algumas conseguem se proteger saindo das redes – e elas são cada vez mais numerosas. Mas isso pode levar a um isolamento igualmente prejudicial.O ministério da Saúde francês lançou nessa quinta-feira (10) uma campanha preventiva de saúde mental focada nas meninas. Os casos de depressão, ansiedade, transtornos alimentares, como anorexia e bulimia, e automutilação têm aumentado entre meninas. Esses transtornos podem evoluir na idade adulta, se não forem diagnosticados e tratados corretamente. Na campanha, o site da Seguridade Social fala explicitamente dos riscos ligados à exposição a agressões sexuais na infância. Automutilação e pensamentos suicidas em altaO boletim mensal da agência nacional de Saúde que registra as passagens em pronto-socorro psiquiátrico e os chamados de atendimento de urgência a domicílio confirma essa tendência. O levantamento de setembro, divulgado ontem, mostra que o número de consultas de adolescentes de 11 a 17 anos, que procuraram o pronto-socorro por automutilação e pensamentos suicidas, aumentou 70% em relação ao mesmo período em 2021, 2022 e 2023.Em comparação com o mês de agosto de 2024, houve 101% de aumento nas consultas por pensamentos suicidas. Um relatório publicado em maio já tinha alertado que as hospitalizações de meninas francesas com idades de 10 a 19 anos, seja por automutilação ou tentativa de suicídio, estava alcançando níveis muito preocupantes. Atendimento para adolescentesO primeiro-ministro Michel Barnier anunciou no final de setembro que queria fazer da saúde mental a "grande causa nacional" de 2025. Em discurso nesta quinta-feira na Assembleia dos Deputados, Barnier informou que pretende dobrar nos próximos três anos o número de Casas dos Adolescentes, uma estrutura multidisciplinar onde os jovens e suas famílias podem consultar um psiquiatra para uma avaliação gratuita e, em seguida, serem encaminhados para o atendimento adequado.Essas unidades ficam perto ou dentro de hospitais da rede pública. Já existem 125 estruturas desse tipo em todo o país, 13 apenas na região parisiense. Barnier disse que era preciso "acabar com a estigmatização do transtorno mental".Cerca de 13% dos franceses de 6 a 11 anos sofrem de algum tipo de transtorno mental, meninos ou meninas, e muitos deles não são tratados. A ministra da Saúde anunciou um programa de diagnóstico precoce para crianças. Os professores do ensino fundamental serão formados para detectar os sinais o mais cedo possível.
O novo primeiro-ministro francês, Michel Barnier, apresentou nesta semana seu programa de governo. Entre vários anúncios, ele previu que a grande questão da França em 2025 será a saúde mental da população, afetada por sucessivas crises, entre elas, a pandemia de Covid-19. Todos os anos, o governo francês anuncia uma questão considerada urgente no país. A escolha é feita desde 1977 por meio de um concurso público do qual do qual participam organizações e associações.Para 2025, a saúde mental foi contemplada, o que permitirá, além do debate e da apresentação de novas medidas, a difusão de uma campanha de sensibilização pelas mídias públicas francesas.O anúncio de Barnier chega em um momento em que a questão da saúde mental é considerada uma emergência. Cerca de 13 milhões de franceses sofrem de doenças psicológicas ou psiquiátricas, o que representa uma em cada cinco pessoas no país.Segundo Barnier, o foco será a prevenção e envolverá diversas instâncias: “o Estado, as administrações regionais, empresas e associações”. Para o primeiro-ministro, a saúde mental “é responsabilidade de todos”.Pandemia afetou a saúde mental dos franceses“Crises sucessivas e principalmente a da Covid-19” tiveram um impacto expressivo na saúde mental da população francesa, lembrou o primeiro-ministro. De fato, vários estudos e pesquisas relacionam a degradação do bem-estar na França como um efeito da crise sanitária.A Agência Nacional de Saúde Pública, registrou um aumento de casos de depressão durante a pandemia. A faixa etária mais penalizada foi a dos 18 aos 24 anos, que sofreu um salto de mais de 20% em episódios depressivos.Já uma pesquisa realizada na rede pública de hospitais de Paris e publicada no último 20 de setembro na revista científica Molecular Psychiatry associa casos graves de Covid-19, principalmente os que necessitaram de hospitalização, ao desenvolvimento de psiquiátricas. Cerca de 35 mil pacientes foram avaliados, entre os quais cerca de 10% foram vítimas de depressão e ansiedade após as internações.No primeiro semestre deste ano, o instituto Ipsos também quantificou a importância da saúde mental na França. De acordo com a sondagem, 55% dos franceses pensa frequentemente na questão. Um quarto da população afirma ter se sentido deprimido durante várias semanas ao menos uma vez no ano, em 2023.A pesquisa ainda mostra que a faixa etária dos 18 anos 24 anos é a que menos reage ao perceber um distúrbio mental, por não saber como agir ou a quem recorrer. Além disso, o balanço do Ispos mostra que as mulheres têm a tendência de considerar que não têm tempo para cuidar da saúde mental. Já os homens, em geral, são resistentes em buscar uma ajuda profissional por considerá-la inútil.Gastos anuais de € 23 bilhões em saúde mentalA França gasta atualmente mais de € 23 bilhões anuais no atendimento e tratamento de doenças e distúrbios psicológicos e psiquiátricos, o que representa 14% das despesas totais na saúde. Por isso, para o primeiro-ministro, a estratégia da prevenção pode resultar em economias no futuro na diminuição da quantidade de consultas médicas, hospitalizações e reincidência.As patologias psicológicas e psiquiátricas são o segundo motivo de atestados médicos atualmente nas empresas francesas. Já os afastamentos do trabalho de longa duração, superiores a um mês, estão em primeiro lugar, principalmente devido à depressão e ao burn out.A urgência e a gravidade da questão da saúde mental na França leva profissionais do setor a expressar ceticismo sobre as promessas de Barnier. Para eles, o governo deve se concentrar em quatro pontos: o fim da estigmatização das doenças mentais, a prevenção, formação de outros setores da saúde para aliviar a pressão sobre psicólogos e psiquiatras e um maior recrutamento de profissionais especializados em saúde mental.O Sindicato dos Psiquiatras de Hospitais da França afirma que 48% das vagas de profissionais especializados em saúde mental não estão ocupadas e que o setor está submerso. Ao mesmo tempo em que a quantidade de pacientes quase triplicou em pouco mais de 20 anos nos ambulatórios psiquiátricos da França, 88 mil leitos foram fechados. Nos hospitais públicos, médicos afirmam que se veem obrigados a triar pacientes para dar prioridade aos casos mais graves.
A França adotou em 2010 a primeira legislação relativa à abertura à concorrência e regulamentação do setor de jogos de azar e apostas online. Os dados oficiais de 2023, os mais recentes disponíveis, mostram que as bets e os jogos tradicionais de loteria e raspadinhas movimentaram € 13,4 bilhões no país naquele ano, cerca de R$ 81 bilhões. Desse total, R$ 15 bilhões correspondiam a apostas online. Na França, as bets são autorizadas exclusivamente para jogos esportivos, corridas de cavalos e pôquer. Outros jogos de cassino foram excluídos, uma vez que há estabelecimentos em todo o país abertos ao público maior de 18 anos. Porém, diante dos bilhões de euros movimentados nesse mercado e do aumento de pessoas viciadas em jogos de azar, em 2020, o governo francês criou uma agência da administração pública independente, a Autoridade Nacional dos Jogos (ANJ), que centraliza as licenças concedidas às empresas e controla as atividades no setor.O Estado francês fixou como objetivos de política pública dessa agência atuar na prevenção ao vício, a proteção de menores, fiscalizar a integridade das operações das plataformas, combater fraudes e outras atividades criminosas, e garantir um equilíbrio na oferta das empresas.Existem 16 plataformas cadastradas para apostas online na agência reguladora, sem contar a Francesa de Jogos (FDJ), que tem o monopólio das loterias e raspadinhas. Em todas elas, o apostador é obrigado a abrir uma conta, fornecer uma cópia da carteira de identidade com endereço, deixar um depósito e pagar com cartão de crédito. A opção de pagamento por Pix não existe na França.Há estimativas, no entanto, que apostas ilícitas movimentam anualmente de € 748 milhões a € 1,5 bilhão, algo entre R$ 4,5 e R$ 9 bilhões. Quem fatura esse dinheiro são empresas que oferecem ilegalmente jogos de cassino online, como roleta e black jack. Segundo a ANJ, ao apostar nesses sites, a metade dos clientes sequer sabe que está cometendo um delito.Especialistas dizem que as bets estão interligadas em todo o mundo. O mercado europeu representa mais de € 230 bilhões, o da China, € 1 trilhão. Para as instâncias reguladoras, é um desafio combater a atividade ilegal.Basta o apostador francês usar uma ferramenta de VPN, que protege a privacidade online, que ele vai escapar ao controle das autoridades locais e apostar em plataformas sediadas no exterior ou em paraísos fiscais, que oferecem ganhos mais atraentes do que o teto regulamentado no país. De 2022 até julho deste ano, a Autoridade Nacional dos Jogos bloqueou 300 sites por desrespeito às leis francesas.Perfil do apostador francêsUm levantamento do Observatório Francês de Drogas e outras dependências, de 2023, apontou que quase metade da população adulta francesa tinha apostado em jogos de azar nos 12 meses anteriores à pesquisa, a maioria com idades acima de 18 anos, mas um quarto dos jovens de 17 anos contaram ter feito apostas.Na França, o perfil do apostador é um homem, com idade entre 25 e 34 anos, que aposta em média € 1.982 por ano, cerca de R$ 12 mil, e perde cerca de R$ 2.100. Ou seja: o ganho cria o círculo vicioso e a pessoa volta a apostar. Oficialmente, cerca de 4 milhões de franceses apostam pelo menos uma vez por ano nas plataformas – 6% da população –, mas 1,8 milhão de franceses têm um comportamento considerado problemático em relação à compulsão pelo jogo.Entre 2022 e 2023, o número de apostadores recuou ligeiramente, mas a tendência voltou a crescer. Os dados oficiais de 2024 ainda não foram publicados, porém os especialistas já se preparam para uma provável explosão das apostas com a Eurocopa na Alemanha, em junho passado, e os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Paris. Cerca de 70% das apostas na França são relativas a jogos de futebol.O governo brasileiro levou um susto quando se deu conta, recentemente, que beneficiários do Bolsa Família têm usado o cartão de débito do programa para pagar apostas.França aumenta fiscalizaçãoO governo francês dispõe de uma Caixa de Auxílio às Famílias (CAF) para administrar a distribuição dos recursos dos programas sociais à população. Os benefícios são variados, vão da renda mínima à ajuda para pagar o aluguel, em função da renda. Geralmente, os depósitos são realizados nas contas bancárias dos beneficiários. Uma vez que o dinheiro é depositado na conta da pessoa, ela pode fazer o que quiser com os recursos. Porém, as denúncias de fraudes ao sistema social francês levaram o governo a tentar limitar os prejuízos. Para evitar abusos, a administração tem multiplicado a fiscalização, que inclui visitas mais frequentes do beneficiário às agências da CAF para apresentação de comprovantes. No caso das pessoas que têm direito a um benefício para pagamento de parte do aluguel, por exemplo, sempre que possível o crédito do governo é feito diretamente na conta bancária do proprietário do imóvel, para evitar que o dinheiro seja gasto de outra forma.
Há três semanas, a cidade de Avignon, no sul da França, foi invadida por jornalistas do mundo inteiro. O chamado “processo de Mazan”, sobre múltiplos estupros organizados pelo marido da vítima, Gisèle Pelicot, sedada durante os atos, suscita forte interesse da imprensa internacional. Daniella Franco, de Paris“A França confronta o horror do caso de estupro e sedação” é a manchete de um suplemento especial do jornal americano New York Times. Como o célebre diário, outros grandes veículos, como o britânico The Guardian, o espanhol El País, e a revista alemã Der Spiegel, enviaram repórteres para acompanhar o julgamento.A intensa e diária cobertura das mídias internacionais intriga até mesmo a imprensa francesa. A emissora BFMTV entrevistou jornalistas estrangeiros que acompanham o julgamento que evocam não apenas os fatos chocantes do “processo de Mazan”, mas também a coragem da vítima, Gisèle Pelicot, de 72 anos, e o intenso debate que o caso suscita sobre a luta contra a cultura do estupro.No total, 36 mídias foram credenciadas para fazer a cobertura dentro do tribunal de Vaucluse, em Avignon. Dezenas de outros repórteres sem autorização de acompanhar os bastidores do julgamento se posicionam nos arredores do local, na expectativa de obter uma declaração, um vídeo ou uma foto da francesa que se tornou um símbolo contra as agressões sexuais às mulheres.Nas agências de fotografias internacionais, Gisèle aparece sempre cercada por dezenas de microfones. Com uma expressão segura e um andar calmo, ela encara as câmeras em algumas ocasiões, concede entrevista ao lado de seus advogados e agradece o apoio de militantes incansáveis que a aguardam durante as longas horas de audiência.Para o jornal Libération, parte da fascinação da mídia estrangeira com o caso é alimentada pela figura da septuagenária, “uma mulher admirável que muitos não hesitam em classificar de heroína”. Já o diário americano The Washington Post explica, em uma matéria, que não tem o hábito de revelar os nomes das vítimas de crimes sexuais, mas “nesse caso preciso, ela pediu para ser identificada com o seu sobrenome de casada, Gisèle Pelicot”. Além disso, reitera, “a vítima pediu que o processo ocorresse em audiência pública porque ela queria que o mundo soubesse o que lhe aconteceu”.“É preciso perguntar aos jornalistas ausentes porque não vieram”, diz Catherine Porter, repórter do The New York Times ao ser questionada pela rádio francesa RMC sobre o interesse internacional sobre o caso. Já para o jornalista espanhol Enric Bonet, o julgamento “mexe com o nosso interior” e “mobiliza a sociedade”.Fatos chocantes“Tudo nesse caso fascina as mídias”, observa o jornal francês Libération. Para o diário, o principal interesse se dá pelo choque com os fatos: um idoso que drogou sua esposa durante dez anos, após quatro décadas de casamento, para estuprá-la e oferecê-la ser violentada inconsciente por dezenas de desconhecidos.Muito além de retratar os atos de Dominique Pelicot e as dezenas de outros acusados, a imprensa internacional ainda convida à reflexão. A revista alemã Der Spiegel refuta a utilização da palavra “monstro” para se referir ao ex-marido de Gisèle. “Seria bem mais preocupante admitir que os estupradores estão todos grudados no tecido social contínuo da misoginia banalizada”, publica.Já o diário El País convida os leitores a considerar a simplicidade da origem do caso: um marido que estupra a esposa. Por causa das perdas de memória resultantes da ingestão de altas e frequentes doses de ansiolíticos, Gisèle chegou a cogitar que estava sofrendo de Alzheimer ou que poderia ter um tumor no cérebro. “Mas se tratava de algo ainda mais sinistro: um marido”, diz o jornal espanhol.Relembre o caso“O processo de Mazan” - em referência à cidade no sul da França onde Gisèle e Dominique Pelicot viviam e os estupros ocorriam - teve início em 2 de setembro. A previsão é que ele dure até 20 de dezembro, tamanha a gravidade e complexidade do caso. O julgamento ocorre no tribunal de Vaucluse, em Avignon.No total, 50 homens estão sendo julgados – entre eles, o ex-marido de Gisèle, Dominique Pelicot, de 71 anos – e outros 49 homens que foram recrutados por ele para estuprar a sua então esposa. A francesa era sedada com altas doses de ansiolítico, chegou a procurar médicos por problemas de memória, por contrair doenças sexualmente transmissíveis e dores nas partes íntimas, mas jamais suspeitou dos estupros.A polícia francesa contabilizou cerca de 200 estupros, que ocorreram de julho de 2011 a outubro de 2020. Destes, 92 foram cometidos por 50 homens que puderam ser reconhecidos e são julgados atualmente. Outros 29 potenciais estupradores não puderam ser identificados.Um acusado, Jean-Pierre M, de 63 anos, está sendo julgado nesse mesmo processo por estupro de sua esposa. O sexagenário conheceu Dominique Pelicot em um site pornográfico que o instruiu sobre o modus operandi da sedação e estupros de Gisèle. Ambos são acusados de dopar e violar a esposa de Jean-Pierre em ao menos 12 ocasiões.A principal vítima do processo Mazan, Gisèle Pelicot depôs na primeira semana do julgamento e voltou a falar na quarta-feira (18), quando foi interrogada pela defesa do ex-marido. Os advogados usam o argumento de que a vítima estaria consciente durante “os atos sexuais”, uma alegação que a septuagenária considera “humilhante”.Dominique Pelicot, principal acusado, testemunhou pela primeira nessa semana e admitiu ser um “estuprador”, “como todos os outros” no tribunal. Sua defesa tem a estratégia de tentar dividir a responsabilidade dos atos com os outros acusados.Nessa semana também tiveram início os depoimentos dos co-acusados no caso. O primeiro deles, Lionel, de 44 anos, reconheceu jamais ter obtido o consentimento de Gisèle, mas afirma não ter consciência de ter praticado um estupro.Os homens julgados têm idades que vão dos 26 aos 73 anos, pertencem a classes sociais variadas e executam diversas profissões – jardineiro, bombeiro, pedreiro, enfermeiro, engenheiros, aposentados, militares e um é jornalista. A maioria deles não tem antecedentes criminais, boa parte é casado e tem filhos.Todos os acusados podem ser condenados a até 20 anos de prisão.
A prefeitura de Paris adota há vários anos um conjunto de políticas públicas de combate à poluição e incentivo à mobilidade sustentável que têm melhorado a qualidade de vida dos parisienses e visitantes. Em várias ocasiões, as propostas das autoridades municipais geraram resistência, mas diante da atual emergência climática, a maioria dos franceses estão convencidos da necessidade de adaptação. A principal fonte de poluição atmosférica e sonora em Paris vem do trânsito, que gera concentração de gases poluentes e partículas finas. Segundo estudos científicos, as fontes secundárias de poluição na região metropolitana da capital são o aquecimento doméstico no inverno – lareiras, caldeiras a gás ou à base de óleo combustível –, a atividade industrial e obras da construção civil.Com o aumento das temperaturas gerado pelo aquecimento global e períodos de seca prolongados, nos meses do verão aumentaram os picos de poluição provocados pela concentração de dióxido de nitrogênio (NO2) no céu da cidade. Este subproduto da queima de combustíveis é extremamente tóxico, de acordo com especialistas.Uma das primeiras medidas adotadas em Paris para reduzir a circulação de carros foi a criação do sistema de bicicletas de aluguel. A França tinha um atraso nessa área em relação aos países nórdicos, à Holanda e Alemanha.O sucesso das bicicletas de locação obrigou o município a construir quilômetros de ciclovias e a impor uma faixa para ciclistas na contramão das ruas estreitas de Paris. O incentivo ao uso da bicicleta tem o apoio de subsídios do Estado, que distribui cheques em dinheiro aos cidadãos para financiar parte do preço de uma bicicleta elétrica. A troca de carros a gasolina ou diesel por automóveis híbridos ou elétricos também é facilitada pelo governo.Bicicleta supera carrosUm estudo do Institut Paris Région (IPR), publicado em abril, mostrou que a bicicleta superou o carro como meio de locomoção em Paris, e agora só fica atrás do transporte público e da caminhada. Cerca de 66% dos parisienses usam o metrô, ônibus e as linhas de veiculos leves sobre trilhos para se deslocar na cidade; 5,5% adotaram a caminhada.Outra medida que o município tem instituído é o fechamento de dezenas de ruas e vias expressas aos carros de passeio. Houve uma inversão das prioridades de circulação: primeiro pedestres, depois bicicletas, ônibus e táxis.Calçadões e vegetalizaçãoO programa chamado "Ruas para crianças", onde ficam escolas, ampliou as áreas de calçadão e abriu espaço para a criação de jardins. Além de favorecer a segurança dos alunos, a vegetalização do que antes era asfalto usado por carros, agora participa do combate à poluição e melhora o nível de umidade do ar. Paris já tem 200 'ruas para crianças' e o objetivo é chegar a cerca de 600 no futuro.A capital francesa sempre teve ruas exclusivas para pedestres, no centro dos bairros, dedicadas ao comércio de comida – açougue, padaria, peixaria, queijaria, venda de frutas e legumes, cave de vinhos – ou à feira semanal. Este modelo está se propagando para ruas de lojas, cafés e restaurantes. Nos fins de semana, a cidade se torna uma imensa área de lazer.A implantação de rodízio é rara em Paris, apenas quando os níveis de concentração de ozônio (dióxido de nitrogênio) atingem um patamar que requer a medida drástica para diminuir o número de carros nas ruas.Selo em carro indica nível de emissões Por outro lado, desde 2017, a prefeitura adotou um selo de controle de emissão de poluentes, baseado em uma escala de 0 a 5, que ajuda no controle da poluição e contribui para a melhoria da qualidade do ar. O zero nesta escala corresponde aos veículos elétricos e movidos a hidrogênio, ou seja os menos poluentes, enquanto 4 e 5, os mais tóxicos, só têm autorização para entrar na cidade em algumas ruas e horários específicos. O motorista deve exibir esse selo no para-brisa do veículo. Essa medida obrigou muita gente a trocar de carro ou a desistir do automóvel, e paralelamente as ruas foram cedendo espaço às ciclovias.Em Paris, não existem áreas de estacionamento gratuito. Quando há um pico de poluição, a prefeitura autoriza o estacionamento gratuito para quem tem carro, mas exclusivamente na porta de casa. O município também declarou guerra contra os carros SUV, mais poluentes. Eles pagam 18 euros a hora de estacionamento na via pública, cerca de 110 reais, contra 15 reais para um carro de porte menor.Em todo o país, os veículos de menos de 3,5 toneladas são obrigados a passar por um controle técnico em oficinas especializadas a cada dois anos para verificar o estado dos filtros antipoluição, do óleo do motor, freios e faróis, a partir do terceiro ano depois da compra. A multa por falta de inspeção técnica é de 135 euros, cerca de 830 reais.Reduzir velocidade diminui poluiçãoNesta semana, a prefeita Anne Hidalgo anunciou que a partir de 1° de outubro, a velocidade no anel viário que circunda a capital, chamado periférico, muito utilizado pelos motoristas provenientes das periferias, vai ter a velocidade máxima reduzida de 70 km/h para 50 km/h.Uma pesquisa feita com motoristas logo após o anúncio da medida indicou que 92% dos entrevistados na região são contra a decisão da prefeita. Hidalgo alega que 82% dos motoristas circulam sozinhos nos carros no periférico. Além de reduzir a velocidade máxima, a socialista quer dedicar uma das três faixas do anel viário a táxis, ônibus e carros com pelo menos dois passageiros, além do motorista.Estudos científicos comprovam que reduzir a velocidade diminui a emissão de poluentes. Em Paris, ruas não comerciais, estritamente residenciais, já tiveram a velocidade limitada a 30 km/h em vários bairros.O caso do periférico é uma luta histórica contra a poluição e divide opiniões. Cerca de 1,2 milhão de motoristas utilizam a via diariamente. Mas a poluição gerada pelo tráfego constantemente carregado, à exceção da madrugada, está acima das normas recomendadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Os 120 mil moradores residentes a 200 metros do anel viário têm mais doenças provocadas pela poluição do que outros cidadãos.Desde 1993, a velocidade no periférico baixou de 90 km/h para 80 km/h. Depois, em 2014, passou para 70 km/h e agora vai cair para 50 km/h. É uma medida de bom senso em saúde pública, mas que enfrenta resistência de moradores das periferias e também do Ministério dos Transportes.Os motoristas que dependem do periférico para trabalhar criticam a guerra da prefeita de Paris contra os carros. Fora da capital, ainda há uma dependência do automóvel porque a rede de metrô e trens de subúrbio é insuficiente. Dependendo de onde a pessoa mora, só é possível chegar em Paris de carro. Mas o Estado e a região Ile de France estão investindo bilhões de euros na construção de quatro linhas de metrô para otimizar a conexão de munícipios vizinhos à capital e inaugurou recentemente sete estações na extensão da linha 14. Quando este projeto chamado Grand Paris Express for concluído, a região metropolitana terá 68 novas estações de metrô.Investir em transporte público é fundamentalO transporte público é um elo essencial na articulação de outras políticas de incentivo à mobilidade sustentável, para reduzir a poluição nas grandes cidades. Mas não é o único elemento dessa equação. Tem de haver vontade política, continuidade e planejamento de longo prazo para fazer a revolução que Paris atravessa atualmente.
A Paralimpíada de Paris é palco de um debate primordial para as pessoas com deficiência. Muitos atletas paralímpicos estão rejeitando e rebatendo clichês e eufemismos, como a comparação a super-heróis. Daniella Franco, da RFIO debate teve início após declarações do campeão olímpico de judô francês Teddy Rinner, que comparou os esportistas paralímpicos aos Avengers, personagens da Marvel. “Eles têm uma deficiência que já é muito difícil de viver e eles conseguem fazer coisas inacreditáveis”, afirmou em entrevista à emissora de rádio e TV belga RTBF.Alguns dias depois, em entrevista à rádio francesa RTL, junto com a estrela do atletismo francês Marie-José Pérec, Rinner voltou a usar o mesmo tom para se referir aos esportistas paralímpicos. “Com uma deficiência, são eles os verdadeiros campeões”, afirmou o judoca. “O que as pessoas não entendem é que nós olhamos os paratletas dizendo que são nossos heróis porque nós sabemos o que é treinar todos os dias”, completou Pérec.A reação não demorou a chegar. O jogador francês de basquete em cadeiras de rodas, Sofyane Mehiaoui usou suas redes sociais para protestar: “não somos super-heróis, somos atletas”. Em seus stories, o esportista ainda deixou uma mensagem direta a Rinner, pedindo para o judoca deixar de “superexpor” as pessoas com deficiência. “É preciso que você pare de falar da gente desta forma, você não está nos ajudando”, sublinhou.Em sua conta no Instagram, Mehiaoui ainda publicou uma charge do ilustrador francês DAVMVP, em que o super-homem é representado jogando basquete em uma cadeira de rodas. Visivelmente enfrentando dificuldades, o personagem diz: “não é tão simples assim ser atleta”. Junto da imagem, o jogador de basquete escreveu: “É preciso ser o melhor em quadra, mas também combater os preconceitos”.Foco no desempenhoNessa primeira semana de Jogos Paralímpicos, a mobilização se reforçou. Vários atletas se manifestaram em prol da mesma causa, como a triatleta Nantenin Keita, porta-bandeira da França na cerimônia de abertura.Em uma entrevista ao jornal francês Libération, Keita fez um apelo ao público para que se “coloque de lado o aspecto patológico da deficiência” e o foco seja no desempenho dos esportistas paralímpicos.A imprensa francesa ajuda a propagar esse discurso. O jornal esportivo L'Équipe publicou nesta semana um editorial intitulado “Heróis como os outros”. O texto diz que antes de se falar em Paralimpíada é preciso escutar o que os atletas paralímpicos têm a dizer.“O que eles nos dizem? Que eles são esportistas de alto nível como os outros e que é preciso deixar de lado esse olhar capacitista para nos concentrarmos em seus desempenhos”, reitera o editorial do L'Équipe.Outro jornal francês, o Le Parisien, publicou uma edição inteira ontem falando da abertura dos Jogos Paralímpicos e um editorial com o título “Como todo mundo”, que é como os atletas paralímpicos querem ser considerados. Por isso o Le Parisien pede que a gente valorize os desempenhos e torça pelos esportistas que disputam a Paralimpíada como a gente faz com qualquer outro esportista.Acessibilidade de ParisOs Jogos Paralímpicos de Paris também suscitaram um debate sobre a acessibilidade da capital francesa. A cidade, que passou por uma grande renovação e realizou muitas reformas para acolher as competições e o público, está longe de ser uma referência de mobilidade.As principais críticas se concentram no metrô de Paris. Apenas 14% das estações de metrô de Paris são consideradas totalmente acessíveis e muitas não têm equipamentos básicos, como elevadores, o que interfere demais no cotidiano de quem têm mobilidade reduzida.Por isso, as autoridades pensaram em soluções mais imediatas para esse período de Jogos. Por exemplo, 100 minivans adaptadas foram mobilizadas pela administração da grande região parisiense para o transporte de pessoas com deficiência até os locais de competição.Mas nem todos puderam se beneficiar dessa alternativa. Durante a Olimpíada, por dia, 4 mil cadeirantes acessaram os locais de provas. Nos Jogos Paralímpicos, a estimativa é que 2,5 mil usuários de cadeiras de rodas frequentem por dia as competições.Outro questionamento é sobre o legado dos Jogos Paralímpicos. Atualmente, na grande região parisiense, há quase cinco milhões de pessoas em situação mobilidade reduzida, entre elas 62 mil cadeirantes. Cerca de € 1,5 bilhão está sendo investido na rede férrea de transportes de Paris para torná-la 100% acessível às pessoas com deficiências, mas calcula-se que essas reformas devem durar entre 15 e 20 anos.
Depois de duas semanas de calmaria após o fim dos Jogos Olímpicos, Paris volta a um ritmo bem mais movimentado neste fim de semana. A cidade comemora com cerimônias militares e programação cultural os 80 anos da libertação das tropas nazistas e acolhe, no domingo (25), a tocha paralímpica. Em 25 de agosto de 1944, o general Charles De Gaulle leu para os parisienses o ato de capitulação do Exército nazista e desceu triunfante a avenida Champs-Elysées, onde os franceses se reúnem para as principais comemorações nacionais. Era o fim de quatro anos de sofrimento e humilhação impostos pela Alemanha nazista.A data histórica, em meio aos Jogos Olímpicos e Paralímpicos ausentes da capital durante 100 anos, terá dois dias de intensas celebrações. Várias festas de rua estão programadas. Em frente à prefeitura, no sábado (24), haverá projeção de um documentário com depoimentos de pessoas que viveram a reconquista da liberdade em 1944, como o sociólogo Edgar Morin, que está com 103 anos; também está previsto um concerto de orquestra seguido de um grande baile popular, como aconteceu na época, mas agora animado com música eletrônica e funk.Como este ano Paris ainda abre na quarta-feira (28) os Jogos Paralímpicos, as duas programações foram entrelaçadas. A tocha paralímpica chega à capital no domingo (25), proveniente da Inglaterra, para marcar a data.Tocha será acesa na InglaterraEnquanto a Grécia Antiga é o berço dos Jogos Olímpicos, os Paralímpicos têm uma história mais recente. Quando a Segunda Guerra acabou na Europa, havia milhares de pessoas amputadas, paraplégicas, vítimas de múltiplas deficiências.Em 1948, o médico alemão Ludwig Guttmann, neurologista do hospital militar de Stoke Mandeville, perto de Londres, teve a ideia de criar uma competição esportiva para ajudar na recuperação de soldados e vítimas de guerra atendidos no hospital onde trabalhava. Veteranos de cadeiras de rodas disputaram vários jogos. Nos anos seguintes, a iniciativa inovadora se repetiu. Este torneio único passou a ser considerado como a origem dos Jogos Paralímpicos.Assim, a tocha paralímpica será acesa neste sábado (24) em Stoke Mandeville, na presença de Tony Estanguet (presidente do Comitê Organizador) e Andrew Parsons (presidente do Comitê Paralímpico Internacional). No domingo, ela atravessa o Canal da Mancha, passa por Paris, para comemorar os 80 anos da libertação da capital, e segue para cerca de 50 cidades francesas, retornando na quarta-feira (28) para acender a pira olímpica no Jardim das Tulherias.Para alegria dos franceses e turistas, o balão de ar quente que se tornou o símbolo dos Jogos de Paris voltará a subir todas as noites até o encerramento, no dia 8 de setembro.França tenta recuperar atraso A França esteve atrasada no investimento em seus atletas paralímpicos. Para se ter uma ideia, o Brasil conquistou na última edição, em Tóquio (2020), 72 medalhas no total (22 de ouro), a mesma quantidade obtida nos Jogos do Rio 2016. A França conquistou 54 medalhas no Japão e apenas 28 no Rio de Janeiro.Com a perspectiva dos Jogos em Paris, o Estado investiu, mas os atletas continuam se queixando de custos muito mais elevados de equipamentos – próteses ou cadeiras de rodas adaptadas – e da falta de patrocinadores. As associações que trabalham na área veem uma melhora, já que dos 237 atletas franceses em busca de medalhas, 121 disputam os Paralímpícos pela primeira vez. A mais nova concorrente, promessa no atletismo, Marie N'Goussou, tem 15 anos. O objetivo do comitê francês é conquistar 20 medalhas de ouro, para ficar entre as oito principais nações paralímpicas.A Agência Nacional do Esporte mobilizou empresas como a Airbus, por exemplo, para criar equipamentos de alta tecnologia, como próteses de corrida e bicicletas, para ajudar no desempenho dos atletas franceses, o que deve dar resultados. Mas é sempre a mesma problemática: para quem já é medalhista, é mais fácil encontrar patrocínio privado do que para iniciantes.Parisienses voltam para casaCerca de 90% do público dos Jogos Paralímpicos será francês e desse total 75% de moradores da região parisiense. As férias de verão terminam na semana que vem, e o retorno das aulas acontece no dia 2 de setembro. Até a última quarta-feira (21), dos 2,5 milhões de ingressos colocados à venda, 800 mil ainda estavam disponíveis, segundo os organizadores.As arenas mais bonitas da cidade, com vista para a Torre Eiffel, na praça da Concórdia ou no Grand Palais, são as que têm maior procura do público, com ingressos quase esgotados. Os que sobraram têm os preços inflacionados.Das 22 modalidades da Paralimpíada, 10 venderam 90% dos ingressos; outras 15 estão com uma ocupação de 75% das arquibancadas. Os organizadores reservaram 80 mil ingressos para cadeirantes e portadores de outras deficiências, mas só venderam até quarta-feira 31 mil entradas.Problemas de mobilidadeOs Jogos Paralímpicos sempre têm público menor do que a Olimpíada. Mas no caso de Paris, o sistema de transporte pode ser um agravante.O metrô de Paris é considerado uma “corrida de obstáculos” para cadeirantes. A região de Ile de France, responsável pela oferta do transporte público na capital e arredores, investiu mais de € 2 bilhões para facilitar o acesso às linhas de metrô, ônibus e trens. Mas, atualmente, das 320 estações do metrô de Paris, que tem mais de um século, apenas 29 são acessíveis às pessoas com deficiência físico-motora. O número representa apenas 9% da rede.Questionadas sobre esse atraso, as autoridades alegam que as obras de modernização do velho metrô de Paris são muito caras e dão o exemplo da linha 6, uma das mais antigas da cidade. As obras de adaptação dessa linha para cadeirantes têm custo estimado de € 1 bilhão e de seis a dez anos de prazo para a conclusão da reforma.Diante do custo elevado, houve uma escolha do poder público. Os investimentos foram direcionados para a rede ferroviária da região metropolitana de Paris, com trens que também circulam na capital, e tem agora 240 das 268 estações acessíveis a todo tipo de usuário. A oferta é complementada por 65 linhas de ônibus, totalmente adaptadas a pessoas com mobilidade reduzida.Portadores de Síndrome de Down lançam petiçãoA poucos dias do início dos Paralímpicos, portadores de Síndrome de Down iniciaram um movimento de reivindicação para o Comitê Olímpico Internacional (COI). Integrantes do Conselho Municipal de Jovens de Mornant, no sudeste da França, que tem alguns membros com Down, consideram injusto que o COI ofereça apenas três modalidades para pessoas com deficiência intelectual nos Paralímpicos – natação, atletismo e tênis de mesa.Esse grupo lançou uma petição pública e espera recolher 500 mil assinaturas para alertar o COI que portadores de Síndrome de Down têm capacidade para praticar outros esportes de alto nível e poderiam ser incluídos nas competições. De certa forma eles têm razão, já que dos 4.400 atletas que vão disputar os Paralímpicos de Paris 2024, apenas 5% são pessoas com deficiência intelectual.
Paris está nas nuvens com a realização de uma Olímpíada que superou as expectativas. A capital francesa entrou na contagem regressiva agora para os Jogos Paralímpicos, daqui a menos de duas semanas. Daniella Franco, da RFIPassadas as dúvidas sobre a capacidade de Paris de acolher um evento da magnitude dos Jogos Olímpicos, a pressão na cidade é menor em relação à Paralimpíada. A capital francesa já iniciou a contagem regressiva para o evento que ocorre do dia 28 de agosto até 8 de setembro.Paris dá espaço novamente às obras, mas não tantas como as que ocorreram para os Jogos Olímpicos. Vários locais de competição serão mantidos e outros serão adaptados. É o caso da belíssima arena da Torre Eiffel, que acolheu o vôlei de praia, e que está sendo modificado para as competições de futebol para pessoas com deficiência visual.Segundo os organizadores, o maior desafio será transformar os quatro espaços de competição erguidos na Praça da Concórdia, no centro de Paris, para o ciclismo BMX freestyle, para o skate, o breaking e o basquete 3x3. Nessa mesma região estão sendo instaladas as arquibancadas ao público que assistirá à cerimônia de abertura dos Jogos Paralímpicos.Desfile de atletas na Champs-ElyséesOs segredos da cerimônia de abertura dos Jogos Paralímpicos são mantidos a sete chaves, mas a promessa é de ser tão vanguardista quanto o evento que deu início à Olimpíada, no último 26 de julho. A concepção da festa é novamente assinada pelo consagrado diretor de teatro Thomas Jolly, que escolheu, mais uma vez, usar o belo cenário da capital francesa como pano de fundo.Desta vez, o desfile das delegações de atletas ocorrerá na avenida Champs-Elysées, chamada de “o coração de Paris”, que liga a Praça da Concórdia ao Arco do Triunfo. Jolly revelou nessa semana à rádio francesa RTL que o espetáculo será concentrado nos corpos dos paratletas, “para mudar o olhar da sociedade sobre as pessoas com deficiência”.A exemplo da abertura e do encerramento dos Jogos Olímpicos, um repertório musical francês embalará a festa, para valorizar a produção musical nacional. O diretor artístico de Paris 2024 promete “uma grande festa no coração da cidade” no dia 28 de agosto às 20h de Paris (15h em Brasília).Venda de ingressosO Comitê de Organização dos Jogos Paralímpicos anunciou nesta quarta-feira (14) que metade dos ingressos para os eventos paralímpicos já foi comprada. O ritmo de vendas é cinco vezes maior do que duas semanas antes dos Jogos Olímpicos de Paris, o que mostra que a capital francesa ainda está no clima das competições.Além disso, os Jogos Paralímpicos também coincidem com o fim do período férias de verão, por isso os parisienses estarão em peso de volta à capital francesa. Os preços dos ingressos também são muito mais acessíveis do que as entradas para os Jogos Olímpicos.Bilhetes para as competições da Paralimpíada podem ser comprados por valores a partir de € 15 (equivalente a R$ 90). Nos Jogos Olímpicos, o preço mais baixo dos ingressos foi de € 24 (cerca de R$ 145), embora as entradas a esse preço tenham sumido logo nas vendas dos primeiros lotes.Já para a cerimônia de abertura, os preços são mais altos, a partir de € 450 (cerca de R$ 2,7 mil). No entanto, o valor ainda é bem distante dos preços da cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos, no último 26 de julho, que custaram entre € 990 e € 12 mil (ou seja, entre R$ 6 mil e R$ 71 mil.O que também ajuda na empolgação à espera dos Jogos Paralímpicos é a intensa programação em 26 fan zones, que seguem abertas. Esses espaços de encontro e comemoração de torcedores propõem, até o dia 28 de agosto, uma série de atividades culturais e esportivas, como aulas de esportes paralímpicos.Desta forma, o público pode conhecer algumas das 22 modalidades esportivas da Paralimpíada. Apesar disso, os Jogos Paralímpicos contarão com 220 partidas a mais que a Olimpíada: uma oportunidade ainda maior de assistir a eventos esportivos e prestigiar os paratletas.
Agora é oficial e foi dada a largada da contagem regressiva para os Jogos Olímpicos de Paris! A cerimônia de abertura acontece na próxima sexta-feira (26), daqui a exatamente uma semana. Entre entusiasmo e ansiedade, a capital francesa entra no clima do evento, mas teme desorganização e atentados terroristas. Daniella Franco, da RFI“Você comprou ingresso para qual modalidade?”: a pergunta passou ser ouvida frequentemente nas ruas de Paris nos últimos dias. No entanto, a população francesa não é a mais entusiasmada com os Jogos Olímpicos. Uma pesquisa do instituto Ipsos para o jornal La Tribune, no mês de abril deste ano, mostrava que apenas 53% da população se dizia interessada pelo evento. Entre os entrevistados, 35% se declaravam indiferentes e 33% preocupados.Apesar das construções e preparativos que se intensificaram nos últimos meses, a uma semana do início dos Jogos Olímpicos, a vida dos moradores de Paris começa a ser verdadeiramente impactada. Durante a semana, algumas estações de metrô nos arredores do rio Sena, na região onde ocorrem a cerimônia de abertura e algumas competições, foram fechadas, perturbando a circulação na capital francesa. Na quinta-feira (17), barreiras foram instaladas para impedir o trânsito nas pontes que ligam os dois lados de Paris.Nos cais e em algumas das ruas que cercam o rio Sena, dois perímetros de segurança – a zona cinza e a vermelha – também foram ativadas, com controle da circulação. Moradores, trabalhadores e turistas que não requisitaram o passe eletrônico em forma de QR code para o acesso a essas áreas expressaram sua indignação com o sistema.O subprefeito de Paris, David Belliard, chegou a pedir formalmente à Secretaria de Segurança Pública da capital francesa para retirar alguns dos bloqueios e “permitir, quando possível, uma melhor circulação e segurança de pedestres e ciclistas”. O ecologista reclama principalmente que, entre as cerca de 44 mil barreiras colocadas nas calçadas e nas ruas, algumas impedem a utilização das pistas de bicicleta construídas especialmente para os Jogos Olímpicos.De fato, a capital francesa está irreconhecível. Em vários pontos turísticos, como a Praça da Concórdia, a Ponte Alexandre III e a própria Torre Eiffel, estruturas e arquibancadas foram erguidas. A transformação desagrada alguns parisienses e turistas, como Thiong Tran, moradora de Seine-Saint-Denis, na periferia, que gostaria de mostrar a capital para a família que veio da Polônia visitá-la. “Não sei nem mesmo se vamos conseguir fazer o passeio que planejamos no rio Sena”, lamenta.A partir do final da manhã deste sábado (20), nem barcos turísticos, nem navios de transporte de mercadorias e alimentos poderão circular no Sena até a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos. Apenas as embarcações que participam dos ensaios para o evento é podem ter acesso ao rio parisiense.15 milhões de turistas em ParisCerca de 15 milhões de turistas são esperados em Paris para o período dos Jogos Olímpicos. Nas ruas da capital francesa já é possível perceber um aumento da afluência de visitantes.No entanto, organizações que representam comerciantes, proprietários de restaurantes, bares e clubes apontam para “uma queda inédita na frequentação” de 30%, em relação aos anos anteriores. Em um comunicado conjunto de vários setores divulgado nesta sexta-feira, eles criticam “o pesado esquema de segurança” dos Jogos Olímpicos que estaria espantando os frequentadores.Segundo o informe, a situação é pior nos estabelecimentos próximos aos eventos olímpicos. Restaurantes perto da torre Eiffel – que acolhe o show da cerimônia de abertura e algumas competições – chegam a registrar uma diminuição de 70% do público.“Se garantir a segurança dos visitantes dos Jogos Olímpicos é uma prioridade absoluta, deploramos a falta de esclarecimentos e de informação da parte das autoridades públicas sobre essas restrições. Nossos estabelecimentos precisam de antecipação e organização para que possam se preparar serenamente”, afirma o comunicado.Ao contrário do previsto, a rede hoteleira também não está esgotada. Muitos estabelecimentos realizam promoções de última hora para tentar atrair a clientela.Em entrevista ao site econômico francês Capital, Frank Delvau, presidente da União das Profissões e das Indústrias de Hotelaria da Região Parisiense, classifica a situação de “catastrófica”. Segundo ele, devido ao rígido esquema de segurança e às dificuldades de circulação na capital, a taxa de frequentação dos hotéis em Paris não ultrapassa 55% nas próximas semanas.Quem também terá de lidar com o público abaixo do esperado é o próprio Comitê de Organização dos Jogos Olímpicos. A poucos dias do apito inicial, cerca de um milhão de ingressos não foram vendidos. Entre eles, 50 mil entradas para partidas de futebol, basquete e competições de atletismo.O principal motivo foi o preço das entradas. Os ingressos para algumas modalidades, como ginástica artística, foram disponibilizados a algumas centenas de euros. No site oficial do evento, milhares de espectadores também revendem bilhetes a valores mais acessíveis.Temor de atentados terroristasParis foi palco de três incidentes violentos nos últimos dias, o que preocupa os organizadores dos Jogos, autoridades locais, moradores e visitantes.Um policial foi esfaqueado na quinta-feira perto da avenida Champs-Elysées, uma pessoa morreu e seis ficaram feridas na colisão de um carro contra um bar do leste de Paris na quarta-feira (16) e um soldado da operação antiterrorismo foi atacado na estação de trem Gare de l'Est na segunda-feira (15).A polícia francesa descartou que qualquer um desses incidentes tenham tido motivação terrorista. Os três homens autores desses ataques tinham antecedentes psiquiátricos.No entanto, segundo a rádio France Inter, o risco de um atentado jihadista durante os Jogos é alto. O maior temor é sobre a ação dos chamados “lobos solitários”, que agem sozinhos, sem um grupo ou comando principal.Sob anonimato, uma fonte próxima dos serviços de inteligência da França afirmou à rádio que cerca de 12 ordens de ataques do grupo Estado Islâmico foram registradas vindas na zona turco-síria.O esquema de segurança de Paris 2024 é imenso: 35 mil policiais e 18 mil militares estarão mobilizados durante os 12 dias do evento. Há ainda 1,8 mil agentes de segurança vindos de 43 países para apoiar as forças francesas, inclusive do Brasil. A Polícia Federal brasileira enviou 20 agentes para a França para atuar em três principais frentes: segurança pública, troca de informações, e inteligência para prevenção ao terrorismo.Pane informática no sistema da Paris 2024Uma pane informática de grandes proporções afetou o funcionamento de diversos serviços e aeroportos pelo mundo nesta sexta-feira (19). O transporte ferroviário, empresas de telecomunicações, bancos, veículos de comunicação e até o sistema dos Jogos Olímpicos de Paris foram atingidos.Segundo o Comitê de Organização da Paris 2024, o problema afetou todos os seus servidores, mas o impacto foi “limitado”. O principal problema ocorreu na entrega de credenciais e dos uniformes dos atletas, o que atrapalhou a chegada de algumas delegações na Vila Olímpica nesta sexta-feira.O comitê informou ter ativado planos de emergência para minimizar os problemas, com a mobilização de todas as suas equipes de informática. No final da tarde, o sistema voltou inteiramente ao normal, com a previsão de que o centro de distribuição de credenciais e uniformes fique aberto até 23h pelo horário de Paris.Aliviado, o chefe do Comitê de Organização, Tony Estanguet, comemorou o fato de ter escapado de uma catástrofe. “Claro que não poderíamos nos preparar para essa pane mundial a alguns dias do início dos Jogos”, afirmou.
Depois de percorrer a França e ser vista por 4 milhões de pessoas, a tocha olímpica chega a Paris neste domingo, 14 de julho, para dois dias de revezamento nos 20 distritos da capital. Como é o dia da festa nacional francesa, os eventos foram entrelaçados: o tradicional desfile militar acontece durante a manhã, o revezamento dos atletas com a tocha começa logo depois e vai até a noite, quando o céu da capital será iluminado pelo esperado espetáculo de fogos de artifício na Torre Eiffel. A tocha fará um circuito de 31 km nesse primeiro dia, passando por monumentos históricos e culturais, como as sedes da Assembleia Nacional e do Senado, o Panteão, a universidade Sorbonne, a catedral de Notre Dame, a praça da Bastilha, o Jardim de Marielle Franco e o Museu do Louvre, entre outros cartões postais da cidade.O ponto de partida será na avenida Champs-Elysées às 12h50 em horário local (7h50 em Brasília) e quando forem 23h, a tocha encerrará o trajeto na sede da prefeitura de Paris. No dia seguinte, segunda-feira, 15, o revezamento percorre outras áreas famosas da capital. Ao todo 540 atletas vão participar dos dois dias de revezamento. Marielle Franco será homenageada no trajeto da tochaEm vários pontos por onde a tocha olímpica irá passar, a prefeitura de Paris programou atividades – shows de música, performances, jogos e manifestações artísticas. No Jardim de Marielle Franco (10° distrito), a artista plástica Mathilde Guégan criará um retrato em homenagem à vereadora do PSOL que fará parte de um afresco a ser realizado por moradores do bairro antes da passagem do revezamento.Quando a chama chegar ao local, às 18h10, a imagem de Marielle ficará associada à da Olimpíada. A prefeitura de Paris já eternizou a luta de Marielle no combate às discriminações e a defesa dos direitos humanos com a inauguração desse jardim, em 2019, um ano depois do assassinato dela e do motorista Anderson Gomes no Rio de Janeiro. Agora, o retrato de Marielle pintado no jardim entrará para o álbum dos Jogos Olímpicos de Paris.Desfile militarParis não tem um dia de celebração como este 14 de julho de 2024 há muito tempo. No período da manhã, o tradicional desfile militar foi transferido da avenida Champs Elysées para uma outra via famosa da cidade, a avenida Foch, de prédios residenciais de luxo. O presidente Emmanuel Macron estará lá, com ministros e alguns convidados, mas por causa da crise política não dará entrevista no final.O tema do desfile é “Olimpismo e Forças Armadas”, celebrando o início próximo dos Jogos, com a cerimônia de abertura no dia 26, e a Liberação de Paris da ocupação nazista, que completa 80 anos em agosto.Por causa dos preparativos da Olimpíada, a parada militar será mais curta, com 4 mil homens e mulheres compondo os batalhões a pé. Não haverá tanques nem blindados, apenas a cavalaria da Guarda Republicana e demonstrações com aviões e helicópteros, para celebrar os 90 anos de criação da Força Aérea e Espacial francesa. No domingo, a cidade vai ficar praticamente proibida à circulação de carros, exceto em locais distantes do revezamento. O estacionamento nas ruas está proibido em todo o trajeto da tocha olímpica e na área do desfile militar.A prefeitura manteve o espetáculo de fogos de artifício na Torre Eiffel, uma tradição nas comemorações de 14 de julho, mas sem público nos jardins ao redor do monumento. Os fogos serão vistos à distância ou pela televisão. As arenas e arquibancadas nas duas margens do Sena, em frente à torre, já estão instaladas para a Olimpíada.Crise políticaO presidente Emmanuel Macron retornou da cúpula da Otan em Washington e reuniu, nesta sexta-feira, alguns pesos-pesados de seu partido no Palácio do Eliseu. Cinco dias depois da publicação dos resultados do segundo turno das eleições legislativas, em que nenhum partido ou bloco político obteve a maioria de 289 deputados dos 577 da Assembleia, a escolha de um novo chefe de governo segue num impasse. A nova Frente Popular de Esquerda, que venceu o segundo turno em 7 de julho, continua sem chegar a um acordo sobre o nome de um potencial primeiro-ministro. A sigla de esquerda radical França Insubmissa (LFI) não abre mão de impor um chefe de governo da legenda, alegando ter eleito o maior número de deputados dentro da coligação eleitoral de quatro partidos. O fundador do movimento, Jean-Luc Mélenchon, que disputou três vezes a presidência, quer ser primeiro-ministro. Mas ele é o político com maior índice de rejeição entre os franceses.Os socialistas, segundo colocados no interior dessa aliança, buscam impor o secretário-geral Olivier Faure, que já disse estar pronto para assumir a função, uma vez que a oposição de direita, de extrema direita e o bloco de centro de Macron alertaram que irão derrubar um governo liderado pela França Insubmissa.A principal notícia desta sexta-feira (12) é que Macron estaria disposto a aceitar a demissão do primeiro-ministro Gabriel Attal e do governo na terça-feira, dia 16, para que os ministros reeleitos deputados possam assumir seus mandatos na nova Assembleia e Gabriel Attal, a liderança da bancada macronista no plenário. Mas mesmo dentro do partido Renascimento existe atrito: o ministro do Interior, Gérard Darmanin, disputa a liderança da bancada com Attal. A decisão de Macron de liberar os ministros visa reforçar a ala macronista para a sessão inaugural da nova Assembleia, marcada para 18 de julho. O bloco presidencial, apesar de ter perdido a eleição para a esquerda, ainda é a segunda força política da Casa e tentará reeleger a presidente Yahel Braun Pivet e participar dos cargos de direção das comissões mais importantes e da mesa diretora da Assembleia de Deputados.
A campanha para o segundo turno das eleições legislativas francesas se encerra nesta sexta-feira (5), sob um clima tenso. Nos últimos dias, foram registradas dezenas de agressões contra candidatos e militantes. O Ministério do Interior da França anunciou a mobilização de 30 mil policiais para o domingo (7), temendo distúrbios no dia da votação. Daniella Franco, da RFISegundo o ministro do Interior, Gérald Darmanin, “51 candidatos, suplentes ou militantes foram agredidos fisicamente” durante as três semanas de campanha das eleições legislativas antecipadas, “sem contar as agressões verbais”. A forte polarização deixou a França “com os nervos à flor da pele”, reiterou Darmanin, em entrevista à BFMTV nesta sexta-feira.No total, mais de 30 abordagens motivadas por violências políticas foi registradas pela polícia durante o período. De acordo com o ministro, o perfil dos agressores é “extremamente variado”, em geral “pessoas espontaneamente irritadas”, entre “militantes políticos, membros da ultraesquerda ou da ultradireita e de outros movimentos”.Entre os casos de agressão mais graves está o da deputada porta-voz do governo e candidata à reeleição Prisca Thévenot e sua equipe. Na quarta-feira (3), o grupo foi agredido ao questionar jovens que estavam rasgando cartazes de candidatos em Meudon, na periferia de Paris. Duas pessoas foram hospitalizadas.Na região da Isère, no sudeste da França, o vereador Bernard Dupré, diz ter levado um soco no rosto por pregar cartazes com o rosto do ex-primeiro-ministro e candidato Olivier Verán. Marie Dauchy, candidata do partido de extrema direita Reunião Nacional (RN), suspendeu sua campanha após ter sido agredida e ameaçada de morte por um homem na região da Savoie, no leste da França.Militantes e simpatizantes não escapam do clima tenso. Na região da Loire-Atlantique, no noroeste, três jovens afirmam ter sido alvo de violências homofóbicas ao realizarem uma operação porta a porta. Membros da equipe da candidata da esquerda Danielle Simonnet foram agredidos com socos e spray de pimenta por colarem cartazes de campanha no 10° distrito de Paris.“Há um clima de grande violência em relação à política e em relação ao que ela representa”, comentou Darmanin. “Em uma democracia, é muito importante que os candidatos, os militantes e que a política seja respeitada”, reiterou o ministro francês do Interior.Ameaças da extrema direita contra advogadosO site da extrema direita Rede Livre publicou uma matéria na quarta-feira (3), com o nome de cerca de 100 advogados descritos como “escória” e “a serem eliminados”. O motivo foi um manifesto contra o Reunião Nacional (RN) publicado na terça-feira (2) pela revista de esquerda Marianne, assinado pelos magistrados visados pelas ameaças.“Esses advogados declaram que não respeitarão o veredito das urnas em caso de vitória do RN”, afirma a Rede Livre. “Claro que não são os únicos, é a grande maioria dos advogados que precisam ser neutralizados”, diz o site da extrema direita.O ministro francês da Justiça, Eric Dupond-Moretti, expressou sua indignação à publicação da lista nominal de advogados. “Aqueles que querem a morte das nossas liberdades sempre começam atacando os advogados”, declarou. O Ministério Público foi solicitado pela Ordem dos Advogados de Paris para abrir uma investigação.A campanha também foi marcada por denúncias de polêmicos perfis de candidatos da extrema direita. É o caso de Ludivine Daoudi, excluída da campanha do Reunião Nacional depois que uma foto dela usando um quepe militar nazista veio à tona nas redes sociais. Já Annie Bell, continua na corrida pela legenda ultranacionalista, mesmo após a imprensa francesa divulgar que ela foi condenada por sequestro a mão armada, em 1995.Outros candidatos ultranacionalistas foram alvo de polêmicas por realizar declarações racistas e xenófobas. Daniel Grenon, que afirmou durante uma entrevista que franceses originários da região do Magreb com dupla nacionalidade não deveriam jamais poder ter acesso a altos cargos na França. Paule Veyre de Soras, que briga por uma vaga de deputada em Mayenne, no nordeste da França, tentou se defender de acusações de racismo afirmando à uma mídia local: “tenho como oftalmologista um judeu. E tenho como dentista um muçulmano”.Policiamento reforçado no domingoO clima de tensão é reforçado por um temor que os resultados do segundo turno e uma provável vitória da extrema direita não sejam aceitos por parte da população francesa. Por isso, o Ministério do Interior mobilizou 30 mil policiais em todo o país no domingo, entre eles, cinco mil apenas em Paris.“É um grande esquema para que a ultraesquerda e a ultradireita não aproveitem o resultado para criar uma desordem que pode, em seguida, resultar em outras desordens”, justificou Darmanin. O próprio ministro reconheceu que “há algo no ar que suscita a liberação da violência”.Na quarta-feira (3), a Praça da República acolheu uma grande mobilização pacífica contra a extrema direita, na presença de estudantes, ONGs defensoras dos direitos humanos, políticos da esquerda, celebridades e personalidades, entre elas, o ex-jogador de futebol Raí, que discursou no evento.Nesta sexta-feira, o secretário de Segurança Pública de Paris, Laurent Nuñez, indicou que um ato convocado pelo coletivo Ação Antifascista Paris e Periferia para o domingo diante da Assembleia Legislativa francesa foi proibido.A manifestação seria realizada independentemente do resultado do segundo turno, segundo os organizadores. No entanto, os serviços de inteligência da França consideraram que grupos rivais poderiam se enfrentar durante o protesto, resultando em “riscos para a ordem pública”.
O primeiro turno das eleições legislativas antecipadas na França acontece neste domingo (30). A extrema direita lidera a disputa com folga, sete pontos percentuais à frente da esquerda e 16 pontos à frente do bloco de centro-direita, que dá apoio parlamentar ao presidente Emmanuel Macron. A guinada de uma parcela importante do eleitorado francês à extrema direita marca uma mudança profunda de valores na sociedade francesa. Pesquisa publicada pelo instituto Ipsos na quinta-feira (27), feita para o jornal Le Monde, rádios e canais de TV do sistema audiovisual público francês e fundações de estudos estratégicos mostra que 75% dos eleitores que votarão em candidatos do partido fundado por Marine Le Pen (Reunião Nacional), que propõe o jovem Jordan Bardella para o cargo de primeiro-ministro, compartilham os mesmos valores e ideias xenófobas e racistas defendidas pela sigla.Esses eleitores de ultradireita, de todas as idades e classes sociais, foram convencidos pela propaganda nacionalista que apresenta os imigrantes e seus descendentes, principalmente negros e árabes muçulmanos, como bodes expiatórios de todos os males da França.Eles querem ver aplicadas as propostas de Jordan Bardella, 28 anos, de reduzir os direitos dos estrangeiros e de pessoas com dupla nacionalidade, uma medida que instituiria uma política de segregação social entre os franceses. Apesar de negarem, o partido RN e seus aliados Republicanos romperam nesta campanha uma barreira até há pouco tempo impensável na França: dividir os franceses em categorias de melhor ou pior pedigree.Nenhum argumento de risco econômico, de ingovernabilidade ou de despreparo para governar preocupa esse eleitorado. A esperança deles é que um futuro governo de extrema direita cumpra as promessas de melhoria do poder aquisitivo, baixe os preços da eletricidade e da gasolina, e estabeleça um tratamento preferencial para os franceses brancos nos programas sociais do governo.Na reta final da campanha, gerou indignação a proposta de Bardella de excluir pessoas de dupla nacionalidade, que representam cerca de 3,5 milhões de franceses, de cargos públicos ditos "sensíveis e estratégicos" na função pública. O episódio mostrou que a imagem de um partido aceitável de direita, trabalhada nos últimos anos por Marine Le Pen, derrotada em duas disputas presidenciais por Emmanuel Macron, não mudou em nada. Caciques do partido Reunião Nacional continuam defendendo as mesmas ideiais xenófobas, racistas e antissemitas da sigla Frente Nacional, fundada pelo pai dela, Jean Marie Le Pen. Clima repugnanteDesde a campanha para as eleições europeias, que precedeu a das legislativas antecipadas, a imprensa francesa tem reportado casos de xenofobia e insultos racistas nas ruas e redes sociais.Na última semana, dois jornalistas de TV franceses de origem árabe, que fazem um trabalho seríssimo no canal 5, receberam cartas anônimas na casa deles, com insultos e ameaças de que seus empregos estavam com os dias contados e eles em breve deveriam retornar para seus países.Um dos projetos da extrema direita é privatizar o sistema de rádio e TV público na França, que são uma garantia de independência jornalística.Em Rouen, a 134 km de Paris, o prefeito da cidade teve de pedir à Justiça nesta semana para suspender uma festa que estava sendo organizada por um grupo de segregacionistas brancos, inspirado no movimento americano White Boys Summer. O tema da festa era “Fora estrangeiros”. No convite publicado no Instagram, eles escreveram o tema da festa em alemão – “Auslander raus” –, um notório slogan usado pelos nazistas.A atual campanha da extrema direita liberou o discurso racista. Milícias de extrema direita escrevem nas redes sociais que aguardam apenas o resultado de domingo para "bater em homossexuais e imigrantes".Aumento da participaçãoEste momento histórico de risco de desestabilização da França mexe com os eleitores. A projeção de participação está em alta, estimada entre 63% e 65%, segundo o Ipsos, o que já representa 16 pontos a mais do que na eleição de 2022, sem que se saiba exatamente se será vantajosa para um ou mais partidos políticos. Como a época é de início de férias de verão e muita gente tinha viagens programadas, mais de 2 milhões de franceses estão deixando procurações para algum conhecido votar por eles. A votação dos franceses que residem no exterior já aconteceu, e a participação quase dobrou em relação à eleição passada.O plenário da Assembleia Nacional é composto por 577 deputados, eleitos para um mandato de cinco anos. Uma parte dos candidatos deve ser eleita no primeiro turno – aqueles que alcançarem mais de 50% de votos. Mas o Ipsos prevê cerca de 250 disputas triangulares, ou seja, envolvendo três deputados para uma vaga.Este é o ponto mais importante a ser observado na noite de domingo. Saber se o terceiro colocado irá se retirar da disputa para apoiar o candidato com mais chances de vencer o representante da extrema direita.O presidente Emmanuel Macron declarou nesta sexta-feira que fará "uma recomendação de voto clara" logo após a publicação dos resultados. Socialistas e ecologistas já deixaram transparecer que a ordem será barrar a extrema direita. A dúvida fica para as circunscrições em que houver candidato do partido França Insubmissa, sigla de esquerda radical equiparada por Macron à extrema direita.O ultradireitista Jordan Bardella já disse que só aceitará a indicação do presidente para ocupar o cargo de primeiro-ministro se a extrema direita eleger a maioria absoluta dos deputados, ou seja, obtiver mais de 289 vagas no plenário.Macron isoladoA pesquisa do Instituto Ipsos mostrou que 56% dos franceses continuam com uma impressão "muito negativa" da decisão do presidente de dissolver a Assembleia Nacional depois de perder as eleições europeias para a extrema direita. Os franceses manifestam um misto de "incompreensão, medo e revolta" contra Macron.O chefe de Estado cometeu um erro político. Ele acreditou que contaria com o apoio de uma parte da esquerda nessa campanha para as legislativas, mas o que ele acabou fazendo foi matar o movimento político que criou. Também passou a hostilizar o partido de esquerda radical França Insubmissa, que nos últimos sete anos negou apoio a qualquer aliança política com o governo e apostou numa postura de conflito permanente na Assembleia Nacional.Nesta sexta-feira, o jornal Le Monde publicou um editorial batendo forte em Macron. O diretor do Le Monde diz que "ceder uma parcela do poder à extrema direita seria gravíssimo e levaria a França a perder tudo o que foi construído em dois séculos e meio”. Para o segundo turno, o Le Monde defende a união de toda a oposição republicana, a fim de impedir que a extrema direita chegue ao poder.
A primeira semana da campanha das eleições legislativas antecipadas na França foi monopolizada por um crime que chocou o país: o estupro coletivo de uma menina judia de 12 anos por três outros adolescentes. Manifestações contra o antissemitismo estão sendo realizadas em todo o país para denunciar crimes de discriminação e ódio contra a comunidade judaica. Daniella Franco, da RFIAs agressões horrorizaram a França. A polícia francesa revelou detalhes do que classificou de “um calvário” vivido por uma menina judia de 12 anos no último sábado (14) em Courbevoie, na periferia de Paris.Ela foi levada à força por dois adolescentes de 13 anos e um garoto de 12 anos a um imóvel abandonado, onde foi torturada, agredida fisicamente e estuprada ao confirmar ser de confissão judaica. Os três menores foram identificados e detidos para interrogatório.A notícia do estupro coletivo veio à tona no início dessa semana, quando começou oficialmente a campanha das eleições legislativas antecipadas. A agressão monopolizou o debate político, em um momento em que o partido de extrema direita Reunião Nacional lidera as pesquisas, com mais de 30% das intenções de voto.Trocas de farpas entre os partidosLíderes de todos os partidos se manifestaram nesta semana sobre o estupro coletivo e trocaram farpas sobre o problema do antissemitismo no país. No alvo das acusações está o partido França Insubmissa, da esquerda radical. A legenda integra a coligação da esquerda Nova Frente Popular, junto com o Partido Socialista, o Partido Comunista e o Europa Ecologia Os Verdes, formada especialmente para as eleições legislativas antecipadas.Logo após os ataques de 7 de outubro de 2023, que deu início à guerra na Faixa de Gaza, alguns membros do França Insubmissa se recusaram a classificar o Hamas como um grupo terrorista. Recentemente, o líder do partido, Jean Luc Mélenchon, também minimizou o problema do antissemitismo na França.Nesta sexta-feira (21) em entrevista à BFMTV, a deputada Mathilde Panot, do França Insubmissa, argumentou que “nenhum dos membros da Nova Frente Popular foi condenado”. A parlamentar também ressaltou que “o antissemitismo precisa ser combatido em todos os lugares” e lembrou que no programa da coligação há um plano contra o ódio racial e religioso.De fato, entre todos os partidos, é apenas a Nova Frente Popular que tem, até o momento, propostas contra esse problema. Eles propõem a criação de um Observatório contra as Discriminações e oferecer mais meios para que a Justiça possa processar e punir autores de crimes racistas, antissemitas e islamofóbicos.O programa do partido centrista Renascimento, do presidente francês, Emmanuel Macron, que foi apresentado em coletiva de imprensa na quinta-feira (20) pelo primeiro-ministro Gabriel Attal. Embora não conte com nenhuma proposta direta direcionada ao antissemitismo, o premiê convocou as autoridades políticas “a erguerem barreiras ao antissemitismo”.Vários membros do governo, entre eles, o próprio Macron, lembram as declarações controversas dos membros do França Insubmissa, e também as origens do partido Reunião Nacional. A legenda da extrema direita é o antigo Frente Nacional, fundado nos anos 1970 por um movimento neofascista, com integrantes de uma ex-milícia nazista.No entanto, os líderes de hoje do Reunião Nacional alegam que se desvencilharam do passado obscuro. Em uma operação de repaginação, a liderança da legenda foi atribuída a Jordan Bardella, de 28 anos, admirado por parte da juventude francesa. Segundo ele, a comunidade judaica da França sabe que o Reunião nacional é “um escudo aos judeus da França”.Manifestações em toda a FrançaO estupro coletivo suscitou uma onda de indignação na França. Durante toda a semana, organizações judaicas convocaram protestos nas principais cidades do país. Na quinta-feira (20), uma mobilização foi realizada na Praça da Bastilha, no leste de Paris, com o apoio de várias associações, entre elas, a SOS Racismo e a Fundação das Mulheres.Nesta sexta-feira, centenas de pessoas se reuniram diante da prefeitura de Courbevoie, palco do crime. Presente no protesto, o presidente do Conselho Representativo das Instituições Judaicas da França (Crif), afirmou que é “urgente soar o alarme” e “enviar uma mensagem à sociedade francesa” diante do antissemitismo.Em um balanço publicado em maio, o Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop) e a Fundação Pela Inovação Política apontaram que, desde o 7 de outubro de 2023 e a retaliação israelense na Faixa de Gaza, os atos antissemitas tiveram um aumento de 1000% na França. A aversão à comunidade judaica é verificada principalmente entre a camada mais jovem da população: 35% dos entrevistados da faixa etária 18-24 anos acredita que esse sentimento é justificado devido à falsa ideia de que todo judeu apoia o governo do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu.A imprensa francesa recolheu depoimentos de judeus e judias nas manifestações contra o antissemitismo nesta semana na França. Membros da comunidade judaica denunciam ser frequentemente alvo de ameaças físicas e verbais. Muitas pessoas afirmam que estão ocultando seus sobrenomes para não terem sua religião identificada.“Há gente que nos persegue”, diz a francesa Rebecca ao jornal Le Figaro. “Tememos por nossas vidas. Tem quem diga que exageramos, mas vivemos um inferno cotidiano desde o 7 de outubro”, reitera.
Os quatro maiores partidos da esquerda francesa apresentaram nesta sexta-feira (14), em Paris, um programa comum para as eleições legislativas antecipadas dos dias 30 de junho e 7 de julho. A Nova Frente Popular promete barrar a extrema direita e uma ruptura total com o governo do presidente Emmanuel Macron. Daniella Franco, da RFILideranças dos partidos França Insubmissa (LFI), Socialista (PS), Europa Ecologia Os Verdes (EELV) e Comunista (PCF) propuseram nesta sexta-feira um "contrato de legislatura" em 20 principais diretivas que pretendem aplicar imediatamente se vencerem o pleito. Entre as principais metas, está a revogação de medidas-chave do governo Macron, como as impopulares reforma da Previdência, da imigração e do seguro-desemprego.O programa da Nova Frente Popular também traz propostas como o reforço do apoio à Ucrânia e a defesa de um cessar-fogo imediato na Faixa de Gaza, além de apresentar planos audaciosos como o bloqueio de aumento das tarifas de energia elétrica e dos alimentos, a taxação dos super-ricos e o aumento do salário mínimo para € 1.600, entre outras. A aliança da esquerda foi organizada logo após o anúncio do presidente francês, Emmanuel Macron, de dissolver a Assembleia dos Deputados e convocar eleições legislativas antecipadas, no último domingo (9). A medida mergulhou a França em um caos político.A inesperada decisão foi tomada após a vitória esmagadora do partido da extrema direita Reunião Nacional (RN) nas eleições europeias. Os ultranacionalistas obtiveram mais de 31% dos votos, mais do que o dobro do partido governista Renascimento (14,6%). Na última quarta-feira (12), Macron realizou uma coletiva de imprensa e explicou que, com sua decisão, espera vencer o que chama de "extremos", tecendo duras críticas à aliança da esquerda. Comparando a Nova Frente Popular com o partido ultranacionalista Reunião Nacional, o presidente afirmou que "os dois blocos empobrecem o país", e defendeu que seu campo é o único com "um projeto de governo coerente", e que pode "responder aos desafios" da França.No entanto, a 16 dias do primeiro turno das eleições legislativas, a extrema direita segue liderando as pesquisas, com cerca de 31% das intenções de voto, muito à frente do partido liderado por Macron, Renascimento, com cerca de 18% da preferência. Até o momento, a aliança da esquerda é a única com potencial de barrar a ascensão dos ultranacionalistas, acumulando 28% de previsão de escolha do eleitorado, de acordo com a sondagem Elabe realizada no começo da semana. Outra pesquisa, divulgada nesta quinta-feira (13) pelo Opinionway, aponta resultados semelhantes: 32% para o RN, 25% para a Nova Frente Popular e o partido de Macron, 19%. Já a direita é palco de um racha depois que Éric Ciotti, líder dos Republicanos (LR) se aliou com os ultranacionalistas do Reunião Nacional. Após se trancar na sede de seu partido, Ciotti está em vias de expulsão desta que é a maior legenda conservadora da França. Com exceção da ala que o apoia, boa parte dos republicanos participará da chapa de Macron. Momento histórico para a esquerda Membros da Nova Frente Popular comemoraram "um momento histórico". "Será ou a extrema direita ou nós", afirmou Marine Tondelier, líder do partido Europa Ecologia Os Verdes. "Podemos mudar tudo se o povo francês quiser", indicou Manuel Bompard, coordenador nacional do França Insubmissa. Em tempo recorde, as maiores legendas da esquerda conseguiram encontrar consenso sobre questões que as dividiam até então, como a classificação do grupo Hamas como terrorista, sobre a qual alguns deputados do França Insubmissa expressaram resistência no início da guerra na Faixa de Gaza.Outro assunto que deixou de suscitar divisão entre os partidos é a personalidade que assumirá o cargo de primeiro-ministro, em caso de vitória nas eleições legislativas. O líder da esquerda radical, Jean-Luc Mélenchon, que perdeu popularidade após protagonizar uma série de polêmicas nos últimos anos, parece ter desistido da ideia, abrindo caminho a novas lideranças. Apesar da proposta de ruptura com o governo Macron, o principal objetivo da aliança é barrar a extrema direita. "Estamos demonstrando que quando o essencial está em jogo, estamos aqui", afirmou nesta sexta-feira o chefe do Partido Socialista, Olivier Faure. Inspiração vem de movimento nos anos 1930A coligação progressista se inspira na união histórica das forças de esquerdas na França, em 1936. No início da década de 1930, a associação entre socialistas e comunistas franceses, na época inimigos, parecia improvável. No entanto, a ascensão ao poder de Adolf Hitler, na Alemanha, e de Benito Mussolini, na Itália, deixou os progressistas em alerta. A esquerda francesa, então dividida, se uniu em uma Frente Popular para barrar o crescimento do fascismo na França.Com uma expressiva vitória nas eleições legislativas de 1936, a coligação obteve 386 deputados entre os 608 assentos na Assembleia de Deputados. O socialista Léon Blum formou um governo de coalizão e, em menos de dois meses, a semana de trabalho de 40 horas, as férias remuneradas e vários acordos coletivos foram votados.A nova união das forças da esquerda irrita a cúpula do governo francês, que deve perder a maioria da Câmara baixa do Parlamento com a realização das novas eleições legislativas. Desde o anúncio da formação da coligação progressista, representantes do governo atacam lideranças progressistas que a integram. Para Macron, que classificou de "indecente" a iniciativa, "Léon Blum deve estar se revirando em seu túmulo". Já o ministro francês da Economia, Bruno Le Maire, afirmou que o programa da Nova Frente Popular é "um delírio total".O primeiro-ministro Gabriel Attal prevê que para que as medidas da coligação de esquerda sejam colocadas em prática, haverá um expressivo aumento nos impostos, "uma má notícia para a França que trabalha".
Eleitores da União Europeia estão indo às urnas desde quinta-feira (6) para renovar o Parlamento de Estrasburgo. A previsão é de uma guinada ultraconservadora, inclusive na França, com um preocupante fortalecimento da extrema direita no bloco europeu. Daniella Franco, da RFIA Holanda abriu ontem o fim de semana de votação na Europa e nesta sexta-feira (7) foi a vez da Irlanda e da República Tcheca. No sábado (8), votam os eleitores da Letônia, de Malta e da Eslováquia. No domingo (9), 20 Estados-membros da União Europeia vão às urnas, entre eles, a França.Sob a liderança de Jordan Bardella, presidente do partido Reunião Nacional, a extrema direita francesa já comemora antecipadamente sua vitória. A dois dias da população francesa ir às urnas, a legenda segue imbatível nas pesquisas de intenção de voto. Uma sondagem divulgada nesta sexta-feira (7) pelo Instituto OpinionWay mostra que o líder ultranacionalista tem 33% das intenções de voto.Se o resultado confirmar no domingo (9), a extrema direita francesa deve obter um resultado inédito nessas eleições europeias, conseguindo mais do que o dobro dos votos do partido do governo, o centrista Renascimento. Liderado pela candidata Valérie Hayer, a legenda de Macron tem cerca de 15% de intenções de voto. Logo depois chega o Partido Socialista, encabeçado pelo candidato Raphael Glucksmann, com cerca de 13% das intenções de voto.Guinada da extrema direita na UEO sucesso da extrema direita entre o eleitorado europeu se espalha pelo bloco. Pela primeira vez na história, a corrente vai se tornar a terceira força no Parlamento Europeu.As primeiras apurações na Holanda mostram que, como esperado, o Partido da Liberdade (PVV), do líder populista holandês Geert Wilders, protagoniza um importante avanço, e deve obter 7 das 31 cadeiras da Holanda no Parlamento Europeu. Nas últimas eleições europeias, em 2019, o PVV conseguiu apenas um lugar.Por enquanto, é a centro-esquerda que lidera a contagem de votos na Holanda, por meio da aliança entre os ecologistas e os trabalhistas. A coligação deve enviar 8 deputados ao Parlamento Europeu – um a menos do que há cinco anos.O país da UE com o discurso ultranacionalista mais acirrado hoje é a Hungria, liderada pelo primeiro-ministro Viktor Orban. A previsão é que seu partido, o Fidesz, obtenha 48% dos votos no domingo, depois de uma campanha anti-europeia e cravejada de fake news. Uma das principais falsas notícias propagadas pela legenda nas últimas semanas é que a União Europeia estaria planejando colocar em prática um serviço militar obrigatório para enviar cidadãos europeus para lutar na Ucrânia contra a Rússia.A Itália também é outro dos vários países europeus mergulhados no discurso da extrema direita. O partido Irmãos da Itália, da premiê Giorgia Meloni, lidera as pesquisas de intenção de voto das eleições europeias, com 27% da preferência.Já a Polônia, que foi palco de uma guinada pró-Europa, nas eleições legislativas do ano passado, corre o risco de uma marcha à ré. O partido centrista Coalizão Cívica, do premiê Donald Tusk, tem a mesma quantidade de intenções de voto do ultraconservador Lei e Justiça (PiS), ambos com cerca de 30%.Em outros países a extrema direita não lidera a corrida eleitoral, mas registra uma expectativa de um crescimento expressivo na votação. É o caso da Alemanha, onde o partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD) deve obter seu melhor resultado nas eleições europeias, com uma previsão de convencer 16% do eleitorado.Em Portugal, o discurso anti-imigração se reforça com o crescimento do partido de extrema direita Chega. A legenda é hoje a terceira força política do país e tem 12% das intenções de voto nessas eleições europeias.Normalização da extrema direitaPara muitos especialistas em extrema direita, o renascimento da extrema direita se deve principalmente à abertura que foi sendo concedida ao longo dos anos aos políticos e partidos de ultradireita. Segundo Nathalie Brack, professora de Ciência Política na Universidade Livre de Bruxelas, o cenário reflete “a normalização” dos ultranacionalistas.“As ideias da extrema direita estão cada vez mais na agenda, e as cooperações com certas forças da direita radical se tornam quase normais, por meio de coligações”, observa.A banalização da extrema direita se somou a problemas internos da União Europeia, como a crise migratória, o aumento da inflação, a desconfiança dos cidadãos na instituições europeias e dos partidos tradicionais. Líderes ultranacionalistas souberam se apropriar do descontentamento do eleitorado e se apresentar como a única solução.Na prática, a guinada da extrema direita nas eleições europeias também deve alterar o equilíbrio de poder no bloco, reforçando a política de imigração e interferindo na agenda climática, levando em consideração o ceticismo climático dos partidos e dos líderes da extrema direita da Europa.A monopolização do cenário político pela extrema direita, aliás, resultou na escassez debate sobre assuntos essenciais no bloco, como a questão ambiental. Em momento de emergência climática, as propostas “verdes” foram as grandes ausentes desta campanha das eleições europeias.Não por acaso, a candidata ecologista Marie Toussaint, que lidera o grupo dos Verdes na França, pode não obter os 5% de votos necessários para ter representação no Parlamento Europeu.
O torneio de tênis de Roland Garros começou no dia 20 de maio e está sendo considerado um sucesso para testar a organização dos Jogos Olímpicos de Paris. Entretanto, uma hashtag que apareceu recentemente nas redes sociais, propondo a poluição deliberada do rio Sena com excrementos, em forma de protesto contra a prefeita Anne Hidalgo, preocupa as autoridades. Ainda não foram divulgados números oficiais, mas o torneio de tênis de Roland Garros deve bater um novo recorde de público neste ano. Apesar do tempo chuvoso e frio para um mês de maio, os espectadores têm feito longas filas para assistir às partidas e estão em geral satisfeitos com a organização, que já aplica o mesmo esquema de segurança dos Jogos Olímpicos de Paris 2024.O visitante não se dá conta, mas o esquema de policiamento se estende desde a linha 10 do metrô em Paris, que dá acesso ao estádio, a um amplo perímetro ao redor das instalações. As quadras de Roland Garros ficam ao lado do Parque dos Príncipes, que é o estádio de futebol do PSG. Os dois locais vão acolher competições na Olimpíada, de 26 de julho a 11 de agosto.A diretora de Roland Garros, a ex-tenista Amélie Mauresmo, está satisfeita com o resultado das medidas de segurança tomadas. Entretanto, continuam surgindo hashtags de protesto nas redes sociais contra a prefeitura da Paris pela organização dos eventos olímpicos.Há uma semana, apareceu uma piada de mau gosto nas redes sociais, do tipo escatológica, contra a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, logo depois dela anunciar que vai mergulhar e nadar no rio Sena no dia 23 de junho, para provar que ele está limpo e apto para receber provas de maratona aquática e a natação do triatlo durante os Jogos.Logo depois desse anúncio, surgiu uma hashtag na rede social X (#JechiedanslaSeinele23juin) incentivando as pessoas a defecar nas águas do Sena nessa data, em uma provocação que demonstra insatisfação de uma parcela dos parisienses com a prefeita.Esta hashtag, por mais inusitada e desagradável que pareça, viralizou, ganhou um grande número de apoiadores e migrou para programas de TV. Irritada, a prefeita socialista reagiu dizendo que não aguentava mais as críticas à organização da Olimpíada e sugeriu aos parisienses que não estivessem contentes que deixassem a cidade.Custo de despoluição do rio e gestão de Hidalgo atraem hatersO debate gerado por essa hashtag aponta uma insatisfação dos internautas com o custo das obras de tratamento do rio. Para eliminar a poluição do Sena, onde é proibido nadar há cem anos, o governo francês e as autoridades locais já gastaram cerca de € 1,4 bilhão, cerca de R$ 8 bilhões, desde 2016. No ano passado, o conselho municipal de Paris, presidido pela prefeita, aumentou o IPTU em 62%, de uma só vez, depois de Anne Hidalgo ter afirmado durante a campanha para a reeleição, em 2020, que não iria aumentar os impostos para pagar a dívida municipal, estimada em € 8,8 bilhões em 2024 e € 9,9 bilhões em 2025, ou financiar a Olimpíada.A insatisfação dos parisienses com a prefeita também foi crescendo com a insistência dela em promover os Jogos Olímpicos no centro da cidade e outros projetos polêmicos, como a expulsão dos carros do centro de Paris e gastos apontados como “extravagantes”. Entre eles, a instalação de projetos de moradia popular em bairros de alto padrão, onde o metro quadrado custa caro, para forçar a convivência social entre pobres e ricos.Nesta quinta-feira (30), em entrevista ao canal BFMTV, Michel Riottot, um engenheiro ex-pesquisador do Centro Nacional de Pesquisas Científicas (CNRS), disse que apesar dos esforços realizados nos últimos 30 anos, que melhoraram o grau de limpeza das águas do Sena, ainda existem ligações irregulares entre a rede de esgoto doméstico e a rede de esgoto pluvial que levam dejetos diretamente para o Sena. Ele citou um ponto crítico, que seria a estação de saneamento de Valenton, em Val-de-Marne, na periferia de Paris.Piada de mau gosto ou ingerência externa? Os franceses são criativos nos protestos e às vezes justificam o uso da violência para demonstrar repúdio diante de medidas que consideram arbitrárias das autoridades. Por enquanto, a prefeitura está alertando que usar o rio Sena como banheiro é passível de uma multa de € 68 (cerca de R$ 390,00), enquanto os internautas continuam fazendo planos de jogar sacos plásticos com excrementos no rio no dia D, 23 de junho, para manter o tom de provocação em relação à prefeita.Ninguém sabe a origem desta hashtag. Alguns chegaram a cogitar se não seria mais uma ingerência externa para prejudicar a imagem de Paris. Mas os internautas têm mantido um debate técnico de um nível elevado que não parece ser promovido por robôs automáticos. Por outro lado, o envolvimento da Rússia em campanhas de desinformação para prejudicar a imagem de Paris e dos Jogos Olímpicos tem sido evidenciado por investigações feitas pelos serviços de inteligência franceses. Em março, a ONG Surfrider Foundation publicou resultados de análises que realizou durante seis meses para medir a qualidade da água do Sena. A ONG apontou que 13 das 14 medições realizadas estavam “acima, ou mesmo muito acima” dos limites recomendados para natação. Os resultados foram atribuídos à alta concentração de duas bactérias de origem fecal (Escherichia coli e Enterococcus faecalis). Desde então, persiste esta dúvida sobre a qualidade das águas, e a prefeita Anne Hidalgo é alvo de haters. Ela garante que foram feitas as obras necessárias para sanear os problemas de contaminação.
As restrições de circulação para as provas dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 começaram a ser aplicadas nesta sexta-feira (17) na capital francesa, faltando 70 dias para a cerimônia de abertura, em 26 de julho. A praça da Concórdia, uma área turística e central para o tráfego em Paris, foi interditada à circulação de carros e ônibus e só irá reabrir em setembro, para permitir a fase final de montagem das arquibancadas que vão receber o público nas quatro arenas do Parque Urbano, criado temporariamente para as competições de breaking, BMX estilo livre, skate e basquete 3×3. As linhas 1 e 12 do metrô parisiense passam na estação Concórdia, mas os trens não param mais na plataforma da linha 12. Com isso, os usuários perderam a baldeação para a linha 1. Dentro de um mês, a estação será totalmente fechada.Na mesma área, a polícia interditou à circulação, até o fim da Olimpíada, três vias bastante utilizadas pelos motoristas: a ponte Alexandre III, a continuidade dela até o monumento dos Inválidos e o eixo norte sul de acesso à Concórdia. Com esta fase final de obras, começou o período que os parisienses temiam de piora nos congestionamentos. Associações de usuários do metrô estão protestando contra o impedimento de baldeação na Concórdia, considerado longo a pouco mais de dois meses da abertura do evento. Os usuários serão obrigados a fazer desvios e a caminhar mais tempo para chegar ao trabalho, em casa e na escola.Um bom número de parisienses está tendo dificuldade para entender como irão funcionar os três perímetros de segurança – um cinza, um vermelho e um azul –, que as autoridades criaram para as provas esportivas neste verão. QR code em áreas sem carrosOito dias antes da cerimônia de abertura, ou seja, a partir de 18 de julho até a meia-noite de 26 de julho, entrará em vigor um perímetro de segurança máxima, identificado pela cor cinza, que cobre uma longa extensão de ruas próximas das duas margens do Sena. A cor cinza corresponde à área de risco terrorista e terá policiamento rigoroso. Durante nove dias, a circulação de carros será proibida nessa faixa acinzentada indicada nos mapas. A cerimônia de abertura permanece programada no rio, com as delegações de atletas do mundo todo atravessando o eixo monumental da capital em embarcações decoradas com bandeiras. Mas o governo poderá mudar o evento para outro local se a ameaça terrorista estiver elevada às vésperas do dia D.Para entrar nessa área de segurança máxima, toda pessoa maior de 13 anos terá de apresentar um QR code emitido pela Polícia de Paris, um tipo de autorização digital. Isso vale para turistas, moradores e seus convidados, serviços de emergência, comerciantes, entregadores, clientes e funcionários públicos. No site da Polícia e no site oficial de Paris 2024, já é possível preencher um formulário com a solicitação desse laisser passer, que pede nome completo, data de nascimento, e-mail, telefone celular, endereço de hospedagem em Paris, cópia de passaporte e uma foto 3x4cm que vai acompanhar o QR code emitido pelas autoridades policiais. Só é dispensado dessa autorização quem possuir convite ou ingresso para a cerimônia de abertura, acompanhado de passaporte.Perímetro vermelhoO perímetro vermelho entra em vigor dia 26 de julho, na abertura, e vai até o encerramento dos Jogos de Paris 2024, no dia 11 de agosto. Ele é bem mais amplo e flexível, mas também exige a apresentação de QR code. Dos 25 locais de competição, 13 ficam dentro de Paris, ao lado de monumentos como a Torre Eiffel, o Campo de Marte, a praça da Concórdia, a praça do Trocadéro e outros pontos icônicos da cidade. A zona de segurança vermelha, mais ampla e flexível, cobre ruas adjacentes às instalações temporárias e estádios olímpicos. O público com ingresso para as competições está dispensado de apresentar QR code para ingressar na área vermelha. Já os moradores e pessoas que trabalham nesse perímetro, assim como turistas que estiverem hospedados perto das instalações olímpicas, terão de mostrar um QR code de acesso nas barreiras policiais. Turistas que pensam em vir à cidade apenas a passeio, sem assistir às provas, precisarão do QR code se planejarem se aproximar das arenas, inclusive pedestres e ciclistas. A polícia irá instalar barreiras de segurança e efetuar controles 2h30 antes da primeira competição do dia e manter os acessos fechados até 1 hora depois da última prova. A circulação de carros será proibida durante os horários de aplicação das medidas de segurança na faixa vermelha. O deslocamento será livre apenas fora dos horários de competição.A emissão de QR codes é gratuita. O site oficial dos Jogos, que tem versão em português e informações sobre os preparativos, traz os mapas e explicações sobre as regras de segurança. Quanto ao perímetro azul, o mais externo, é mais uma rota de fuga para motoristas escaparem do trânsito e das ruas fechadas no centro da cidade.
A animação da população francesa para Paris 2024 desperta a ritmo lento. Uma pesquisa divulgada durante a semana mostrou que somente 24% dos entrevistados se consideram entusiasmados para os Jogos. Daniella Franco, da RFIOs franceses ainda são reticentes sobre a realização dos Jogos Olímpicos, segundo uma pesquisa do instituto Elabe para o canal BFMTV divulgada na terça-feira (7). Segundo a sondagem, 46% está indiferente e 30% expressa seu ceticismo em relação ao evento.Por outro lado, 52% dos franceses se sentem orgulhosos de ser o país sede dos Jogos. Além disso, seis a cada 10 entrevistados afirmam ter consciência de que acolher uma Olimpíada é benéfico para o desenvolvimento do esporte, do turismo e para dinamizar a economia da França.A animação para os Jogos está em uma dinâmica crescente, ainda que lenta. Um levantamento similar realizado pelo instituto Elabe, há nove meses, mostrou que a quantidade de entrevistados entusiasmados teve um aumento de quatro pontos. Já a porcentagem de indiferentes e céticos diminuiu em 2%.Críticas ao preço dos ingressosAs principais críticas dos franceses em relação a Paris 2024 dizem respeito ao preço dos ingressos: 73% acredita que o valor a desembolsar para assistir às competições é alto e inacessível às camadas mais desfavorecidas da população.Desde o início da venda das entradas, o Comitê Olímpico disponibilizou ingressos a partir de € 24 (cerca de R$ 132), mas para algumas modalidades o preço dos ingressos podem custar centenas de euros. As entradas para a cerimônia de abertura variam entre € 1.600 (R$ 8,8 mil) e € 9.500 (R$ 52,3 mil).Já 71% expressa seu desacordo com o custo da organização dos Jogos, avaliado em € 11,8 bilhões pela consultoria Asterès, € 4,4 bilhões, segundo o presidente do comitê de organização dos Jogos Olímpicos, Tony Estanguet.Os franceses também reclamam do impacto ecológico da realização do evento: 51% dos entrevistados acreditam que os danos ao meio ambiente com o acolhimento dos Jogos são altos. Essa opinião é compartilhada principalmente pelos jovens (67%) e os eleitores da esquerda radical (59%).Chegada da Tocha animou os marselhesesA Tocha Olímpica desembarcou na quarta-feira (8) em Marselha, no sul do país, sob uma grande festa. Cerca de 150 mil pessoas assistiram a essa que foi a primeira cerimônia oficial dos Jogos Olímpicos em solo francês.O desfile marítimo com cerca de mil embarcações, o show acrobático de aviões com as cores da França e apresentação do rapper francês Jul empolgou os marselheses. O presidente Emmanuel Macron e a primeira-dama Brigitte marcaram presença, além de grandes personalidades da França, entre esportistas e figuras da cena cultural du país.O evento foi aclamado pela imprensa francesa, descrito como “uma cerimônia histórica”. Para o jornal Le Monde, a chegada da Tocha incitou o “fervor popular”, o que “ajuda a levantar o astral”. O diário Le Figaro ressaltou o “clima alegre” na ensolarada Marselha. Já o Le Parisien destacou o revezamento inicial entre o nadador francês, medalhista em Londres 2012, Florent Manaudou, e a campeã paralímpica de atletismo Nantenin Keïta.Nesta sexta-feira (10), a Tocha chega a Toulon, no sul da França. Ela passará por todas as regiões do país até chegar à capital francesa no final de julho, antes da abertura dos Jogos. A expectativa é que o revezamento da Chama Olímpica mobilize e anime a população.Hino da Paris 2024 vira piada nas redes sociaisA apresentação do hino oficial da Paris 2024, “Parade” (“Desfile”, em português), da autoria do músico Victor Le Masne, também teve forte repercussão nas redes sociais. Muitos internautas encontraram similaridades entre a canção oficial e o tema do filme “Jurassic Park”, de autoria do maestro americano John Williams.Mas os vários memes envolvendo “Parade” ajudaram a viralizar o hino da Paris 2024. Na rede social X, usuários sugeriram que a Tocha Olímpica chegue à capital francesa sendo carregada por um dinossauro.
O movimento de estudantes pró-palestinos, críticos da ofensiva de Israel na Faixa de Gaza, está se propagando nas universidades francesas. Esta sexta-feira (3) foi marcada por operações policiais para desalojar alunos que ocupavam prédios de faculdades em Paris e outras regiões e manifestações pela paz no território palestino. Durante a manhã, a polícia francesa interveio em quatro universidades ocupadas: o prédio central da Sciences Po, em Paris – uma escola de elite no ensino de ciências políticas, relações internacionais e finanças –, primeira faculdade a aderir ao movimento que começou nos Estados Unidos.Acompanhados por policiais, 91 estudantes que tinham passado a noite no prédio da Sciences Po deixaram o local, sem incidentes, mas gritando palavras de ordem em defesa da população de Gaza e denunciando o que chamam de massacres e até genocídio por parte de Israel no território palestino. A Sciences Po tem sete câmpus espalhados pela França. São os estudantes mais mobilizados no país e dez deles, de diferentes unidades, fazem greve de fome por um cessar-fogo em Gaza.A polícia francesa ainda desalojou estudantes do Instituto de Ciências Políticas de Lyon e de uma universidade vizinha, na cidade de Saint-Etienne (sudeste). No norte da França, policiais tentaram mas não conseguiram liberar a Escola de Jornalismo de Lille, considerada uma das melhores do país, que aderiu ao movimento no meio da semana. Ao todo, 23 prédios universitários tiveram aulas perturbadas ou suspensas, nesta sexta-feira, por causa do movimento pró-Palestina. Durante a tarde, alunos da Sorbonne e de várias associações estudantis convocaram um protesto na praça em frente à entrada principal da universidade para denunciar o "autoritarismo" do governo francês, que tem impedido manifestações de solidariedade aos palestinos. Cartazes também pediam a paz em Gaza. Na segunda-feira, a polícia entrou na Sorbonne e removeu barracas que os estudantes tinham instalado num pátio interno, com a intenção de passar vários dias no local. O primeiro-ministro francês, Gabriel Attal, e a ministra do Ensino Superior têm recomendado aos reitores para chamar a polícia para restabelecer a ordem, em caso de bloqueio das aulas. O discurso oficial é que o debate é tolerado e normal nas faculdades, mas impedir todos os estudantes de ter aulas não será aceito. Os alunos da Sorbonne ficaram revoltados que o reitor tenha deixado a polícia entrar dentro do campus, o que só aconteceu, segundo eles, duas vezes em 150 anos de existência da instituição. Judeus abertos ao diálogoA União dos Estudantes Judeus também reuniu 200 pessoas na praça do Panthéon, perto da Sorbonne, para um debate pacífico sobre o conflito. Com quipás nas cabeças, os jovens instalaram uma mesa debaixo de uma árvore e convidaram outros estudantes e pedestres a dialogar sobre o conflito. Políticos e intelectuais foram até o local apoiar essa iniciativa.Algumas atitudes antissemitas por parte de alguns estudantes franceses têm sido relatadas, mas não representam a maioria dos ativistas pró-palestinos. Há alguns dias, uma estudante judia foi expulsa de um anfiteatro que recebeu o nome de Gaza, na Sciences Po. Já houve uma reunião entre os estudantes mobilizados, professores e o diretor da escola e ficou acertado que os envolvidos nesse caso receberão sanções disciplinares. Estudantes querem levar Israel a tribunais internacionaisOs alunos de ciências políticas não acreditam que irão conseguir um cessar-fogo em Gaza. Mas alegam que de acordo com o que aprendem nas aulas de direito internacional, Israel comete crimes de guerra nos territórios palestinos e deve responder por isso diante de instâncias internacionais. As reivindicações dos estudantes na França são globalmente as mesmas vistas nos câmpus americanos. Os alunos da Sciences Po exigem da direção da escola a suspensão dos contratos de intercâmbio com universidades e institutos israelenses e o fim do que chamam de "massacres em Gaza", como fazem os americanos. A grande diferença é o número de faculdades e estudantes envolvidos, muito maior nos Estados Unidos do que na França. Em conversas com estudantes que não estão envolvidos nos protestos, alguns reclamam de sofrer pressão dos colegas para definir de que lado estão no conflito. Se não defendem os palestinos, são considerados pró-Israel. A polarização é evidente. Mas o que mais caracteriza o movimento na França é a solidariedade com os moradores de Gaza, uma população descrita como "vítima da opressão colonial israelense". Contexto eleitoralNos Estados Unidos, os universitários criticam abertamente o presidente Joe Biden por continuar a enviar armas para Israel. A mobilização lembra os protestos contra a guerra do Vietnã, nos anos 1960. Na França, o contexto é diferente. O presidente Emmanuel Macron tem condenado a estratégia militar do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanhyahu, e defende um cessar-fogo. Mas nos cartazes vistos hoje na rua o Estado francês era apontado como "tendo sangue nas mãos".O partido de extrema esquerda França Insubmissa (LFI), mal posicionado nas pesquisas de intenção de voto para as eleições do Parlamento Europeu, em junho, é acusado de atiçar os estudantes na Sciences Po para ações mais radicais. Políticos desse partido têm ido às faculdades apoiar o movimento. O líder de extrema esquerda Jean-Luc-Mélenchon acusou várias vezes Israel de "genocídio" em Gaza.Por ser um assunto complexo e internacional, a guerra afeta particularmente os estudantes de ciências políticas e relações internacionais. A Sciences Po é uma escola privada e cara. Em Paris, conta com cerca de 5 mil ou 6 mil estudantes, a metade estrangeiros – britânicos, americanos, brasileiros, enfim, de várias nacionalidades. O estabelecimento tem convênio de intercâmbio com a Columbia em Nova York, uma das universidades mais mobilizadas nos Estados Unidos. A comunicação entre os estudantes de Nova York e Paris foi muito rápida. Com a dimensão que o movimento ganhou nos Estados Unidos, os protestos se espalharam para universidades na Espanha, Suíça, México e Austrália.
Veneza, no norte da Itália, se tornou na quinta-feira (25) a primeira cidade a cobrar ingresso para visita. Paralelamente, vários países europeus adotam medidas para tentar lutar contra a frequentação massiva de turistas. As autoridades alegam a necessidade de preservar o patrimônio local, mas visitantes estrangeiros também vêm sendo alvo de xenofobia. Daniella Franco, da RFIMedida ainda em fase de experimentação, a entrada de € 5 em Veneza entrou em vigor sem muita resistência da parte dos turistas e sob críticas dos moradores. A administração local escolheu 29 dias em todo o ano de 2024 – e todos os fins de semana de maio a julho – para que essa tarifa seja cobrada de visitantes que chegam para passar o dia na cidade. Ela não se aplicará àqueles que planejam pernoitar no local.Com 50 mil habitantes, a cidade famosa por seus canais, gôndolas e arquitetura única, recebe 20 milhões de turistas por ano. Em época de alta temporada, a quantidade de pessoas na cidade chega a dobrar, o que dificulta a convivência com os moradores.Para o prefeito de Veneza, Luigi Brugnaro, o turismo na cidade “precisa mudar” para protegê-la. “O objetivo é definir um novo sistema de gestão dos fluxos turísticos e desencorajar o turismo diário em alguns períodos”, explicou.Os turistas aprovam a medida e parecem não se importar em pagar a taxa, um valor baixo em relação ao preço dos ingressos de museus e espetáculos. “Acho que é uma boa medida para diminuir a frequentação de visitantes em Veneza”, afirma o turista francês Sylvain Pélerin.Mas nem todos os moradores de Veneza concordam com a imposição de um ingresso para visitar a cidade, e veem a medida como um ataque à liberdade de circulação.“Não somos um museu ou uma reserva natural, mas uma cidade, onde não deveria ser necessário pagar para ter acesso”, afirma Marina Dodino, integrante da associação de moradores Arci Venezia.Medidas se multiplicam pela EuropaEm outros países europeus, movimentos de moradores contra turistas realizam ações que beiram a xenofobia. Em Málaga, no sul da Espanha, adesivos com mensagens hostis aos visitantes são colados nas portas de imóveis que foram transformados em hotéis ou Airbnbs.Nas ilhas Canárias, manifestantes saíram às ruas na semana passada para denunciar o turismo em massa e os prejuízos ambientais, com as construções de imensos complexos hoteleiros. “Não somos contra o turismo. Somos contra esse modelo que resulta na degradação da nossa terra e do nosso povo”, afirmou uma manifestante em Santa Cruz de Tenerife.Em Atenas, na Grécia, frases contra turistas são pichadas em muros perto da Acrópole. Desde o ano passado, o governo grego impôs um limite de venda de 20 mil ingressos por dia para visitar o monumento que é símbolo do país. Na ilha de Santorini, os desembarques nos portos foram reduzidos a oito mil por dia para evitar o engarrafamento de embarcações.França: 100 milhões de turistas por anoNa França, o governo já elaborou um plano contra o turismo de massa cujos detalhes serão apresentados em breve. O país, que é o primeiro destino turístico do mundo, recebe 100 milhões de turistas estrangeiros por ano. Esse número deve ser ainda maior em 2024, já que Paris sedia neste ano os Jogos Olímpicos.No entanto, algumas localidades já determinam medidas por conta própria. É o caso do Parque Nacional das Calanques, em Marselha, no sul da França, que estabeleceu um limite de 400 visitantes por dia. A grande quantidade de turistas estava provocando a erosão de alguns pontos nas montanhas.A ilha francesa de Porquerolles, uma reserva natural no Mar Mediterrâneo, também impôs há três anos o limite de 6 mil chegadas por dia nos meses de julho e agosto, período do verão no Hemisfério Norte.O Monte Saint Michel, na Normandia – o local mais turístico da França depois de Paris – colocou em prática todo um sistema de regulação do fluxo de visitantes. O acesso aos estacionamentos é limitado nos horários de pico, além do controle da quantidade de ônibus que levam os turistas até o local durante o dia, principalmente na alta temporada. O objetivo é proteger esse vilarejo que abriga uma abadia medieval que é Patrimônio Mundial da Unesco.“A frequentação turística constitui, às vezes, uma ameaça à preservação dos destinos”, afirma a ministra francesa encarregada do Comércio, Olivia Grégoire, em entrevista ao jornal Le Figaro. Além disso, “80% da atividade turística se concentra em 20% do território”, ressalta.Para ela, é essencial dividir a vinda massiva de visitantes ao longo do ano e por todo o país. Uma das pistas estudadas pelo governo francês é a promoção do que a ministra classifica de “turismo quatro estações”, além da divulgação de circuitos e destinos alternativos.
Proprietários de apartamentos e casas em Paris estão preferindo não renovar contratos com inquilinos para poderem alugar seus imóveis a turistas durante os Jogos Olímpicos de 2024 – um fenômeno que acentua ainda mais o problema da falta de moradia na capital francesa. Por trás da manobra, está a possibilidade de altos lucros graças aos preços exorbitantes das hospedagens durante o evento. Daniella Franco, da RFIA capital francesa enfrenta um problema de habitação há várias décadas. Além da escassez de imóveis em boas condições para acolher os parisienses, os preços dos aluguéis sobem a cada ano.Com a aproximação de Paris 2024, os proprietários descobriram uma oportunidade de lucrar com os preços astronômicos dos aluguéis por temporada. De acordo com dados do Observatório dos Aluguéis na Região Parisiense, o valor por mês é de, em média, € 1 mil (R$ 5,4 mil).No entanto, a diária dos apartamentos disponíveis em plataformas de hospedagem na capital francesa entre 26 de julho e 11 de agosto é de € 886 (R$ 4,8 mil), em média, segundo um balanço da plataforma Lycaon Immo, especializada no mercado imobiliário francês.Nos bairros mais nobres de Paris, os valores são ainda maiores. No 1° distrito da capital, no coração da cidade, o preço médio da diária chega a € 1.630 (R$ 8.900).Dentro da leiPara liberar os imóveis durante os jogos, a estratégia dos proprietários vem sendo não renovar os contratos de aluguel com os inquilinos parisienses. Pela lei, apenas o locatário tem o direito de encerrar um contrato antes do prazo final, mediante aviso prévio.No entanto, quando um contrato chega ao fim, o proprietário pode não renová-lo. Para isso, algumas regras precisam ser cumpridas: o inquilino deve ser notificado desta decisão com seis meses de antecedência, em imóveis alugados sem mobília, e três meses antes no caso dos mobiliados. Ainda assim, a decisão do proprietário precisa obedecer a um dos três casos: necessidade de dispor do imóvel para moradia própria, para a venda ou devido a um motivo “legítimo e grave”.Segundo o jornal Libération, os casos de não renovação de contratos de aluguel em Paris estão mais comuns desde março. Essa situação tem obrigado jovens a retornarem a viver na casa dos pais ou à “coabitação forçada”, entre pessoas sem relação ou afinidade, diz o diário.No entanto, com o preço de aluguéis nas imobiliárias tendo de obedecer a uma cartilha que limita os valores, os imóveis disponíveis vêm migrando para as plataformas de hospedagem. Em sites como o Airbnb, o proprietário pode escolher a tarifa que deseja – o que levou os preços a dispararem.Diárias salgadas nos hotéisNos hotéis da grande região parisiense, a situação não é diferente. O preço médio da diária é de € 1.033 (R$ 5,46 mil), segundo a associação francesa de consumidores UFC-Que Choisir.O valor corresponde a três vezes a média do preço normal de uma noite em um hotel na capital francesa. O aumento nas tarifas, em alguns casos, é de mais de 200%.A UFC-Que Choisir denuncia o que considera uma prática abusiva do setor hoteleiro e lembra que o aumento astronômico nos preços das diárias vem espantando os turistas de Paris. No entanto, o setor faz pouco caso das críticas e mira nos lucros: cerca de 16 milhões de pessoas são aguardadas em Paris para os Jogos Olímpicos.